CAP. II

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No dia seguinte meu pai abordou-me com o mesmo assunto.

- Para proteger a Bia eu aceito.   Só me prometa que não vai fazer o mesmo com ela.  Não vai vendê-la.

- Que é isso?  Eu não estou a vender-te.

- Isso é o quê?  Troca de favores?  Quando eu preciso ir?

- Vamos fazer o casamento certinho.
Depois de amanhã eu vou lá acertar com ele.  Tu só sairás daqui casada para não dar falatório a toda a aldeia.

Fui concordando com tudo.  Eu precisava de saber os passos dele para dar os meus.

Fiquei na dúvida se contava à minha mãe, pois tinha medo dela ir contar tudo a ele.

Optei por pedir ao Tomé para ele contar depois que nós fossemos embora.  Eu sabia que num acto de raiva a minha mãe ia ser agredida logo que meu pai soubesse da fuga.

Era apenas mais uma sova e eu não podia fazer grande coisa.

No dia combinado meu pai saiu cedo para ir à fazenda Santarém negociar a filha.

Arranjei uma trouxa com algumas peças de roupa minhas e da Bia e cobertas por Tomé a quem demos um abraço apertado saímos de casa.

Numa rua de pouco movimento parou uma camioneta.  Era o senhor Zacarias, vendedor ambulante.  Subimos na camionete e ficámos escondidas pelas várias caixas de frutas.

Logo ouvimos o trabalhar da camionete que seguia caminho até à próxima aldeia.

Conseguimos ficar escondidas até passarmos umas 5 aldeias.

A camionete parou numa estrada deserta ladeada por um enorme milharal.   Seu Zacarias saiu para satisfazer uma necessidade e eu achei por bem que deveríamos descer ali também.

Descemos do lado contrário do homem e entrámos milharal a dentro.  Não tínhamos fome, pois tínhamos comido algumas frutas e roubado outras para nos prevenirmos.

Caminhámos pelo milho sem encontrar ninguém.  Bia já demonstrava cansaço quando surgiu à nossa frente um pequeno carreiro.

Parámos um pouco para descansar.  Estávamos com sede pois a nossa àgua tinha acabado.

Continuámos a seguir o carreiro que não tinha fim.  Achámos estranho não avistar nenhum trabalhador mas continuámos.  Ao fim de uma ou duas horas, a verdade é que não tinha noção,  avistámos um casarão enorme.

O meu coração bateu descompassadamente por não saber o que ia encontrar.

Eu tinha medo de ser apanhada e devolvida ao meu pai.  Por certo, o castigo seria grande.

Quando nos aproximámos da casa grande reparei numa senhora de meia idade com uma criança que não teria mais que 1 ano.  Ela reparou em nós e foi logo agarrando a criança.

Levantei os braços e falei para ela não se assustar.  Só precisava falar.  Então ela mandou a gente chegar mais perto.  Na outra esquina da casa vinha vindo um homem na nossa direcção.

- Boa tarde senhora.  Desculpe invadir as suas terras.  O meu nome é Juliette e esta é a minha irmã Beatriz.

- O que vocês fazem por aqui sózinhas?  - A esta altura o homem já estava ao pé de nós.

- Nós somos da aldeia Nova.  Eu Fugi com a minha irmã porque o meu pai me vendeu ao dono da fazenda Santarém.

- O Amadeu?  Perguntou o homem.

- Sim.  E se eu não aceitasse ele mandava a minha irmã. Por favor, deixem a gente ficar.  Eu trabalho no que for preciso.

A princípio ficaram desconfiados, mas aceitaram ouvir toda a história das duas irmãs.

Lúcia e José eram os proprietários daquelas terras.  Viviam ali desde sempre com alguns trabalhadores.  Agora tinham o seu netinho para cuidar pois o seu filho trabalhava na cidade e a esposa dele havia falecido no parto. 
Desde então,  a criança vivia cuidada pelos avós, recebendo a visita do pai aos fins de semana.

Espinhos no caminhoOnde histórias criam vida. Descubra agora