Quando Stella Falcone sai do elevador eu já estou de pé, estendendo minha mão para segurar seu casaco antes que ela jogue em cima da minha mesa, me apressando para estendê-lo. Ela não diz muito mais. Nada de "Bom dia, Elena. Como foi seu fim de semana?". Nenhuma palavra. Eu, por minha vez, rebato sua frieza com frases bonitas antes de ela se trancar. Suspirante, me dou por derrotada e giro sob os saltos para o lado oposto do corredor.
— Hathaway? — minha chefe chama.
Dou meia volta e empurro a porta cuidadosamente, parando no batente. Stella retira os óculos escuros e pela primeira vez no dia repara no que estou usando ao me olhar de cima à baixo. Eu não me dou por vencida e simulo um sorriso agradável. Estou com um lenço vinho no pescoço, corset tomara que caia musgo e uma saia creme com cerejas na estampa e scarpins que Savannah me contrabandeou mais cedo. Stella alisa o lábio inferior, pensativa. Deve estar pegando os piores sinônimos do vocabulário para usar contra mim.
— Sim, senhora Falcone?
— Quero que avise o Taylor que estaremos saindo em uma hora para a floricultura de Bennett.
Aceno.
— Certo, avisarei para que ele esteja pronto para pegá-la.
Stella faz um som desgostoso.
— Você é surda? Eu disse que nós vamos. Esteja pronta para ir também. Vou experimentar meu vestido para o coquetel de sábado.
Meus lábios se entreabrem. Ela quer que eu saia com ela? Nós duas juntas? Uau, isso é uma novidade... E um avanço. Talvez eu não precise mais escrever uma carta de demissão... Ora, o que estou pensando? É claro que eu não vou me demitir daqui.
— Entendi. Vou estar pronta.
Ela move os dedos, sinalizando que devo me retirar. Obedeço.
✿ ✿ ✿
Mais tarde, Stella abandona a sala e eu já estou com seu casaco nas mãos. Nós entramos juntas no elevador e me mantenho um passo atrás dela, as mãos repousadas nervosamente na frente das coxas. Imagino todas as maneiras de puxar assunto sem soar como uma boboca e receber uma resposta grosseira... E chego à conclusão de que o silêncio é inevitável. No primeiro andar, sigo atrás da minha chefe. Atravessamos as portas duplas. Taylor vêm abrir a porta para ela e eu me apresso em atravessar para entrar do outro lado. Novamente, ninguém fala. Eu me limito a ficar olhando pela janela.
— Me diga, Hathaway, quais as suas expectativas para o Met Gala desse ano?
Arregalo os olhos para meu reflexo no vidro. Ela está falando comigo e eu simplesmente tenho medo de dizer alguma coisa errada e aborrecê-la mais ainda, mas se ficar calada pode ser pior. Respiro fundo e olho para Stella, que está, de novo, com os óculos escuros Gucci.
— Acho que não vai ser nada do que estamos esperando, porque você e Anna não têm a mesma cabeça.
— Quer dizer que ela é melhor?
— Lógico que não. E também não quer dizer que vai ser ruim. — Emendo depressa. — O meu ponto é que vocês duas são pessoas diferentes, apesar de amigas. Entendo que têm a mesma visão sobre todo esse mundo, mas, no fim, vai ser a senhora que decidirá o tema final e trará novos ares. Anna acertou muito durante os anos, principalmente em dois mil e dezoito com todos aqueles visuais impecáveis, mas também houve uma decaída na qualidade, que subia e descia sem previsão de estabilidade. Estive pesquisando e adoro seus conceitos. Acho que vai conseguir fazer algo muito legal esse ano. — Me interrompo ao perceber que estou falando demais, mas preciso acrescentar algo: — E desculpa meio que falar mal da Anna. Foi sem querer. Bom, não falei mal, mal, né?
Não posso enxergar o que há embaixo dessa lente, então fico em pânico quando Stella suspira e vira a face... Consigo ver pelo reflexo do vidro dela um sorrisinho em seus lábios, o que me faz relaxar e continuar otimista. Se consegui uma vez, posso fazer de novo.
✿ ✿ ✿
— Sua determinação me faz querer vomitar arco-íris. De onde saiu todo esse ânimo? Ontem você odiava a tal Stella. — Dyanne resmunga do batente.
Ela está curiosa do porquê de eu ter chegado em quase nas nuvens de tão saltitante.
— Maya me fez pensar e, refletindo, chorar não vai adiantar muito. E Stella me levou pra floricultura hoje, ainda pediu minha opinião entre gardênias e tulipas! Isso já é um bom sinal, certo? Quer dizer, ela podia me deixar mofando no escritório e não deixou. E eu fiz parte de uma escolha dela. Estou começando a ser vista como uma assistente de verdade. — E isso é apenas o primeiro passo para uma carreira promissora. — Além disso, eu tenho oitenta por cento de certeza que a fiz sorrir.
— O quê?
— Eu não vi totalmente, mas pareceu ser um sorriso. Ok, um meio sorriso.
— Uau, pelo jeito que descreve ela não parece ser capaz de mostrar emoções boas. Vejo essa mulher como uma criatura grotesca.
— Ela não é grotesca. E nem feia. Nunca viu? — pego meu telefone celular. Dyanne faz que não com a cabeça e vem para mais perto de mim. Entro no dispositivo de pesquisas e digito o nome STELLA FALCONE na barra de pesquisas, entro na aba de imagens e lá estão inúmeras fotos dela, incluindo algumas de quando mais nova.
— O quê? — Dyanne toma o aparelho de minhas mãos e vai se sentar na minha cama. Eu sigo atrás dela. Seus dedos nervosos descem a página e passam foto por foto. — Como assim você trabalha pra essa mulher? Elena, ela é... gostosa!
Levanto minhas sobrancelhas.
— Pensei ter ouvido "grotesca".
— Isso foi antes de ver as fotos dela! Amiga, uau! Olha só, parece que ela não tem uma ruga!
— Ah, acredite: ela não tem. — Deito as costas no colchão e encaro o teto do quarto. Dyanne se une a mim e continua espiando, fascinada. — Ei, acho que a água do nosso macarrão já deve estar secando.
— Droga! — Dy deixa meu celular e sai correndo do quarto. Aproveito para pegá-lo e verificar Stella com um vestido preto frente única que deixa suas costas perfeitas à toda vista na foto que deve ter sido tirada a no máximo um ou dois anos, quando seus cabelos eram longos com uma franja repartida. Ela olha por cima do ombro para além da câmera, algum amigo, e sorri de modo que vejo apenas uma linha pálida dos dentes entre os lábios pintados em tom de cereja. Eu admito que achei Stella muito linda no meu primeiro dia, mas depois de tudo que ela me fez passar essa concepção se perdeu. Pensando de novo e seguindo o raciocínio de Dyanne... Sim, Stella é odiavelmente bonita.
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Odiável
RomanceCom a aposentadoria de Anna Wintour, a VOGUE têm uma nova editora-chefe; a mais nova sensação crítica do momento no mundo da moda: Stella Falcone. Elena Hathaway, uma ex-universitária recém-formada, consegue o cargo mais disputado contra...