Capítulo 7

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           Por mais daquela conversa eles desejavam, e por horas tantas passaram nela. Mas o tempo era findo, e não seria para sempre que poderiam se absorver por ela.

          Uma garrafa e meia de rum depois, Jonathan se ergueu em slato como quem penasse já há um bom tempo, e disse, de repente para seu companheiro:

          — Deseja por mais alguma coisa, Tresham? Pode pedir o que bem quiser, está por minha conta. Eu vou ter que soltar uma água do joelho por enquanto, mas quando o servente voltar, peça para que te preparem o especial da casa. Você vai adorar. Falo a verdade, não duvide, você ficará tão agradecido que deseja me pedir em casamento. — E riu-se da própria piada, como se ouvisse a mais caótica glossa da vida; talvez parte da culpa dos runs.

           Então se ergueu e partiu para os fundos.

           As latrinas, era óbvio, costumavam ficar distantes das alas mais movimentadas devido ao seu mau cheiro. Não em vão que muitos dos bêbados das festas costumassem se esvaziar nas alas próximas aos rios, ou nas sombras dos becos, quando pensassem que ninguém os via. Um fato que fez do Mundo das Cores Dançantes quase falir por um tempo, visto o alto número de seres que se incomodaram com o cheiro alarmante de urina que vinha com o vento e pelas janelas, e, por isso, resolviam vagar para outros salões. Levou tempo até que compreendessem soluções verdadeiramente úteis. A priori, resolveram apenas pedir que não o fizessem; o que não se mostrou útil, já que bêbados costumavam ter bocas abertas, mas ouvidos lacrados para críticas. Depois resolveram transformar a proibição em um decreto, mas novamente não se fez útil, afinal, bêbados são bêbados justamente por nada se importarem. Depois fizeram as latrinas ficarem mais próximas, o que logo tiveram de retificar, já que as latrinas tinham mau odor. Assim, em última instância, por intermédio de um dos próprios serventes do salão, tomaram a melhor das decisões, tão óbvia que fez os senhores do Mundo das Cores Dançantes se questionar a razão de não terem pensando algo semelhante anteriormente; eles, nada mais e nada menos, contrataram ogros para analisarem os becos do salão, de maneira que, sempre que encontrassem bebuns se esvaziando pelas beiradas, tivessem a vital função de repreendê-los e levá-los para longe das festas.

           Não à toa, Jonathan precisou caminhar um tanto até chegar perto de uma... E mais ainda quando decidiu partir para longe dela. Uma música alegre ele começou a assoviar, saltitando para os lados, conforme ia embora; porque, afinal, não era de alívio que seu corpo procurava, apenas de uma diversão momentânea. Seu bolso já havia se esvaziado um bocado naquela única noite, e não era do seu desejo esvaziá-lo ainda mais; Tresham parecia ser um homem de posses, e tinha certeza de que ele não sofreria caso tivesse que pagar algumas honras de prata para o salão. Ele teria agradecido o guerreiro por todo o banquete gratuito caso não temesse ser esmagado pelos seus punhos.

          E ele se espreguiçava pelo caminho, os braços estralando os ossos, os pés pulando de um lado para o outro no ritmo da melodia assobiada. Ele era um homem vivaz, talvez por conta da juventude, ou talvez por uma certa falta de escrúpulo em seu coração. Seus pés caminhavam velozes, de qualquer modo, e já passava não somente do caminho das latrinas, como do próprio salão. Já havia atravessado ruas e entrado em novos becos escuros, contente da vida, quando, em súbito, virando-se para uma nova direção, deparou-se com uma figura alta e robusta à sua frente.

            — Achou mesmo que daria certo? — Tresham o disse. E sua voz era rugido. — Eu percebi que você não pagaria a conta depois que começou a pedir garrafas caras antes mesmo de terminar a primeira.

           Jonathan não sabia o que dizer. Em seu rosto havia medo, pela primeira vez no dia sentindo um verdadeiro temor do guerreiro.

          — Q-Que susto! — ele disse. — E-eu estava indo urinar no lago.

As Viagens de Um Vagante PerdidoOnde histórias criam vida. Descubra agora