CAP. IV

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Lúcia contou tudo a Rodolffo.   Como elas chegaram ali e como eles já gostavam delas.

- Pobres moças.  Como pode haver pais tão irresponsáveis?

- Ainda bem que tu entendes.  Estava preocupada por causa do Mateus, mas ele adora a Bia e ela trata muito bem dele.

- Era para essa menina estar na escola.

- Pois era, filho.  Vem, vamos almoçar.  Já ouço a voz do pai.

Lúcia e Rodolffo regressaram à cozinha onde José já beliscava o almoço.

- Nem esperas chegar à mesa?  Nós aqui à tua espera e tu agora a quereres comer primeiro.

- Desculpem, mas este assado está com óptimo aspecto.

- Espera para veres a sobremesa.   Receita da Juliette.

Os homens foram para mesa.  Beatriz lavou as mãos e levou o pão e o jarro de suco.

Juliette retirou o lenço e o avental e foi até ao banheiro escovar os cabelos.

Pegou na travessa do assado e Lúcia a da salada e dirigiram-se para a sala.

- Realmente está com óptimo aspecto , disse Rodolffo para disfarçar a olhada para o cabelão da Juliette.

O almoço decorreu animado.   Todos adoraram a torta de maçã da Juliette

Lúcia questionava o filho sobre a semana.  Rodolffo era médico com consultório próprio na cidade.   Também fazia consultas ao domicílio quando era necessário.

Apesar de ser ainda novo, pois acabara de fazer 28 anos, já tinha uma carteira de doentes bem interessante.  Casara cedo, logo após descobrir a gravidez de Marta, mas teve a infelicidade de a perder no parto.

Foi doloroso, mas habituado a lidar com a morte, logo se recompôs mergulhando no trabalho.

Após o almoço, Lúcia,  José e Mateus foram tirar um cochilo.

Beatriz deitou-se na rede exterior enquanto Juliette foi arrumar a cozinha.

Ela lavava a loiça enquanto chamava Beatriz para vir secar.

- Vou já,  mana.

- Eu seco, ouviu ela dizer.

- Ao perceber Rodolffo do seu lado ficou um pouco  nervosa.

- Não senhor Rodolffo.  Isso é trabalho da Bia.  BIA!

- Fica aí Bia.  Juliette,  trata-me só por Rodolffo.  Faz-me confusão esse senhor.

Com a ajuda dele terminaram rápido.

Rodolffo sentou-se numa das cadeiras no exterior ao lado da rede onde estava Bia.

- Quer vir para a rede, senhor?

- Não Bia.  Não gosto de rede. Não é bom para as minhas costas.

- Eu adoro.

Juliette veio juntar-se a eles e ele convidou-a para se sentar ao lado dele.

Ficaram a prosear por algumas horas até Lúcia descer com Mateus.   Beatriz correu logo para segurar no menino, mas este quis o colo do pai.

-  Vem cá meu dengo.  Vem ao papai.

- Tão pequeno e já reconhece você tão bem, diz Juliette.

- Acho que são os laços que chamam.

- Nem todos os laços são assim, disse Juliette com uma certa tristeza.

Rodolffo percebeu pelo semblante dela que ela lembrou da sua família.

- Não pretendes voltar para ver os teus pais?

- Não.   Tenho pena do meu irmão.   Queria-o comigo, mas ele optou por ficar e a minha mãe nunca vai deixar o meu pai.

- Quem sabe um dia possas ir vê-los sem medo.

- É pouco provável.  Tenho a certeza que o meu pai se vingaria pelo facto de não ter recebido o dinheiro do Amadeu.

- E a escola da Beatriz?  Ela abandonou cedo.

- Todos fomos obrigados a abandonar quando o meu pai faliu.

O Tomé chorou muito.  O sonho dele era ser piloto aviador.
A Beatriz tinha acabado o ensino básico, ainda não tinha noção do que escolher.

- E tu Juliette?  Qual era o teu sonho?

- Ser educadora infantil.  Adoro crianças.  Mas eu sou feliz agora que consegui livrar-me e à minha irmã.   Espero que um dia ela possa continuar os estudos.

- E tu também.

- Estou bem assim.  Há sonhos que são apenas sonhos.

- Não devemos desistir.  Nunca desistas de sonhos.

Espinhos no caminhoOnde histórias criam vida. Descubra agora