Um: Os Três Estágios do Amor

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Tudo começou no dia em que minha mãe foi contratada para trabalhar como doméstica em uma mansão bem renomada e conhecida da cidade onde morávamos. Mamãe conseguiu um quarto para morar também, um ano depois ela engravidou de mim. Com medo de ser mandada embora, ela ocultou a informação durante os primeiros meses, até que chegou um momento em que ela simplesmente não conseguiu mais. Minha mãe contou que ela foi até o escritório de Owen explicar o que acontecerá, porém ele só deixaria ela continuar trabalhando na casa, caso a sua esposa permitisse. Adele Winters.

"— Vocês podem ficar, não pense que vou dar mais um cômodo dessa casa, se quiser continuar trabalhando aqui será nessas condições. Também não quero ver essa criança perambulando dentro da mansão." — E essas foram as suas palavras.

Lembro-me de crescer ouvindo relatos horríveis sobre Adele Winters, que ela era uma pessoa de gênio forte e muito arrogante. Minha mãe dizia que ela odiava crianças, que era mimada, entre outras coisas. Vendo-a dessa forma como fui ensinada, tentava evitar ao máximo o nosso contato. Porém as coisas foram mudando aos poucos. Com oito anos de idade eu me via cansada de ficar trancada dentro de um cômodo. Esperava a bela dama e seu marido sair e depois aproveita a deixa. E sim, apelidei Adele dessa forma porque apesar de tudo, ela era extremamente linda. Às vezes eu sentia fome durante a madrugada e ia correndo para assaltar a geladeira. Até que um dia Adele me pegou no flagra, ela segurou forte o meu pulso e perguntou o que eu estava fazendo.

"— Não estou fazendo nada, senhora!" — Respondi com as pernas bambas.

Adele se agachou na minha frente.

"— Não é o que parece."

"— Por favor, você não pode dizer a minha mãe que me viu aqui."

"— Impossível, acho que sua mãe já avisou sobre as regras dessa casa." — Me encarou de forma séria, segurando mais firmemente o meu braço. Fui arrastada até o quarto onde morava. Adele bateu na porta e minha mãe atendeu apenas de pijama, assustada com a cena ela perguntou o que estava acontecendo. "— Acho que fui clara quando disse que não quero saber dessa pirralha perambulando no meio da minha casa."

"— Sinto muito. Isso não vai mais acontecer." — Respondeu de cabeça baixa.

Me afastei bruscamente do aperto de Adele.

Quando ela se retirou do nosso quarto, minha mãe me bateu. Foi a primeira vez na vida que apanhei dela, pois ela sempre foi muito carinhosa. Talvez o medo de ficarmos sem um lar e um trabalho te assustou. Porém não deixei barato, esperei a minha mãe dormir e fui até a porta do quarto de Adele. Para minha sorte foi ela quem atendeu e não o seu marido.

Adele me encarou sem entender.

"— Sabe, eu costumava te chamar de bela dama, mas hoje me dei conta de que você é uma bruxa. Uma bruxa muito da fofoqueira! Por isso eu te odeio, te odeio!" — Desabafei. Não esperei uma resposta ou reação sua, apenas dei as costas e segui para o quarto. Deitei ao lado da minha mãe e dormi. Me senti ótima, para uma criança de oito anos talvez eu fosse um pouco atrevida, porém já estava cansada de viver como uma prisioneira nessa mansão e para piorar a minha mãe não mexia um músculo para mudar a nossa situação.

No outro dia acordei com um medo enorme da minha mãe ser mandada embora. Madruguei, era em torno das 6:00 horas da manhã. Levantei e fui até o jardim enorme da mansão, colhi algumas flores e fui até a porta de Adele. Dei três batidinhas, estava tão tímida e assustada. Torci para que fosse ela quem atendesse a porta e não o seu marido, e foi dito e feito.

Adele me encarou novamente sem entender nada. Estendi para ela o buquê simples que havia feito.

"— Me desculpa, dona Adele, não queria ter te ofendido. Na verdade queria sim, mas tô muitooo arrependida." — Abaixei a cabeça sem conseguir encarar os seus olhos. "— Essas flores são pra você. Pode por favor aceitar?"

Senti ela retirar o buquê com cuidado da minha mão e depois disso sai correndo em disparada. Meu coração batia desesperadamente, não sabia se aquilo seria o suficiente. Porém no outro dia Adele chamou minha mãe para conversar, no quarto comecei a chorar imaginando a gente tendo que ir embora da mansão. Peguei um lençol e recolhi as minhas roupas, se alguém precisasse ir embora daqui, esse alguém era eu. Abri a porta com certa dificuldade enquanto segurava as minhas coisas.

"— Emy, o quê está fazendo?" — Minha mãe perguntou.

Emy era um apelido para Amélia.

Olhei na sua direção e me deparei com Adele ao seu lado. Engoli em seco. Simplesmente não sabia o que dizer, então minha mãe ignorou e começou a contar as boas novas.

"— Querida, a senhora Adele me deu uma ótima notícia e queria que você agradecesse a gentileza."

"— O quê é, mamãe?"

"— Decidi deixar você ter mais liberdade aqui. Enquanto Owen e eu estivermos fora, você poderá brincar no jardim e no restante da mansão, porém não quero vestígios da sua pessoa no meu quarto. Se souber que entrou no meu quarto eu juro que retiro a sua regalia."

"— Adele também contou que vai pagar a sua matrícula no colégio que tem aqui por perto."

Arregalei os olhos.

Meu maior sonho era frequentar uma escola. Soltei as roupas e corri na direção de Adele para agradecê-la, porém ela me afastou. Me encarou ainda de forma séria e pediu para que eu jurasse que não quebraria as regras. Concordei. Estendi o dedo mindinho para finalizar o nosso juramento, mas ela ignorou.

Passei a estudar e brincar pela mansão como uma criança normal.

Quando atingi meus quinze anos, minha mãe acabou falecendo devido a uma doença. Ela já sabia do seu estado e por isso tentou garantir um lugar para que eu vivesse. Me senti sozinha como nunca havia sentido antes. Não me dava bem com meus colegas na escola, Owen passou a trair Adele com frequência e não fazia o menor esforço para esconder. A Bela Dama de repente se tornou ainda mais amarga, eu sentia a sua solidão e ela de certa forma a minha. Tentei me aproximar, mas ela nunca permitiu. Agradeci aos céus por conseguir um emprego em sua mansão, teria abrigo e trabalho, fiquei no lugar da minha mãe.

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