Prólogo, parte VI - Correntes

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Reynard olhou para o espelho velho, meio nublado, meio rachado pendurado na parede mofada de sua casa. 

A imagem que olhava de volta para ele era surpreendentemente mais alta e mais madura do que ele esperava. Especialmente considerando suas elegantes vestes em azul, branco e prata - as cores de Korl - e sua espada, embainhada à cintura. 

Em tão pouco tempo, ele havia crescido tanto. 

Há quanto tempo ele costumava ir a Darza no inverno sentado nos ombros de Sir Erwald, comendo sorvetes e brincando com a neve? Dez anos? 

E também parecia que apenas um dia havia se passado desde que ele se tornara um escudeiro e pudera ter acesso às aulas e aos treinos no castelo. Mas na verdade cinco anos haviam se passado. 

E agora o menino que olhava para ele de volta já não parecia tão menino. 

Ele já estava quase tão alto quanto o próprio Erwald, ainda que bem menos musculoso. A barba já começava a crescer em alguns pontos do rosto, mas não de maneira uniforme, o que era um tanto embaraçoso. Em razão disso, já havia começado uma rotina para se barbear regularmente. 

Os traços delicados de infância já estavam sendo substituídos, visivelmente, por uma mandíbula forte e bem desenhada e por um pescoço com um pomo-de-adão saliente. 

Sorriu levemente e pensou que não estava tão ruim. Parecia realmente um homem, um soldado. Assim, uniformizado, provavelmente faria boa figura na cerimônia de indução. 

Corou ao pensar que ela estaria lá para vê-lo assim. 

Mas logo tentou tirar o pensamento da mente. Não faria bem ficar pensando nela. 

No fim das contas, ele mal a conhecia. Ele só passara uma manhã ao seu lado. 

E ela estava indo embora em poucas horas e eles nunca mais se veriam. 

E mesmo que pudessem se ver, a partir da cerimônia de indução, esse contato seria tabu. 

Mas...no fim das contas, ele só estava usando aqueles trajes...por causa dela. 

Reynard fechou os olhos e fez uma prece sincera a Korl. Uma prece simples e curta. 

Ele apenas desejou, do fundo do coração, que Sahha-Mayan pudesse ser feliz. 

E então virou as costas para seu casebre pela última vez para se dirigir ao Grande Salão do Castelo de Galdrachi. 

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- Senhores - disse Erwald no púlpito, sua voz como um trovão...e então complementou, virando-se para as figuras de pé do lado esquerdo do palco. - E senhoras. Hoje é um dia especial. Hoje recebemos em nosso meio um novo grupo de soldados. Por aquela porta, entraram garotos. Mas hoje eles sairão como homens. Homens que levarão a justiça e a paz para todos os domínios de Ennaria, em todos os territorios abençoados pelos Nove. Onde houver uma igreja, sempre haverá um de nós. E sempre que em algum lugar tombar um de nós, aqui nesta sala, ele renascerá nos olhos e braços de uma nova geração.

Erwald deu um leve sorriso e continuou: 

- Meu desejo é o de que cada um de vocês encontre ao servir o mesmo propósito que um dia eu encontrei. Aproximem-se, aprendizes!

Diante de Erwald, no nível do chão, estava uma formação militar perfeita com 63 rapazes entre 14 e 17 anos, organizados em três grupos, cada um com 21 soldados organizados em três filas de sete, todos em posição de sentido. Todos os soldados deram três passos à frente e então pararam, aguardando instruções. 

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