A porta mal range ao me dar passagem. A primeira coisa que vejo é Stella sentada em um dos degraus, com um roupão marrom e o cabelo preso. Meus movimentos diminuem gradualmente.
— Eu estava terminando tudo com o Gabe. Não vamos ser nada além de bons amigos a partir de hoje. — Respiro e expiro. Meus pés doem por ter passado por tantos cenários sem uma proteção adequada e minha roupa, além de manchada, tem alguns rasgos quase imperceptíveis, mas tudo o que me importa é essa ruiva bem na minha frente. — Desculpe por ter ido tão de repente... Ele merecia que eu fosse sincera com ele.
Stella, ao invés de contrair uma careta, somente acena e estica seu braço ao ficar em pé.
— A água está esfriando. Venha.
Alivia saber que ela não é a mesma de antes tanto quanto me choca. Estou lidando com Stella Companheira, não com Stella Chefe. A diferença das duas é tão gritante que meu cérebro pifa com a comparação. Subimos para o segundo piso, nos encaminhamos a uma suíte e seu tapete na porta. Stella fica atrás de mim, retira a camiseta de dentro da saia e desafivela o pequeno cinto preto. Ela abre o zíper, empurra todos os tecidos para fora do meu corpo e ainda prende minhas madeixas num coque. Quando estou nua, seus braços me guiam para dentro do box. Eu entro na bacia morna, me sento e admiro a retirada de seu roupão, no momento em que ela vem, também nua, ao meu encontro. Nós nos sentamos uma em frente a outra, com espuma cobrindo até a região dos seios. Velas acesas compõnhe a luz de fundo, iluminando-nos com um brilho amarelado. Ela fez... pra mim.
— Ei, você e aquela Hellen...? — é a dúvida mais pertinente que aparece para mim. Vou me morder se não souber.
— Nós não tivemos um caso, se é o que está pensando. Somos apenas boas e velhas amigas... Conhecidas, hoje em dia. — Uma sobrancelha laranja é arqueada para mim. — Por quê? Ciúmes?
— Talvez... — Não quero admitir com todas as palavras que me senti um patinho feio perto da perfeita Hellen. É humilhante. Ao invés disso, entro em um silêncio agradável.
Stella puxa minha perna para seu colo e aperta o peito do meu pé, iniciando uma massagem adorável. É boa nisso.
— Sinto muito por ter te feito passar por tanto.
Todo o meu ser se solta na banheira e eu fecho os olhos, repassando toda a minha luta desde que decidi me inscrever naquela prova para assistente da substituta de Anna Wintour. Foram tantos momentos que eu quis me atirar da ponte; tanto trabalho duro, todo o meu esforço árduo... Respostas ácidas, ordens insaciáveis e tempo jogado fora indo atrás de comidas que ela nem iria encostar. Stella me fez comer o pão que o Diabo — ela — amassou, e nem por isso eu desisti. Recordo-me de tudo, exatamente tudo. Pode ser tolo eu tê-la perdoado a essa altura tão facilmente, mas eu não quero mais jogos.
— Deixe o passado no passado. Eu fui forte para superar todos os obstáculos que criou pra mim e estou aqui, firme e forte. No fundo, me sinto grata. Você me fez ver que eu suporto mais do que pensava, e que sou uma mulher forte.
— Todas nós somos. — Stella sussurra. — E você é admirável, pequena Elena.
O apelido derrete-me como manteiga. Eu me endireito e me fixo em Stella.
— Por muito tempo eu odiei e admirei você ao mesmo tempo, com a mesma intensidade. Foi... cansativo. — Devorou meu peito, minhas noites e minha saúde mental. Dyanne quem diga. Ela é prova viva de todos os meus surtos... Mas ela vai entender quando me ver com Stella e saber que ela não é mais a mesma que era comigo. Nós duas evoluímos mais do que qualquer um cogitava. E pensar que no nosso primeiro encontro ela odiou minha vestimenta e me repreendeu por estar atrasada, e então corte para meses mais tarde e cá estamos, juntinhas em uma banheira e cobertas por bolhas de sabão. — Hoje em dia eu só... acho que estou começando a amar você.
Stella prende a respiração.
— Me amar?
Ama-la?
— Sim. — É cedo demais para essa palavra? Sim, é! E que se dane! — Eu passei por muito pra chegar aqui, não quero mais perder tempo com você. Tudo que eu quero é me resolver com a mídia e ficar do seu lado. Quero que as coisas sejam fáceis e poder ter momentos simples, como passear na Times Square ou te ajudar a escolher um vestido para a Fashion Week. Eu quero tomar sorvete, não ter que me irritar pensando se você vai detonar a roupa que eu escolher para ir a empresa e... te ver sorrir. — Meus dedos se entrelaçam aos dela. Nem mesmo o reflexo de seus fartos seios me tiram o foco dos dois pontos de jasmim ao lado do nariz. — Eu quero ser sua. Sua namorada.
Stella absorve, feito uma esponja, o que eu disse. Seu semblante vai se iluminando, uma cor rosada nas bochechas e estrelas pontilhadas nas pupilas. A coisa mais linda do universo. Eu facilmente compraria um quadro pintado com esse sorriso esplêndido e tão genuíno.
— Também estou começando a amar você... E quero ser sua namorada, Elena. — Stella afaga minha pele molhada, sustanta nossas faces alinhadas e se perde na imensidão do meu olhar. — E vou tentar não te arrasar mais... A não ser que você invente de copiar um dos piores looks de Blair Waldorf de novo.
Essa deixa faz com que eu caia na gargalhada, e ela me acompanha. Meu rosto se inclina para beijá-la.
— O que eu fiz para merecer alguém tão odiável?
— Achei que eu já tivesse subido ao posto de adorável. — Ela faz bico. Stella fazendo bico é uma das oitavas maravilhas do mundo, eu juro.
— Nem sempre.
Ao fim dos risos, nós nos beijamos apaixonamente. E não há muito mais o que acontecer aqui — na verdade há, mas como estamos no fim da história, imagine que a câmera está se desfocando da nossa imagem quando eu me viro de costas para Stella dar um tratamento especial aos meus ombros e a lente vai pegando uma vista mais panorâmica. Há risadas, velas vermelhas em formato de flores queimando e sua imaginação pode rolar solta a partir daqui. Nem tudo que é bom na vida dura para sempre, e eu já estive na sua pele por mais vezes que posso contar nos dedos das mãos e dos pés. Não saber o que acontece no próximo capítulo não é quase tão odiável quanto Stella Falcone, não é? Ah, não. Ela não vai ser mais assim por um bom, bom tempo... Isso eu posso garantir.
✿ ✿ ✿
Fim?
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Odiável
RomanceCom a aposentadoria de Anna Wintour, a VOGUE têm uma nova editora-chefe; a mais nova sensação crítica do momento no mundo da moda: Stella Falcone. Elena Hathaway, uma ex-universitária recém-formada, consegue o cargo mais disputado contra...