1. Um psicopata na chuva

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[Esse capítulo contém trechos +18]

O rapaz nem acreditou quando apagou as luzes da recepção. Finalmente ia para casa! Porra, estava muito cansado. Além de conciliar a faculdade com o estágio, ainda precisava descolar uns trocados aos finais de semana, pegando bicos aqui e acolá. Já tinha feito de tudo, desde de vestir-se de hambúrguer gigante em uma lanchonete do centro da cidade até passear com um número desaconselhável de cães de apartamento de uma vez só. Enquanto a maioria dos colegas estava aproveitando os últimos instantes da vida universitária em festas e comemorações, Han Jisung empenhava-se em conseguir o suficiente para comer e fechar as contas do mês.

Era por essas e outras que o semestre mal havia começado e já se sentia um bagaço. Por que diabos aquele ano estava passando tão devagar? Só queria pegar o diploma da graduação e começar a juntar dinheiro para montar a sua própria clínica veterinária. Aquele plano levaria uns bons anos e provavelmente consumiria muito de sua sanidade mental, mas essas constatações não pareciam capazes de desanimá-lo. Han amava os bichinhos e desde pequeno sentia uma necessidade natural de cuidar e proteger cada um deles, independente do tamanho ou da espécie.

Atender o poético chamado da vocação, contudo, consumia cem por centro de seu tempo. Ficava tão pouco em casa que a qualquer momento nem a planta da sala o reconheceria mais. Mesmo assim, não era de reclamar. Apesar dos pesares, sabia que depois que terminasse a faculdade no final daquele ano, tinha um emprego garantido.

O dono do lugar onde trabalhava, senhor Choi Doyun, era um veterinário tradicional da cidade e pertencia à velha-guarda daquela classe profissional. Isso queria dizer que depois de décadas de dedicada atuação, a aposentadoria havia começado a bater à sua porta. Como não tinha herdeiros, acabara praticamente adotando Jisung como seu filho e pupilo. Confiava tanto no mais novo que havia cedido uma cópia da chave para que o outro pudesse abrir e fechar a clínica em situações pontuais, como era o caso naquele dia.

Enfim, devaneios de lado, era hora de ir para casa. Han cantarolou feliz ao livrar-se do jaleco, enfiando a mochila nos ombros na sequência. Apesar de sentir-se esgotado, dificilmente perdia o bom-humor. Estava prestes a encher a cara de lámen, cair na cama e dormir como uma pedra e isso parecia satisfatório o suficiente para mantê-lo sorrindo.

Apagou o último conjunto de luzes e pegou o guarda-chuva reserva que mantinham na recepção, pois uma tempestade caía incansavelmente do lado de fora desde o final da tarde. Chegaria em casa igual um pato molhado, mas quem se importava? Só queria o aconchego de sua cama.

Quando puxou a porta da entrada, o pequeno sino fez um barulho típico e sutil. Preparou-se para dar um passo para fora, mas ao invés disso quase teve um infarto ao deparar-se com uma pessoa parada ali, totalmente encharcada e coberta pela penumbra, em uma cena digna de filme de terror dos anos setenta.

— Cacete!!! — praguejou em um berro. Que merda era aquela?! Achou que fosse desmaiar quando o raio iluminou por o rosto a sua frente, promovendo um estrondo no ar logo depois.

Han teve certeza de que aqueles eram os seus segundos finais de vida. Estava na frente de um psicopata, só podia ser. Ele tinha cara de ser perigoso, com grandes olhos medonhos e uma feição nada amigável de quem tinha matado a mãe e guardado a velha embalsamada de lembrança num quartinho no sótão. Os joelhos começaram a tremer e engoliu o choro, pronto para implorar pela própria vida.

O que aconteceu, no entanto, foi que acabou empurrado pela mão molhada e fria sem avisos, de volta para dentro da clínica.

— Pelo amor de Deus, não me mata, eu ainda nem me formei!!! — choramingou, tentando proteger-se atrás de um escudo ridículo feito com os braços. Faltava tão pouco pra graduar, ele não podia ir embora e voltar de novo no final do ano, pra Jisung morrer pelo menos diplomado?

Miau, passa no débito | MinsungOnde histórias criam vida. Descubra agora