Capítulo 1

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"Os pássaros deixaram suas árvores
A luz cai sobre mim
Posso sentir você deitada lá, completamente sozinha
Chegamos aqui da maneira difícil
Todas aquelas palavras que trocamos
É de se admirar que as coisas quebraram?"

Atlantis - Seafret.

Havia uma coisa interessante sobre a morte: era o fato de que não importa quão morto possa estar, ainda pode vir algo pior do que a morte, viver pós-morte. Não, eu não tinha morrido, mas às vezes era assim que eu me sentia, como um peso morto vivendo ainda, porque tinha uma grande responsabilidade com alguém que precisava de mim mais do que eu mesmo. Então, respirei e sorri para a cliente à minha frente, sentada em uma cadeira. Seus olhos zombeteiros me olhavam com certo divertimento, como se eu fosse a próxima da fila para sua malcriação. Ela pediu e repetiu seus pedidos cinco vezes, alegando que o mel estava muito doce ou que a panqueca estava fria demais. E de novo eu respiro, porque é tudo o que eu posso fazer agora: respirar.

A terapeuta costumava falar algo para mim quando eu sentia que ia desmoronar: "respirar, e respirar, faça isso até conseguir respirar". Às vezes funcionava, mas ali tudo o que eu imaginava era puxar os cabelos loiros da garota irritante e arrogante.
Mas então decidi ouvir a voz da terapeuta no meu subconsciente, armazenada em algum lugar. Saí da sua frente depois de dizer que iria trazer outra panqueca com mel que não estivesse fria e que não fosse tão doce. Se ela não quer doce, não entendi porque pediu. Às vezes era por puro capricho. Eu não a conheço, mas sei o tipinho de pessoa que é, daquelas que se acham mais que qualquer um, como se fossem deuses e nós meros mortais.

No caminho para a cozinha, encontrei Emma, garçonete e minha melhor amiga, com um semblante de poucos amigos. Apostei que um cliente chato também a importunou e eu tinha razão, quando ela se aproximou de mim com as sobrancelhas franzidas e um bico no rosto. A franja castanha caía sobre os seus olhos, alguns fios estavam maiores e picavam as suas pálpebras, fazendo-a afastar e colocar atrás da orelha. O restante do cabelo estava em um coque desajeitado.

- Eu odeio esse trabalho - comentou mal-humorada. Eu ri, mas não era um riso de alegria, era um riso que às vezes saía por nada. Era o tipo de riso que você dava para não deixar tudo menos sem graça. Eu também odiava trabalhar na cafeteira, sentia que seria difícil me adaptar a essa realidade onde os desejos não eram realizados. E por mais que desejasse de todo coração, a vida me dava contratempos difíceis de suportar. Além disso, eram dez horas da manhã e ainda era só o começo do que estava por vir.

[♡]

Enquanto esperava a fila andar na farmácia para pegar o remédio que precisava, já estava imaginando o gerente da cafeteria irritado por ter demorado. Tinha passado mais dos minutos que eu tinha disponível para a pausa. Essa não era a primeira vez do meu atraso e provavelmente não seria a última. A questão era que isso também não podia ser deixado de lado. O remédio era importante, mas não sabia se a atendente iria deixar levá-lo. Eu estava até o topo em dívidas, eram tantas que o meu mísero salário de garçonete mal dava para pagar o aluguel, isso porque ainda dividia o aluguel da casa com a Emma, uma casa que fica em bairro marginalizado, o mais barato que podíamos pagar. A fila andou e a senhora logo me encarou com a testa franzida. Tentei não me encolher com o seu jeito intimidador, eu disse o que queria, a senhora, no entanto, soltou uma bufada franzindo os lábios murchos.

- Não vendemos fiado para você mais, você tem que pagar tudo o que deve.

- Eu prometo que irei pagar semana que vem... - eu disse, abrindo um sorriso que a fizesse mudar de ideia, sua carranca só aumentou.

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