Estávamos no Central Park, em uma área isolada com árvores grandes e uma pequena fonte de pedra que estava seca.
— Então, é aqui?
Jessamine assentiu.
— Onde?
— Não tem um "onde" — Jessamine disse com aquela voz de professora irritada — Aqui o véu está enfraquecido, mas não é como um portal. É apenas um ponto.
— Uau, eu adoro como você sempre responde às minhas dúvidas — murmurei, olhando a fonte — O que você acha que está acontecendo aqui? Eles estão sendo sugados para o Outro Lado? Isso é, ao menos, possível?
— Eu não sei exatamente o que aconteceria... Estamos falando de matéria e o Outro Lado não possui matéria. Ele não é como esse mundo. Ele apenas está — Jessamine disse. Ela andava de um lado para outro, inquieta. Era a mesma coisa que eu fazia quando estava divagando sobre algum caso até Rhodes se irritar e me mandar "aquietar a bunda".
— Você acha que eles estão mortos? — perguntei, engolindo em seco.
Jessamine parou de andar e me encarou. A forma como seus olhos pareciam penetrar minha alma era quase anormal. Eu não sabia dizer se era porque ela era um fantasma ou se esse era mesmo seu olhar.
— É impossível-
— Mas muitas coisas impossíveis estão acontecendo ultimamente — declarei por fim — Por mais de vinte anos, almas apenas iam para o Outro Lado. Nada muito complicado até aí. Então você apareceu.
— Oh, uau, Russell! Você acha que isso é culpa minha? — Jessamine aumentou o tom de voz — Para um detetive, você é a pessoa mais estúpida que já conheci.
— Não, como detetive, eu sei que uma coincidência quase nunca é apenas uma coincidência — rebati, irritado — Você possuía a Visão, você tem a capacidade de fazer mais coisas que fantasmas comuns e ainda essa manhã estávamos falando sobre me transportar para o Outro Lado.
— Se você realmente acha que eu sou a culpada por trás disso, você enlouqueceu, Montague! Eu já não provei o suficiente!?
— Não, não provou — balancei a cabeça — Tirando seu nome e alguns livros empoeirados, eu não sei absolutamente nada sobre você. E, bem, me desculpe por desconfiar de algo que nem mesmo responde às leis naturais conhecidas — falei.
Pelo canto do olho, vi um senhor passar e me encarar assustado. Eu sabia que devia parecer um louco gritando com uma fonte, mas não dava a mínima. Todas essas perguntas e a falta de respostas estavam começando a mexer com minha cabeça.
Jessamine não respondeu. Ela me encarou e permaneceu parada ao lado do lago como uma estátua. Eu respirei fundo. Talvez ela não tivesse nada a ver com isso. Ela teve a chance de acabar comigo naquele beco quando os outros fantasmas atacaram, mas ela escolheu me ajudar.
— Olhe, você não faz parte da natureza. Você é incomum.
— Eu já entendi essa parte.
— Deixe-me continuar — eu me aproximei dela — Você é incomum para o Outro Lado, porque não age como um fantasma deveria agir. Eu sou incomum para esse mundo, porque eu vejo coisas que os outros não veem. Se há algo no Outro Lado que está rompendo leis comuns dos dois lados...
Jessamine me olhou.
— Você acha que um Guia está fazendo isso?
— Não seria idiotice pensar algo assim... Você mesma disse que apenas o Guia é capaz de se locomover nos dois lados do Véu. A questão é se esse Guia é alguém como eu ou como você.

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O Guia dos Mortos
FantastikUm fantasma de outro século e um detetive que não confia em ninguém estão prestes a entrar em uma missão arriscada e se envolver em uma relação impossível. Fantasmas existem. Russell T. Montague é capaz de ver fantasmas desde o acidente que matou t...