Surpresas

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Amanda

Passava um pouco das onze da manhã quando deixaram a cachoeira. O dia estava lindo e o sol raiava fortemente no céu, tudo parecia perfeito, parecia encantado. Amanda sentia-se como se as palavras fugissem de sua boca, queria expressar o quanto aquilo era incrível, mas simplesmente não haviam adjetivos que fossem bons o suficiente para descrever aquele momento.

Então ela demonstrava com ações.

Não desgrudou do corpo de Antônio nem por um minuto, a não ser que fosse preciso e sentia o coração bater mais forte a cada vez que o tocava. Enchia-o de beijos e carinhos sempre que podia e ainda tinha o olhar... Um olhar repleto de gratidão e paixão que não deixava seu rosto em momento algum. O lutador, por sua vez, também não escondia a felicidade, os olhos dele brilhavam e refletiam a mesma paixão que os dela. Amanda sentia que poderia passar horas apenas observando aquela carinha meiga de adolescente apaixonado com a qual ele a olhava.

Parecia loucura pensar no quanto eles se desencontraram até chegarem ali. Olhando para trás, soava engraçado a forma como cada passo, cada escolha, por menor que fosse, tinha sido essencial para finalmente estarem juntos. O destino precisou trabalhar com fé e muita dedicação até alcançar aquele resultado.

Onde será que estariam se tudo tivesse sido diferente? Se nunca tivesse beijado Gabriel em uma noite de bebedeira, por exemplo. A amizade colorida com ele nunca teria existido, afinal, foi aquele beijo que os levou a um acordo de sexo casual esporádico e se isso não tivesse acontecido, dificilmente ela teria feito o mesmo acordo com Antônio posteriormente.

E se Amanda tivesse recusado quando os amigos decidiram, de última hora, no meio de uma tarde relaxante na piscina, mudarem os planos e irem para uma balada? Antônio nunca teria presenciado a conversa de Gab e Larissa e não teria motivos para sentir ciúme. Aquela foi a noite em que estiveram juntos pela primeira vez e parecia maluquice pensar em como ela foi apenas o resultado de uma ideia aleatória de Larissa, impulsionada pelo álcool.

E o que teria acontecido se a médica tivesse cedido ao medo naquela noite? E se ela tivesse ouvido quando tudo em seu corpo gritou para que ela não ultrapassasse aquela linha? Definitivamente teriam seguido um caminho muito diferente e talvez não estivessem naquela viagem.

E embora a lembrança fosse dolorosa, o incidente traumático no hospital havia sido um ponto crucial para que Amanda reconhecesse seus verdadeiros sentimentos por Antônio. Ela deixou, por tanto tempo, os receios a convencerem de que tudo que sentia por ele não passava de amizade e atração física, que precisou esbarrar em seu momento de maior vulnerabilidade para conseguir enxergar a verdade. 
Entretanto, se recusava a dar créditos ao Felipe por isso e, de fato, ele não merecia. Nada do que ele fez ou do que a causou tinha uma boa intenção. Sendo honesta consigo mesma, era extremamente doloroso para Amanda lidar com o fato de que uma coisa tão especial estava diretamente relacionada a pior circunstância de sua vida. Antônio tinha uma versão linda sobre o momento em que descobriu estar apaixonado por ela, mas Amanda nunca poderia dizer o mesmo, pois, percebeu que o amava em meio ao desespero e dor, enquanto rezava para continuar viva. 
Ela teria notado, cedo ou tarde, que o amava, a verdade sempre vem a tona, mesmo que tivesse demorado um pouco mais ou que as coisas fossem diferentes, Amanda gostaria de ter tido essa oportunidade, mas lhe foi roubado o direito de tentar, de vivenciar essa descoberta. O que o Felipe fez, embora tenha acelerado o processo, teve um custo muito alto para ela... Um preço que ela ainda estava lutando para pagar.

Amanda estremeceu com os próprios pensamentos, sentindo um calafrio percorrer sua espinha enquanto a imagem dele vinha em sua mente. Aquelas lembranças eram um fardo que ela odiava carregar, pois, odiava a forma como se sentia ao pensar nisso e odiava ainda mais o fato de ele ter qualquer impacto sobre ela.
Estava tão cansada de ter que fingir que havia esquecido, ao mesmo tempo em que temia que os outros soubessem o quanto aquilo ainda a atormentava. Era exaustivo fingir estar bem, esconder suas emoções para evitar que se preocupassem com ela ou que tentassem ajudá-la. Ela já tinha ajuda, estava fazendo terapia e até reconhecia algum progresso, mas superar um trauma é um processo lento e nem sempre possível, as vezes é necessário entender que algumas dores não podem ser superadas, mas que é possível aprender a conviver com elas. E ela estava tentando, de verdade, aprender a viver com isso. No entanto, fazê-lo em segredo tornava tudo mais árduo e mais cansativo, porém, que outra opção ela tinha? 

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