Capítulo 15

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O som dos trincos puxados antecede os raios solares incomodando minha cabeça e eu imediatamente desperto com a dor de cabeça massacrante. Rolo na cama. Abrir os olhos é uma tarefa impossível.

Quando me sento, percebo que estou em um colchão muito confortável e em travesseiros que me dão vontade de dormir para sempre, mas Stella Falcone termina de abrir as cortinas que tapam a porta de vidro do quarto que dá para a varanda. Ela usa um rabo-de-cavalo e roupas de malhar. Percebendo que despertei, franze o nariz.

— Desça... Se conseguir. — Seu tom de voz é cético.

E as memórias da noite anterior que invadem minha mente são a dica perfeita do motivo para essa atitude. Não só chamei atenção indesejada durante a festa como quebrei um vaso de milhares de dólares e vomitei no carpete branco dela. Não posso imaginar o quão irritada ela está comigo e o quanto quer me matar. Não posso encontrá-la, mas estou no segundo andar e fugir sem me desculpar vai ser motivo de chacota. Stella vai me demitir. Eu sei que vai. Estou certa disso. O máximo que eu posso fazer é me humilhar um pouco mais para que ela não faça o possível e o impossível para boicotar qualquer outra chance de emprego na área. Eu noto que não estou com o vestido e sim uma camisola de cetim, além de não cheirar vômito. Ela me deu banho? Não posso pensar nisso agora, é a menor das minhas preocupações. Ignorando o peso da ressaca, removo-me para o banheiro do quarto e lavo a maquiagem no rosto. Uma aparência inocente deve ajudar na missão.

Quando passo pelo mezanino, percebo que o grande tapete nas escadas desapareceu e agora há apenas degraus e mais degraus nus. Passo por eles e demoro o máximo que consigo num passo lento à sala de jantar da residência Falcone. Stella está sentada com uma revista aberta e xícara entre os dedos. Paro na porta, sem saber o que dizer. Meus dedos roçam impacientemente, penso num zilhão de palavras para começar um discurso e não consigo nenhuma boa, mas tenho que falar alguma coisa.

— Senhora Falcone, eu...

— Você o quê? — ela me cortou ao virar a página da revista. — Sente muito por ter feito papel de pateta na frente de meia centena de pessoas, quebrado um objeto inestimável e manchado meu lindo carpete? É isso que quer dizer?

Sim, é isso que quero dizer. Me sinto péssima e envergonhada. Desejo sair correndo, me esconder no meu quarto e ficar com a cara inchada de tanto chorar, como uma adolescente. Infelizmente sou uma adulta agora e preciso lidar com os meus problemas sem dar um passo atrás.

— Sim, é o que eu gostaria de dizer. Sinto muito por tudo isso. De verdade, eu não sei o que deu em mim para...

— Pessoas fracas para o álcool não devem beber. — Ela se desvia para me olhar pela primeira vez desde que cheguei e alfineta-me: — Se conhece seus limites, não ultrapasse, garota. Sabe o que isso significa, não sabe?

Sinto meus pulmões enchendo de bile. Ela não precisa dizer muito mais para que eu me sinta pior do que já estou, estendida na lona. Reprimo minhas glândulas lacrimais de derramarem num momento como esse, porque já é muito humilhante o desprezo e a sensação de falha. Todo o meu esforço foi estragado... Por minha culpa. E, em parte, sei que Stella não têm que me desculpar ou ser bondosa com meus erros. Se eu tivesse me controlado mais, não estaria aqui com a cabeça baixa, prestes a assinar minha carta de demissão. Não sei mais o que fazer. Me ajoelhar e pedir por perdão é muito extremo — e sim, eu o faria se achasse que poderia fazê-la mudar de ideia. Sem outra opção, eu me forço a falar alguma coisa depois de todo esse tempo em silêncio.

— Eu vou retirar minhas coisas do escritório na segunda-feira. — E marchar para longe da vida que sempre sonhei. Pressiono minha boca. Preciso manter um pouco da dignidade, então limpo meu rosto um pouco molhado pelo choro silencioso que escapole sem pedir licença. — Foi uma enorme honra trabalhar com a senhora... Sinto muito por tudo. — Com sinceridade, me afasto, porque Stella não vai sequer me olhar de novo. Vou ir embora dessa casa, me enfiar embaixo das cobertas e ficar em lástima pelo fim de semana inteiro.

— Hathaway? — Falcone se pronuncia. Paro de andar e aguardo a conclusão de sua bronca, a cereja no topo do bolo em forma de frase afiada e venenosa. Mas, ao olhá-la por cima do ombro, vejo-a revirar seus olhos. — Não seja tão dramática. Eu não vou te demitir. — Meu coração saltita para a boca e me demoro a acreditar que isso está mesmo acontecendo, mas não há sombra de dúvidas que ela continua me esperando. Seus braços estão cruzados e o rosto voltado ao meu. O queixo aponta uma vez para a cadeira. — Venha aqui.

Obediente e com timidez, eu vou para a primeira do lado esquerdo e me sento.

— Não vai me demitir?

— É claro que não vou... A não ser que continue com a barriga vazia. Coma alguma coisa. — Instrui Stella, com uma preocupação quase invisível na voz.

Eu, timidamente, pego um pedaço de bolo de laranja e coloco em cima de um pequeno prato de porcelana. Noto o quão boba pareço chorando por algo que nem aconteceu e sorrio em forma de desculpas, buscando melhorar o clima pesado. Stella se volta a leitura matinal, mas vejo uma sombra de diversão em seus lábios. Não entendo porquê ela não me chuta para o olho da rua, mas também não serei invasiva ou questioná-la — e arriscar que mude de ideia? Jamais. No fim, comemos em silêncio e eu encho a barriga com minha nem tão odiável chefe do lado. 


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