Nove

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JIMIN 

Estou no meio do treino na academia do hotel na Antuérpia quando minha mãe me liga.

Curiosamente, eu meio que já estava esperando a ligação.

Treinar, ensaiar ou trabalhar em qualquer melhoria para mim mesmo sempre foi quase um feitiço de invocação para ela.

Ela se materializava das sombras, independente do que eu estivesse fazendo, com suas famosas críticas construtivas.

Infinitas e implacáveis críticas construtivas.

Você não está enunciando, não consigo entender nada, só parece um “muh muh meh meh muh”.

Não sei como você acha que vai acertar esse movimento quando não consegue nem bater palma no ritmo. Para que essa pressa toda se ainda não aprendeu nem o básico?

Cadê a emoção? Parece que você está esperando a tinta da parede secar. Não importa se não tem ninguém assistindo agora. Você precisa ensaiar do mesmo jeito que pretende se apresentar.

Ela diz que não sei receber críticas, mas sei sim.

Aceito de coração tudo que a nossa equipe diz, e estou sempre ouvindo elogios sussurrados nos bastidores sobre como sou bom em aplicar o que foi dito.

Como ninguém nunca precisa me dizer a mesma coisa duas vezes.

Mas é claro que não precisam!

Aprendi desde cedo que receber a mesma orientação duas vezes tem consequências, e essa é uma lição que nunca vou esquecer.

O problema da minha mãe, no entanto, é que ela não julga o resultado final, ela julga o processo.

Parece que não acredita em “aprendizado”.

Por exemplo, o processo de ampliar o alcance vocal – como eu estava fazendo esta manhã antes de descer até aqui para suar um pouco – tem que ser gradual, expandindo a voz para fora da zona de conforto.

Só estou seguindo as orientações da minha instrutora vocal e ela mesma sempre me garantiu que fazer bem é uma questão de errar e acertar, com notas arranhadas, tons desafinados e um monte de outros sons constrangedores, até a gente aprender a fazer certo sempre e sem esforço.

Mas, durante a infância, fui muito humilhado por esse processo.

Minha mãe ficava perguntando como minha voz podia ser tão ruim se ela pagava tão caro pelo melhor ensino.

Por que é que eu não ouvia os professores?

Como é que eu não conseguia fazer direito?

Então, aprendi a só praticar minha expansão vocal quando meus pais não estavam por perto e ninguém poderia ouvir meus erros.

Isso ajudou.

No começo, pelo menos.

Assim, eu era o único que sabia como minha voz poderia ser horrível.

Mas também significava que a única voz me criticando, se contorcendo a cada falha e me dizendo que eu nunca conseguiria de primeira era a voz que morava dentro da minha cabeça.

A única voz da qual nunca consigo fugir.

Claro que sei que minha mãe não está me ligando do outro lado do oceano só para dizer que eu estava cantando feito uma cabra esfomeada hoje de manhã, mas mesmo assim minhas bochechas começam a arder.

Depois que a gente se acostuma a ser humilhado, as marcas permanecem na pele como uma tatuagem.

Até dá para cobri-las, mas é impossível se livrar da sensação de que não vale nada.

Secrets Among Us - JikookOnde histórias criam vida. Descubra agora