24- Saya

91 12 56
                                    

-Não deve ser verdade.

Um buraco se formava abaixo dos meus pés, no chão do meu quarto. Eu tinha passado a última hora andando de um lado para o outro pensando em como meus sentimentos são confusos. Uma hora eu estava torcendo para que Emma também gostasse de mim, e agora que sei a verdade, torço para ser tudo um sonho. Seria ótimo se uma cratera se abrisse no chão agora porque eu estava a fim de ser engolida.

Não pareço certa em simplesmente gostar de alguém. Mais errado ainda é gostar de uma garota. Eu queria... Eu não...

A almofada derruba meu abajur de cima do criado mudo ao ser lançada por mim. Junto dele caem papeis, maquiagem e... Um gemido escapa dos meus lábios. As delicadas flores bordadas por Emma me carregam de volta para aquele dia. Lembro-me de como meu coração saltou do peito quando ela me presenteou.

Por um momento, deixo-me viajar pela curva das pequenas flores. O vislumbre de seu sorriso aparece em minha mente, o mais encantador. Lembro-me de quando nos abraçamos no campeonato de xadrez. Ela foi a única que conseguiu me acalmar. Levo meus dedos até os lábios, os mesmos que ela havia tocado. Eu nunca havia me sentido tanto nas nuvens como naquele momento em que ela se aproximou e me beijou.

-Saya está tudo bem? Eu ouvi um barulho- Minha mãe aparece pela fresta da porta, me tirando do transe.

-Está. Eu só derrubei algumas coisas- Digo juntando toda a tralha que estava esparramada pelo chão.

-Amanhã eu não vou poder te buscar, então pergunte para a Pam se você pode pegar carona com ela.

-Pode deixar.

Ela fecha a porta do quarto, mas volta a abri-la segundos depois.

-E arrume a zona desse quarto. A Laila arrumou hoje cedo e já está essa bagunça.

-Tá bom mãe.

Enterro minha cabeça na almofada assim que a porta se fecha. Por que isso está acontecendo comigo?

A tela do celular acende. Uma mensagem de Emma aparece na tela. Mais um gemido me escapa. Meu dedo paira acima da tecla de responder. Devo?

Não.

Não Saya. Você está confusa demais. Nem parece você mesma.

Então eu tomo uma decisão. Clico no numero da Pam para mandar uma mensagem a ela me desculpando por tudo que havia acontecido. Talvez assim, eu volte a ser a Saya de antes. A Saya que não se apaixonava. A Saya que não gostava de garotas.

*

-Tudo bem- Ela tamborila os dedos na capa de seu caderno me deixando mais nervosa- Eu sabia que essa sua fase ia passar.

-Obrigada por entender.

Uma parte de mim sente alivio por Pam ter voltado a ser minha amiga, já que nos conhecíamos há muito tempo e isso também me faz lembrar como eu era antes. Mas... Algo ainda me incomodava.

-Preciso me desculpar por ter te chamado de sapatona... A não ser que você seja.

-Não! Claro que não.

-Ótimo- Pam se ajeita na cadeira abrindo espaço o suficiente para que eu me sente na beirada- Deixa eu te mostrar o vestido que usei na festa de casamento dos meus tios.

-Foi esse fim de semana?

-Sim!

Seus dedos deslizam pela galeria do celular até parar e abrir uma foto dela usando um vestido de brilho rosa com uma fenda na cocha. Seus cabelos estavam presos em uma trança com algumas flores decorando os fios.

-Uau. O vestido ficou perfeito e você estava linda.

-Obrigada. Com meu bom gosto é difícil ficar feia, não é mesmo?

Sorrio e assinto. Era bom estar de volta. Algumas coisas dentro de mim pareciam mais normais, mas não certas. Eu tinha certeza que ficaria bem até Emma passar pela porta. Ela ergue o olhar dos pés até a carteira onde costumo me sentar, e quando vê que não estou lá vasculha a sala em busca de mim. Meu coração desmonta quando seu olhar encontra o meu. Imediatamente seu rosto calmo é tomado por uma onda de emoções. Confusão, dor, traição, tristeza... Raiva. Eu gostaria de murmurar um pedido de desculpa para ela.

-A esquisita não para de te olhar- Diz Pam me tirando do meu transe- Ela ainda deve achar que pode ter a sua amizade. Você não deveria ter iludido a coitadinha.

Dar um meio sorriso é a única coisa que consigo fazer. Acho que se eu disser alguma coisa vou me engasgar com minhas próprias palavras e lágrimas. 

Os tons de rosa do meu arco-írisOnde histórias criam vida. Descubra agora