❌Aviso de gatilho❌
A vida de Jessie nunca foi normal.
Aos vinte e um anos Jessie Brodie tenta recomeçar a vida após uma série de traumas sofridos na infância. Ainda está fresca em sua memória a temperatura das mãos de seu tio que marcaram seu corpo...
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Marcelo.
Seu peito subia e descia com dificuldade e eu queria tocar seus ferimentos. Queria que ele abrisse os olhos e me visse em sua frente antes que os policiais cheguem.
E é isso que acontece.
Seus olhos nebulosos ganham foco e ele cospe sangue sem levantar a cabeça do volante. Ele respira com dificuldade, fazendo bastante barulho. Queria correr para longe dele para que sua mão não me toque nunca mais, mas minhas pernas estão paralisadas e pesadas como concreto.
-Pequena Jessie me ouça- Diz tão baixo que preciso me aproximar, pois as sirenes das ambulâncias e das viaturas preenchiam quase todo o espaço do ar.
-Marcelo?- Falo com a voz borrada pelas lágrimas. Não o chamo de tio, pois ele não merece esse titulo desde que colocou suas mãos em mim- Por que fez tudo aquilo?
-Jessie eu não queria- Ele tosse cuspindo mais um bocado de sangue que escorre pelo volante sujando o couro- Eu era jovem e estava conquistando coisas. Meu cargo subia cada vez mais. Eu ganhava cada vez mais poder e isso começou a subir na minha cabeça. O estresse também era muito grande e... Por favor, me perdoa.
-A gente poderia ter sido uma família feliz- Digo entredentes. De repente, a raiva se misturando com o choro. Aperto a porta do carro com mais força e sinto os cacos de vidros adentrarem minha pele- Eu tentei ser invisível por anos Marcelo. Eu tentei ser o mais normal possível, mas você arrancou isso de mim! Como alguém pode ser normal sabendo que foi estuprada aos sete anos de idade e ninguém fez nada a respeito? Como eu poderia ser normal sabendo que meu pai traiu minha mãe por anos e agora vive com a amante em algum lugar por ai? Como eu poderia ser normal ao receber a noticia de que minha mãe foi encontrava boiando em um rio? Como?
-Me perdoe pequena Jessie- Ele também havia começado a chorar. Suas lágrimas se misturavam ao sangue e ao cabelo que se empapava naquela mistura.
Cerro o punho e dou um passo para trás.
-Eu perdoo. Por que diferente de você, eu não sou covarde. Mas não é porque eu te perdoei que não irá arcar com as consequências. Vai ter que se resolver com a justiça agora.
-Jessie! Saia daí!- Grita Leah envolvendo meu braço e me puxando para longe do carro, para longe de Marcelo- É combustível!
Se não fosse por Leah, eu provavelmente ficaria imóvel por horas fitando a figura ensanguentada de Marcelo dentro do carro e tentando entender o que saia de sua boca. Corro aos tropeços tentando acompanhar Leah. Não consigo tirar os olhos do carro conforme nos afastamos. As sirenes estavam mais altas agora e os gritos de Leah se misturavam a elas. Meu coração batia forte e desesperado no peito. Eu sentia suas batidas no meu ouvido abafando qualquer som que vinha de fora.
Tudo parece ficar em câmera lenta quando o fogo surge. Primeiro é pequeno, como uma estrela vista de longe. Mas a cada segundo o brilho cresce até ser grande e forte o suficiente para nos lançar para trás.