Capítulo 8

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          Do outro lado, os lobos do quarto saíam todos pela janela...

          A família se abraçava dentro do armário, ouvindo os lobos passarem a não mais que um metro de onde estavam. O chão tremia. Seus ouvidos zuniam com aqueles gemidos pavorosos. A menina derramava lágrimas, apertando os braços de sua mãe até lhe tirar o fôlego para não gritar. Demoraram minutos até que a mãe tomasse coragem para permitir que seus filhos saíssem do guarda-roupa.

          Abriram a porta com delicadeza, apenas uma fresta, para ver se estavam libertos. E um alívio tremendo os consumiu ao verem que estavam. Realmente não havia mais nenhum daqueles monstros. Desceram, então, os três correndo as escadas, atravessaram os corredores, sempre atentos caso ainda houvesse algum, e foram direto para o celeiro ao outro lado da fazenda.

         Tiraram o cavalo do seu estábulo aos sussurros e em silêncio. Tudo na maior das velocidades. A mulher e seu filho trataram de ir armar a sela para pô-la sobre o animal, enquanto a garotinha manteve-se a olhar para o nada e para o além, a noite escurecendo toda a aresta... Até que uma sombra lhe fez movimento ao longe. E essa sombra grunhia, tinha patas, rangia. Essa sombra era um lobo, que começou de imediato a correr na direção deles. Estava ainda distante, mas se aproximava com velocidade; aparecendo e desaparecendo conforme a escuridão o devorava e o cuspia.

         A menina entrou em tamanho desespero que quase engoliu a própria língua ao apontar e berrar:

          —... M-Mãe...!

          Não deu tempo de firmar a sela, tiveram de jogá-la no chão e abandoná-la. A mulher pôs a menina por primeiro, depois subiram ela e seu filho sobre o cavalo. O garoto estava na frente guiando o alazão, e o fez correr ao máximo que suas patas o proporcionavam.

          A mulher continuava olhando para trás conforme o galope a removia para o distante. Agora havia dois lobos, que em breve tornaram-se três, depois quatro, cinco... A cada passo que davam para a estrada, mais e mais lobos começavam a lhes surgir.

          E velozes eles eram. Uma disputa de patas e força. O cavalo dando tudo de si para salvar a própria vida e a dos seus donos. Os lobos, rangendo e gritando para expurgarem toda a ira e chegarem ao mais perto que conseguissem de suas presas. Estavam chegando perto de morder o cavalo. Uma corrida fora do celeiro e da mata, agora feita no meio das ruas em frente à fazenda. A estrada se estendendo ditante de todos eles.

          Os lobos vinham em um exército. O mais alto estava quase mordendo o animal. A menininha estava no meio de sua mãe e seu irmão, segurando-se firme nos dois para não cair. Gritava até arder a garganta. Olhando para aqueles monstros se aproximando num ranger ardente.

          O lobo deu salto e mordeu as pontas do cabelo da mulher. Ela sentiu puxarem-na para trás, e o temor da morte lhe tomou conta. A menina sua filha segurou-a na camisa e só por isso não caiu; força, pois, havia nos braços de uma criança amorosa. A benção da família fora justamente o que tornava os lobos tão perigosos: a morbidez de suas presas; os dentes daqueles animais eram tão afiados que, ao morderem suas mechas, cortaram o cabelo da mulher na mesma mordida antes que conseguissem puxá-la para trás.

         Mas o lobo continuava perto. Ele não descansaria. Preparava-se para um nova mordia, dessa vez uma que desse certo.

          A menina, porventura, percebendo-o, pensou rápido; na imaginação que não morava mais aos adultos de sua família, em sua mente fértil ainda infantil provocou-a a solução do momento. Sua calça era sustentada por um cinto, no que ela o pegou, virou-se um pouco para trás, e começou a bater no focinho dos lobos mais próximos com a fivela de metal que havia na ponta.

As Viagens de Um Vagante PerdidoOnde histórias criam vida. Descubra agora