Mais uma vez os orcs riram-se em orgulho profundo. E o avançaram, também fechando os punhos para o ataque; só era uma benção para o casal que aqueles fossem orcs da mais pútrida ralé das cidades e não tivessem condições de adquirirem espadas ou machados, e nada os havia para confronto além dos próprios punhos pegajosos e espinhosos.
Não um, não dois, mas dezenas de socos e chutes eles confrontaram o homem, em fúria. Mas o homem — mostrando-se grande surpresa —, desviava de todos os golpes, de maneira tranquila e divertida, não apenas se lançando para os lados mas também revidando chutes na barriga dura dos orcs e socos em suas faces pálidas de besta-fera, e tudo mais que ele pudesse fazer.
A luta era um tanto estranha, porém, e parecia meio pesada além do comum, dados com uma força quebrada, com movimentos não tão ágeis.. A noite não deixava muito ver o que estava acontecendo, e a amalacã não sabia se o estranhava ou contemplava. Nem mesmo sentia mais medo, agora o sentimento que a prevalecia era a pura e humana estranheza.
Mas o homem nem por isso cessava. Antes, ele deslizava pelo chão molhado, desviando dos seus inimigos, sempre dando olhadelas sobre os ombros para ver a expressão de possível surpresa nos olhos da sua acompanhante. Os orcs tentavam apanhá-lo nestas horas, mas ele conseguia lhes dar cabeçada no nariz, jogá-los no chão, empurrá-los contra as lixeiras vastas e altas escondidas nas sombras do beco. Com um único golpe de punho por vezes ele os derrubava, enquanto os próprios orcs tampouco conseguiam lhe inferir um arranhão que fosse.
O espetáculo até que era de um vislumbre interessante, mas... Ora, era noite de tempestade, e o chão estava molhado e escorregadio. Não foi tarde que o homem tentou um último desvio contra o orc menor e perdeu o equilíbrio quando pisou sobre um pequena poça d'água e não conseguiu evitar de cair.. Um orc ameaçou socá-lo e nem mesmo precisou lhe encostar um dedo para o homem já logo cair. Um espanto não apenas para o jovem humano, mas também para o próprio orc que não esperava aquela reação. Por um instante pareceu mesmo que ele viria esperá-lo se erguer ou algo semelhante, mas sua perna já havia sido erguida para um chute e ele não conseguiu evitá-lo...
No exato instante em que o seu pé de orc foi confrontar o rosto do humano, porém, de repente uma muralha de músculos altos o apanhou pelo colarinho e o arremessou contra a parede mais próxima, em uma velocidade e força tamanhas que por um segundo pensaram ser um raio da tempestade que o houvesse atingido. Mas não, era apenas Tresham, que acabava de pegá-lo pelo cangote e arremessá-lo para salvar o homem.
Nem mesmo as tempestades — explodindo em urros pelo céu — souberam assustá-los tanto quanto a presença inesperada do guerreiro; os orcs nem mesmo souberam o que fazer, e logo se entreolharam tentando discutir — sem palavras — se deveriam ou não atacá-lo. Uma questão que não souberam responder, para a sua infelicidade, pois Tresham já logo se aproximava e os vinha em confronto, nem sequer brandindo espada, mas deixando-a dormindo em sua capa rasgada, enquanto a ponta da lâmina tocava o chão e rangia alto conforme riscava o solo e soltava faíscas da cor do fogo. Como um trovão eram os seus golpes, como um urro eram os seus passos. Os orcs tentavam pedir clemência e lhe dizer palavras incertas, mas o guerreiro nunca os permitia, e logo os arremessava contra o chão com socos em suas faces pálidas de orcs brancos.
— Saiam daqui — ele depois disse ao casal. E nada mais os falou depois.
Simplesmente, quando já todos os orcs no chão, ele apanhou sua espada, ergueu-a para o alto e ameaçou o ataque fatal, a fúria final, que mostraria para todos que tivessem consciência que não era correto atacar inocentes em becos escuros. A lâmina aproximava-se de cortar a garganta do primeiro orc, o mais alto do grupo, aquele que ele julgava ser o líder; a lâmina mirando em sua garganta; nem meio metro de distância entre a prata cortante e o pescoço de horror , e então...
— Não. Não — de repente ouviram. O homem se pôs entre o orc e a espada do guerreiro. E Tresham, não fosse veloz como era, parou-a a meio metro de atingi-o. E por fim, em derrota, o homem completou, e o disse: — Eles são meus amigos!
VOCÊ ESTÁ LENDO
As Viagens de Um Vagante Perdido
Fantasy"... Seus olhos eram afiados, seu coração era mistério. Para o além dos mares e das terras ele marcha, sem ninguém jamais saber para onde vai. Uma espada à cintura, poções ao cinto, uma máscara ao rosto, e um oceano de monstros a matar. Uma sombra...