CAP. XX

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Chegámos à clínica.   Rodolffo estava com um paciente e então tivemos que esperar um pouco.

Eu suava das mãos e Bia não parava quieta.

Rodolffo pediu à enfermeira que levasse a minha mãe para uma sala sózinha.   Tomé foi com ela pois minha mãe já estava acostumada a vê-lo.

Quando se livrou do paciente, Rodolffo veio buscar-nos e deu-me um beijo e também à Bia.

- Tentem não chorar ao pé dela.  Deixem ela entender que vocês estão bem.

Pararam em frente à porta e ouviram Tomé a conversar com ela.

- Está bem, mãe?

- Estou filho.  Estou bem.

- Tenho uma surpresa para si.

- O quê?  Hoje sonhei com as manas.

- E como elas estavam?

- Elas correram para mim e depois eu acordei.

- Feche os olhos.  Vou trazer a surpresa.

Tomé chamou-as depois dela fechar os olhos.  Colocou as duas sentadas de frente dela.

- Pode abrir os olhos.  Veja.

Maria da Luz abriu os olhos e instintivamente esfregou-os com as mãos.   Abriu novamente quando as duas a abraçaram e depois começou a chorar copiosamente.

Juliette olhou para Rodolffo e ele disse para a deixar chorar o quanto quisesse.

- Estamos bem, mãe.  Voltámos para ti.

Ela chorava, fazia festinhas na cara ora da Juliette ora da Bia, mas não dizia nada.

Aos poucos foi parando o choro.  Eu sonhei, eu sonhei.

- Foi real o seu sonho, mãe.  Nós estamos aqui.

- Ele não vos fez mal, eu não deixei ele fazer-vos mal. 
Estava a referir-se ao pai que a ameaçava sempre com elas.

- Não,  mãe.   Ninguém nos fez mal.

- Juliette,  perdoa a mãe.  Eu fui fraca.

- Não foste nada.  Tu foste uma guerreira.  Nós amamos-te muito.

Ele deu um beijo em cada filha e chamou Tomé beijando-o também.

Rodolffo e a terapeuta estavam satisfeitos com o que viam.

- Estamos no caminho certo, doutor.

- Acredito que sim.  Vamos deixá-los um pouco a sós.

- Juliette,  se precisarem, estou no meu gabinete.

- Obrigada.

Passadas as primeiras emoções os três tentavam interagir com a mãe no ritmo dela.  Ela não falava assim tanto.  Tocava no rosto das duas, temendo que não fosse real.

- Juliette, tu já estás crescida.  O banco.  A conta.  É tua.  Eu fiz isso sem ele saber.

- O quê mãe?  Não entendo.

- O banco.  É teu.

- Está bem, mãe.   Depois vemos isso.
Tomé, eu acho que ela está cansada.

Tomé foi chamar a terapeuta que trouxe remédio para ela dormir um pouco.

- Ela agora vai dormir.   Despeçam-se dela.

- Mãe, voltamos amanhã,  está bem.

- Sim.  Amanhã.

Deram um beijo nela e saíram.  Já fora da sala Juliette não aguentou o choro.

Tomé abraçou-as e levou-as até Rodolffo.

Rodolffo abraçou Juliette.  Tomé levou Bia até à rua e deixou-os sózinhos.

- Não te deixes abater.  Ela hoje foi uma surpresa para nós.  Nunca havia falado tanto.

- Rodolffo,  ela falou no banco, que é meu porque já estou crescida, não entendi nada.

- Banco?  Será banco, edifício?  Ju, será que ela quis dizer que tem dinheiro no banco?

- Não,  acho que não.   O meu pai torrou tudo.

- Será?  Sabes o nome do banco da tua aldeia?

- Sei.  É o mesmo daquele ali em frente.

- Agora já fechou, mas amanhã vou lá contigo.  Quem sabe a tua mãe tenha uma surpresa para ti.

- É pouco provável, mas...

- Olha!  Vou ver a minha agenda de amanhã e depois.  Quero passar um tempo contigo.  Vou marcar um restaurante para jantarmos amanhã.   Só nós dois, pode ser?

- Sim.

- Agora põe um sorriso lindo, daqueles que eu gosto e dá-me um beijo gostoso.

Juliette não se fez rogada e beijou-o. Entretanto ouviram batidas na porta.

- Entre disse Rodolffo sem se separar de Juliette.

Desculpe doutor.  Julgava que estava sózinho.

Era a enfermeira que vinha comunicar que a doente já estava a descansar e medicada.

- Obrigado.  Amélia, tente remarcar as minhas consultas de amanhã e depois.  Avise-se se não conseguir remarcar alguma.

- Sim, Doutor.  Vou começar agora.

Amélia saiu.  Juliette não comentou nada mas não foi com a cara dela.

Espinhos no caminhoOnde histórias criam vida. Descubra agora