CAP. XXII

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A visita à minha mãe hoje não era tão desejada por mim.

Ainda não consigo entender como ela teve coragem de nos deixar passar necessidades tendo escondido tanto dinheiro de meu pai.

Rodolffo pedia para eu me pôr no lugar dela, mas eu não conseguia.  Saber que por causa dela e dele também nós três vivemos anos de estagnação.

Decidi que enquanto ela não estiver bem, não vou confrontá-la com este assunto.  Não quero ser causadora se uma regressão, agora que ela começa a recuperar-se.

Como ontem,  ela estava muito emotiva.  Fazia questão de estar sempre a tocar na nossa cara.

- Como está, mãe?

- Bem.  Agora tenho vocês.

Ela voltou a falar sobre o banco e Juliette sossegou-a dizendo que estava tudo resolvido.  Ela sorriu e juntou as mãos em oração.

Tomé olhou para mim sem entender nada.

- Falamos logo em casa.

A terapeuta disse-nos que a minha mãe não se lembra como morreu o marido.  Parece que aquele dia ela excluiu da memória.   Quando ela questionou o Tomé ele disse que o pai estava bêbado, caiu e bateu a cabeça.  Depois desse dia ela nunca mais falou directamente dele.

Voltei para casa um pouco mais animada por saber que a recuperação dela estava indo bem.

Hoje não queria que mais nada me  stressasse.   Ia jantar com meu amor e ele tinha-me prometido uma surpresa.

Tomé voltou da clínica primeiro que Rodolffo.   Chamei a Bia e sentei na frente dos dois.

Tomé,  lembras-te que ontem a mãe falou no banco e é teu Juliette assim numa conversa aleatória?  E hoje quando eu disse que estava resolvido ela agradeceu a Deus?

- Sim.  Não entendi nada.

- Então,  hoje eu e Rodolffo fomos ao banco na frente da clínica que é o mesmo que havia na aldeia nova.

Procurei por dinheiro no nome da mãe e do pai e não havia nada.  Depois procurei no meu nome e vocês não vão acreditar.

- O quê,  mana?

- Tem um montão de dinheiro no meu nome.

- Um montão como? Quanto?

Juliette mostrou o extrato do banco.

Bia pouco entendia daqueles números, mas Tomé assim que viu o valor, cerrou os dentes e os punhos.

- Calma mano.  Eu também reagi assim.  Foi a mãe que fez esta operação.  Eu acredito que foi a maneira de impedir o pai de gastar tudo.  Todos éramos menores.  Eu creio que ela pôs no meu nome por ser a mais velha e ter acesso mais cedo.

- Havia necessidade de sofrer tanto, Ju? O que eu me esforcei para manter a casa.  Porque ela nunca falou nada?

- Não adianta agora especular.  Só quando ela estiver boa pode dar as explicações que nós queremos.  Agora vamos resolver os três como vamos fazer com o dinheiro.

- Eu posso estudar sem me preocupar com o dinheiro?  Ah mãezinha,  só por isso eu acho que já te perdoei.

Olhem a minha ideia.  Dividimos a quantia por quatro.  Na vossa conta só podem movimentar quando forem maiores, mas não vai ser por isso que vos vai faltar dinheiro.

- A quarta parte é de quem? Perguntou Tomé.

- Da mãe. Dessa conta sairá o dinheiro para os vossos estudos e despesas de casa, quando a mãe vier morar convosco.

- Tu não vais morar connosco?

- Por enquanto ainda vou ficar na Lúcia.  Não posso abandoná-la assim de repente.

- E o Rodolffo?

- Ele vai lá no final de semana.

- Não sei se ele vai nessa conversa.

- Por enquanto é assim que eu quero.  A Bia fica comigo até começar a escola.  Depois de alugar o apartamento, vemos uma pessoa para vos ajudar diáriamente.

- Ai que chic.  Eu vou ter uma empregada,  disse a Bia contente.

- Não senhor, dona Bia.  Não vais ter empregada.  Vais ter alguém que vos ajude a organizar a casa e a cuidar da mãe.  Eu quero que vocês dois continuem a ser os meninos que são hoje.  Sem frescuras.  Cada um sabe as tarefas que tem que fazer e nada de deixar para o outro. 

- Tudo bem, mana.  Falei por falar.

Hoje não tem jantar.  Eu vou sair com o Rodolffo e vocês dois podem ir jantar no shopping.   E um cineminha se quiserem.  Nada de voltar tarde para casa e juízo.

- Sim, mamãe,  respondeu o Tomé.
A mamãe também se comporte hoje, mas eu duvido muito.

- Vou tomar um banho e ficar cheirosa.

Rodolffo entrou no preciso momento em que ela saiu para o quarto.

- Oi, crianças.  Está tudo Ok?

- Cadê as crianças?  Não tem crianças aqui.

- Tá.  Oi, juventude.  Cadê a Ju?

- Disse que ia ficar cheirosa, respondeu a Bia.

Rodolffo e Tomé caíram na gargalhada.

- Ela já falou com vocês?

- Sim.

- E está tudo bem?

- Vai estar quando tivermos todas as respostas.

- Lembrem-se apenas que a vossa mãe só vos quis proteger.  Agora não importa o método que usou.

Oh, vou contar um segredo.  Hoje eu e a Ju não vamos voltar.  Vamos ficar num lugar lindo que eu reservei.  É segredo, tá?  É só para vocês não ficarem preocupados.

- Ah pronto!  Qual comportar-se qual quê.  Tem é mesmo que se descomportar.

- Não entendi, Tomé.

- Sou só eu a viajar na maionese.
Se tu magoares a minha mana, vais ajustar contas comigo.

- Podes ficar sossegado.   Gosto demais dela para isso acontecer.

Espinhos no caminhoOnde histórias criam vida. Descubra agora