Capítulo 6

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Não estou tão animada para sair, mas Dyanne reclama que também não está e mesmo assim marcamos de encontrar alguns amigos da faculdade no bar do bairro. O ponto bom vai ser saciar a vontade de tomar uma boa cerveja e afogar minhas mágoas mais profundas da diabólica Stella Falcone que me persegue até em sonhos.

Essa noite tive um pesadelo onde ela era a Bela Dama e eu Coraline, fugindo de suas garras afiadas ansiosas por sugar cada gota do meu sangue e colocar botões em meus olhos. Aliso meu vestido marrom soltinho e cinto grosso preto que modela minha cintura, perguntando-me o quão Stella acharia ruim me ver assim. Mas não me importo... Não hoje. Amar moda não quer dizer que eu precise me produzir inteira para ir ao buteco na esquina, certo? O código de vestimenta deve se adequar ao ambiente, portanto, estou bonita e confortável.

— Ela está acabando com a sua autoestima, não é? — Dyanne pergunta da porta.

Usa uma calça rasgada e camiseta sem mangas do Artic Monkeys, o favorito dela. Faço uma careta.

— Quer que eu responda e comece a chorar ou prefere sair de casa primeiro? — a interrogo.

Ela devolve minha careta.

— Vamos embora desse cafofo, gatona.

✿ ✿ ✿


Dyanne me faz mais que bem. Estou sorrindo de uma das piadas idiotas dela quando adentramos o Spices e atravessamos a pequena multidão para a mesa onde há algumas figuras da época do colegial que conhecemos. Em primeiro lugar temos Maya Lancaster e Annie Goode. Embora estivéssemos em cursos diferentes, festejamos juntas algumas vezes. Me uno a elas, que me recebem com batidas de palmas animadas e gritinhos eufóricos. Trocamos abraços.

— Meu Deus, Elena, você parece derrotada. — Maya franze a testa marrom. Está com os cabelos lisos escorridos e sobrancelhas feitas com lápis. Ela é a mais alta do nosso grupo, parece uma modelo de pele escura. — O que aconteceu?

— A chefe dela aconteceu. — Dyanne tosse.

Faço uma careta desgostosa quando me acomodo a mesa e puxo um dos copos de cerveja delas para mim. Tomo longas goladas do líquido deliciosamente amargo cor-de-âmbar no copo de Annie, que me empurra mais um.

— Você parece estar precisando.

— E estou.

— Mas você não conseguiu o trabalho que tanto quis? — Maya coça o queixo. Foi ela quem me avisou da entrevista para a vaga de assistente de Stella, porque uma das mães têm contato com o mundo da moda e essas coisas.

— Sim. E ele veio com um demônio me supervisionando. Meninas, estou tão exausta que posso me dormir em cima dessa mesa. — Dobro meus cotovelos no tampo e deito a cabeça. Dyanne me puxa para cima. — Desculpe. É que...

— Coloque pra fora.

— Vomita tudo.

— Stella Falcone é uma maníaca diaba caricata! Eu não posso acreditar que estou revivendo uma versão ruim de O Diabo Veste Prada. Quer dizer, sei que a maioria dos patrões são um carrasco, mas sinto que estou num filme aonde o roteiro fez ela ser mil vezes pior. O que diabos está acontecendo na minha vida? Ela é amarga ao ponto de me fazer atravessar metade de Nova York atrás de um prato de comida pra dizer que está sem fome depois que eu o consigo? Que porra essa mulher pensa? — falo e falo sem parar, repleta de indignação. Identifico o mesmo sentimento estampado em minhas caras acompanhantes. Bato minha testa na palma da mão. — Desculpem.

— Seu sonho está virando um pesadelo. — Dyanne completa minha frase. — E eu já disse que tudo bem se contratarmos um assassino de aluguel pra dar cabo nessa piranha. Ou nós damos. Vamos entrar com sobretudos vermelhos naquela empresa empunhando metralhadoras e falar: acabou pra você, Bruxa Falcone. — Ela simula armas com as mãos e dá tiros repetidos na parede.

Nós três caímos na risada. A seguro pelo braço e deito a cabeça no alto do ombro.

— Obrigada por isso. Amo você, Dy.

— Eu também, El.

— E você não vai se deixar abater por uma velhoca com falta de um bom sexo, vai? — Maya se empertiga. — Ela não pode vencer. Elena, sabemos o quanto você se esforçou por esse momento, venceu uma pilha de candidatas e ainda não foi dispensada. No mínimo isso diz que têm um talento aí. Se Stella te achasse tão ruim assim, já teria te dispensado, não?

Parando para pensar, ela tem razão. Stella não têm cara de quem se compadece com erros. Se eu fosse um caso perdido, estaria no olho da rua ao fim do primeiro dia. Eu sei que ela vê algo em mim que vale à pena, mas não quer admitir isso. O que eu preciso? Me demitir? Não! Me aproximar mais dela e tentar arrancar a grossa casca da armadura que Falcone sempre veste. Tenho que fazê-la confiar em mim e perceber que podemos ter uma relação legal de mútuo respeito dentro da Vogue. Talvez, se eu preparar o evento na casa dela sem nenhum deslize ela finalmente baixe a guarda comigo.

Ora, o que eu estava pensando antes! Faz só alguns dias que estou no cargo, não é como se ela fosse rasgar elogios a uma novata e me deixar ficar acomodada. Pensando no que Maya diz, Stella pode estar fazendo um teste para ver o nível do meu psicológico sob pressão.

— Você acaba de salvar minha vida. — Vanglorio Lancaster. Ela revira os olhos e dá um sorrisinho. — Outra rodada?

— Outra rodada.

— Nem precisa perguntar.

Estico o braço. Quero uma dose dupla dessa vez. Se não voltar para casa embriagada e rindo aos ventos por nada, vou me arrepender de ter saído. É o mínimo que mereço depois de uma semana inteira sobrevivendo a uma odiável mulher.

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