Ayla

23 5 2
                                        

Hoje era meu aniversário de 18 anos. Eu passei os últimos 5 escondida entre as paredes do castelo, meus pais tinham medo demais de algo acontecer comigo e na maioria das vezes eu me sentia tão sufocada que só queria desaparecer

— o que você achou do seu presente? — minha mãe questionou depois que abri o embrulho

— é lindo mamãe, obrigada

Ela me deu um colar com pequenas pedrinhas coloridas que brilhavam como estrelas

— seu pai chegará para o jantar, vamos comemorar seu aniversário

— tudo bem

Eu sempre sonhei em ter um baile de aniversário, mas diziam que era arriscado demais ter estranhos entrando no castelo, então eu precisava me contentar somente com a presença da família.

Depois que meu pai me nomeou como sua sucessora tudo virou um caos no reino da terra. As pessoas temiam que ficaríamos fracos por eu não poder gerar herdeiros e havia muitas manifestações pedindo para que meu irmão Ariel assumisse a coroa em meu lugar. Eu passei toda a vida treinando e estudando para assumir o lugar de meu pai, e não era nada justo a revolta só por eu não poder gerar alguém com dons da terra

— feliz aniversário — meu irmão me abraçou

O Ariel cresceu muito. Com 12 anos ele já era quase maior que eu e independente dos conflitos a nossa relação nunca foi abalada. Crescemos juntos, tudo que eu tinha era ele e ele a mim

— obrigado, pirralho

— não sou um pirralho

— é sim

— eu já tenho até barba — murmurou me mostrando o queixo

— não tem nada aí, pare de sonhar

Olhei no relógio e era hora do meu chá da tarde com o miau, então corri no meu quarto para procurá-lo mas não o encontrei em lugar nenhum. Ele era um gato muito velho e mal se movia, então achei muito estranho não o encontrar

— você viu o miau? — perguntei a um dos meus guardas

— não, alteza

Passei o dia todo procurando e por fim comecei a ficar preocupada. Meu pai chegou e veio até meu quarto me ver mas eu estava tão chateada que ele mobilizou todo o castelo para procurá-lo

— majestade — um dos guardas bateu na porta

— sim?

— encontramos o gato, senhor

— graças a Deus — falei — me de ele

O homem abriu e fechou a boca algumas vezes, então olhou para meu pai e tudo ficou muito explícito

— princesa... — o papai disse colocando a mão no meu ombro

— onde que aconteceu?

— nos o encontramos atrás do trono escondido, mas infelizmente ele...

— não... é mentira isso

— princesa — o papai me abraçou

— me diga que é mentira — pedi

Por 14 anos aquele gato foi o meu melhor amigo. Nós éramos inseparáveis. Todos os dias tomávamos chá da tarde, ele dormia na minha cama e me seguia para todo canto.

Não sei quanto tempo fiquei chorando, mas meu pai continuou lá me abraçando todo o tempo que eu precisei. Quando consegui me acalmar ele limpou uma lágrima que descia em meu rosto

— ele era um gato velho, princesa. Você sabia que isso ia acontecer

— mas eu queria ter me despedido — voltei a chorar

O papai mandou fazer uma cripta para o miau, ela era bem luxuosa como ele gostava e nos o enterramos. Por 03 dias eu chorei sem parar.

Após um mês as coisas começaram a voltar ao normal. Agora eu tomava o chá sozinha e ficava algumas horas na janela de meu quarto observando as ruas movimentadas da cidade

— fiquei sabendo que hoje vai ter uma festa lá — meu irmão disse sentando ao meu lado

— lá onde?

— na cidade, é a festa da colheita e todos se reúnem na praça

— parece divertido

— vou viajar para o reino do ar, o papai vai me deixar com o tio Kalel alguns dias para treinar com os exércitos

— você é muito novo para isso

— já disse que não sou novo

— vou sentir sua falta, pirralho

— eu também, mas quando voltar nós vamos tomar chá tá bom?

— tá bom

Após me abraçar ele saiu e eu continuei lá na janela. Deitei para dormir tarde mas a cama ficava muito grande sem o espaçoso do miau e o som de música vindo da festa me deixava curiosa para saber o que estava acontecendo.

Levantei para olhar a janela e consegui ver várias garotas ao redor de uma enorme fogueira dançando. Eu queria muito ser normal e poder estar lá com elas.
Caminhei até a penteadeira e escovei meus longos cabelos castanhos como os do papai e observei meus olhos verdes enquanto criava cenários na cabeça do que faria se estivesse lá. Eu dançaria até meus pés doerem e depois comeria tudo que tivesse de mais gostoso

— a gente ia se divertir muito lá, você não acha miau? — me virei o procurando mas me lembrei que ele havia morrido e uma tristeza imensa me atingiu

Eu passava tanto tempo sozinha que até meu reflexo do espelho se tornou enjoativo. Limpei algumas lágrimas e levantei da cadeira decidida a fazer algo por mim pela primeira vez na vida. Eu iria para aquela festa e seria uma garota normal por uma noite ao menos.

AbominávelOnde histórias criam vida. Descubra agora