Assim que saí do curso, senti o meu coração apertado por perceber que aquilo, de forma alguma, era algo que eu desejava fazer. E se algo que eu fielmente acreditava gostar não era tão bom assim, como que eu descobriria o que desejava fazer? Cadê a vida para me enviar os benditos sinais?
— Bob não comeu hoje. — Meu pai me entregou o cachorro na coleira e o seu semblante se entristeceu.
Combinei com ele pela manhã de tentar alimentar o cachorro e preparar suas coisas antes de levá-lo para o veterinário.
— Estou preocupado. — Declarou.
Eu não disse nada, estava alheia demais. Eu pensava em tudo e em nada ao mesmo tempo. É como se muitos problemas viessem ao meu encontro e começassem a me afundar novamente.
O que será que há com o meu cachorro?
— Vamos? — Henry abaixou, tomando Bob em seu colo. O menino encostou em meu ombro e abriu um sorriso reconfortante. — Talvez seja apenas um mal estar, lembra?
— Lembro.
(...)
Assim que entramos pelas portas do consultório e confirmamos a consulta, eu só conseguia reparar nos resmungos baixos do cachorro. Ele choramingava baixinho como se estivesse sentindo algum tipo de dor. Aquilo me causou uma tristeza tão grande, que quando menos percebi, uma lágrima rolou de meus olhos.
— Vai ficar tudo bem. — O menino tentou me consolar e eu assenti bem devagar, como se quisesse acreditar naquilo também.
— Senhorita Luna? — A atendente nos chamou. — Sala 5, por favor. — Ela abriu um sorriso, me direcionando com a ponta do dedo.
Quando chegamos no consultório, notei uma doutora com um sorriso amável digitando alguma coisa em seu computador.
— Boa tarde! — Ela veio em nossa direção com uma energia muito boa. — Olha, eu vi aqui no sistema os sintomas que você constatou que ele tem demonstrado estar. E vamos precisar de alguns exames para saber precisamente o que o seu cachorrinho pode ter. — Ela pegou Bob no colo com toda delicadeza possível. — Os exames gerais podem demorar algumas horas e sair só daqui a uns dias, tudo bem? Enquanto isso, não posso medica-lo. Mas alguns cuidados serão necessários, como por exemplo a alimentação do cachorro e a hidratação. — Ela explicou tudo direitinho enquanto levava Bob para a balança.
Passamos tantas horas na recepção, que Henry foi até mesmo em uma lojinha no outro lado da rua para comprar alguma coisa e comer. Mas eu estava pensando em tantas coisas que meu estômago revirou só de olhar o sanduíche agora em minhas mãos.
— Você não vai comer? — Henry perguntou assim que me viu jogar o sanduíche de uma mão para outra.
— Não estou com fome. — Respondi o vendo assentir levemente a cabeça.
— Entendi. — Ele começou a cutucar os dedos como se tivesse mais alguma coisa a dizer. — Quer... me contar o que está sentindo?
— Não quero conversar. — Declarei, pondo um ponto final. Ele negou com a cabeça, não concordando com o fato de eu não falar. Me disse uma vez que o fato de eu não compartilhar os meus pensamentos e sentimentos o incomodava bastante, mas não seria da noite para o dia que eu mudaria isso.
Tinha uma tremenda dificuldade de me expressar. Não sabia como colocar em palavras o turbilhão de sentimentos que se apossaram de minha mente. Era difícil ter que falar dos problemas. Sua garganta se fecha a cada palavra, seus olhos se enchem de lágrimas cada vez que você junta os lábios e no final é igual: um pequeno consolo da outra parte. O consolo muita das vezes nem se quer chega perto de resolver a sua situação.
— Tudo bem. — Forçou um sorriso. — Vou estar aqui até que se sinta melhor.
Aquilo me fez questionar sobre outra coisa. Era nítido o seu esforço. Henry deixou bem claro o quanto a falta de conversa entre nós dois o magoava, mas mesmo assim, ele sorriu e disse que estava tudo bem, mesmo o incomodando.
Por que não fiz o mesmo? Por que não falei só brevemente o que estava sentindo? Isso era se esforçar pelo relacionamento, não é? Por que simplesmente não soltei um "acho que não me sinto bem. Estou triste". Era tão difícil assim dizer essas meras palavras?
Eu via o seu esforço, mas percebo que da minha parte, não é na mesma intensidade.
Eu precisava trabalhar nesse meu lado.
(...)
Assim que chegamos em casa com Bob nos braços, meu pai veio correndo em minha direção. Expliquei a ele o que a veterinária me passou e o homem apenas assentia, ouvindo atentamente.
Os exames sairiam daqui a cinco dias. E nesse meio tempo, se Bob piorasse eu deveria voltar para que ela indicasse algum medicamento, antes mesmo dos exames.
— Eu vou para o quarto, tá bom? — Peguei Bob no colo e percebi Henry me seguir enquanto eu cruzava o corredor em direção ao quarto. — Henry. — Parei, me virando para o menino. — Por que não vai para casa? Nos vemos amanhã na escola. Acho melhor descansar. — Forcei um sorriso amigável para o menino.
— Tá tudo bem! Eu estou ótimo, não preciso de descanso. — Declarou, se aproximando mais de mim.
— Eu preciso, Henry. — Percebi que um silêncio se instalou entre nós no momento em que eu disse aquilo. Henry me olhava mais uma vez com os olhos cansados, como se eu repetisse novamente os mesmo erros.
— Quer espaço? — Uma expressão incrédula surgiu em seu rosto. — Por que está fazendo isso de novo? Por que está se afastando, Luna? — Tocou o meu ombro. — Temos que resolver os problemas juntos...
— Não estou me afastando! Estou pedindo para me deixar descansar. — Me afastei um pouco de seu toque. — Somente isso. — Ele parou por alguns minutos tentando pensar em algo para dizer. Foi se afastando ao poucos até que se virou, indo em direção a sala em passos lentos até a porta.
Ele foi embora.
Bob se debateu em meu colo até conseguir descer. Caminhou pelo corredor indo atrás de Henry com latidos baixos. Fui atrás do cachorro percebendo ele sentado em frente à porta balançando o seu rabinho. Esperando que Henry voltasse.
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O Amor NÃO Pode Curar II
RomanceLIVRO II DA DUOLOGIA "O AMOR PODE CURAR". Luna vê o relacionamento de seu irmão com a sua cunhada como um espelho. Pois Luke e Hannah sempre estiveram ali no momento mais difícil um do outro. Viveram longos anos juntos e agora finalmente iam se casa...