Capítulo 6

23.5K 1.9K 542
                                    

9 ANOS ANTES

Eu estava sentado no chão do quarto de minha mãe. Ela estava chorando muito. Obrigava-me a não chorar e ser corajoso por ela, enquanto apertava Spike mais forte. Era meu cachorro de pelúcia, já que não podia ter um de verdade.

— Você é um monstro! — ela gritou com meu pai.

Ele virou-se com um olhar assassino e caminhou em passos largos até onde minha mãe estava. Deu-lhe um soco no rosto, derrubando-a na hora. Apenas ouvi o barulho horrível do corpo inconsciente de minha mãe se chocando contra o chão encarpetado e apertei Spike, meu cachorro de pelúcia, mais forte. Era com o que me contentava, já que não podia ter um de verdade.

Prendi a respiração e sentia que meu coração pararia de bater a qualquer momento. Levantei correndo, tentando chegar mais perto de minha mãe, jogada no chão sem se mover. Antes que eu pudesse tocá-la, meu pai puxou-me pela camisa e jogou-me do outro lado do quarto.

— Se você chegar perto dela, eu te mato! — gritou.

Minha cabeça doía por causa do impacto com a parede. Queria chorar, mas não lhe daria esse gosto. Ele fedia a bebida e cigarro. Ele caminhou até mim, arrancou a pelúcia de minhas mãos e arrancou a cabeça do mesmo, jogando uma parte para cada lado.

— Está na hora de crescer, garoto.

Assim que saiu de casa, completamente bêbado, corri para a sala, trancando a porta da frente e a dos fundos. Certifiquei-me de que todas as janelas estavam fechadas e corri de volta para o quarto. Chegando lá, só pude sentir desespero, pois minha mãe estava sangrando.

Gritei, e corri na direção do telefone que ficava na mesa de cabeceira, ao lado da cama.

911, qual a sua emergência?

— Socorro, minha mãe está sangrando muito. Ela não está acordando.

Não aguentava mais prender as lágrimas. Em dois segundos estava em prantos.

Sete minutos depois, uma ambulância e uma viatura da polícia estavam na frente da minha casa. Rapidamente me recompus. Eles não me veriam chorando.

— O que aconteceu? — uma médica perguntou horrorizada.

— Meu... — parei de falar. Aquelas palavras ameaçadoras ecoavam em minha cabeça, o que me deixava, ainda mais, desesperado.

— Seu... — ela ajoelhou-se ao meu lado.

— Meu pai bateu nela. — sussurrei.

— Ele bateu em você? — ela era calma. Sentia que podia confiar nela.

Assenti, passando a mão em minha cabeça que ainda doía.

Enquanto ela conversava comigo, outros médicos viam o estado de minha mãe. Só percebi suas presenças quando a levantaram, levando-a para fora. Levantei correndo. Eles não a tirariam de mim. Eu não podia ficar sozinho com meu pai.

— Calma, está tudo bem. — a médica me segurou — Você vai para o hospital junto com ela.

Suspirei aliviado. Ela sorriu para mim, e estendeu sua mão para que eu a segurasse. Fomos para o lado de fora e entramos na ambulância junto com outros dois médicos e minha mãe deitada em uma maca.

— Como ela está? — a médica perguntou baixo, para eu não ouvir.

— Sofreu um aborto.

A médica baixou a cabeça e a sacudiu negativamente.

Eu continuei parado em meu banco. Não sabia o que era aborto, mas pela reação da médica, não podia ser uma coisa boa.

▪️ ▪️ ▪️

O rosto desesperado de minha mãe ao receber a notícia sobre o aborto me deixou sem chão. Mesmo com todo o sofrimento com meu pai, nunca a vi naquele estado. Os médicos saíram do quarto onde estávamos, dizendo que sentiam muito e com as cabeças baixas. Levantei da cadeira onde estava sentado e fui até minha mãe. Ela chorava muito.

Você não pode chorar, Brad. Você já tem dez anos. Você precisa crescer!

— Mãe? — falei quase sem voz.

Ela enxugou o rosto e virou-se para mim, com os olhos e nariz vermelhos.

— Vai ficar tudo bem. — a abracei. Ela voltou a chorar, mas não desesperada como antes.

Dei a volta em sua cama, e deitei ao seu lado. Ela envolveu-me em seus braços e, por um segundo, pareceu que tudo realmente ficaria bem.

▪️ ▪️ ▪️

— Isso é mentira! — meu pai gritava furioso enquanto os policiais o levavam para a viatura, acusando-o de agressão e assassinato.

Assassinato?

Que eu saiba, assassinato é quando uma pessoa mata alguém, e meu pai não havia nos matado.

— Assassinato? — mamãe sussurrou para um policial.

Por que todos ficam falando as coisas em voz baixa? Eu já tenho dez anos, posso ouvir as coisas.

— Parece que o Sr. Hown esfaqueou duas pessoas em um bar na noite em que a senhora e seu filho foram para o hospital.

— Meu Deus! — mamãe levou as duas mãos à boca ao ouvir isso. Ela olhou para mim, certificando-se de que eu não estava ouvindo.

Desviei o olhar da conversa para um carrinho que eu tinha nas mãos, fingindo estar concentrado em minha brincadeira. Acho que foi convincente o bastante.

— Daqui a duas semanas, será aberto o julgamento dele. A senhora precisa comparecer.

— Tudo bem... — assentiu, fechando a porta.

Pela janela pude ver o policial se afastando, junto com seu companheiro. Ambos entraram na viatura que em poucos segundos estava longe de nossa vista.

▪️ ▪️ ▪️

— Declaro o réu...

Todos estávamos em silêncio, ouvindo o veredito do juiz.

— Culpado.

Um enorme alívio tomou conta de mim. Soltei o ar que prendia, sentindo-me livre. Ao mesmo tempo, um enorme nó formou-se em minha garganta. Estava aliviado por ele não poder mais nos fazer mal, mas estava preocupado com o dia em que ele saísse da prisão. Ele poderia vir atrás de nós. Trinta e cinco anos parecia muito pouco para mim.

Meu pai gritava, sentindo-se injustiçado. Tinha vontade de mandá-lo calar a boca e ir embora logo.

— Kate! — ele gritou. Minha mãe congelou, apertando meus ombros, enquanto saíamos dali.

Ela virou-se devagar, olhando para ele com nojo.

— Não me abandone, Kate! Eu te amo! — gritou, tentando demonstrar seu sofrimento.

Olhei-o com ódio e repulsa. Quem ele pensa que é para falar que ama minha mãe?

— Não me abandone!

Ela estremeceu, mas rapidamente se recompôs, olhando para mim.

— Vamos para casa, filho.

Sorri para ela e olhei uma última vez para o rosto chocado de meu pai. Quis que ele sentisse o peso de meu olhar decepcionado com o pai que a vida me deu. Nenhum filho devia passar pelo o que eu estava passando. Apertei Spike, recém costurado, contra meu peito e virei as costas para ele. Passamos pela porta do enorme tribunal, sem olhar para trás. Pude ouvir os gritos dele lá dentro, mas eu não me importava mais.

Eu não tinha mais pai e isso parecia muito bom para mim. 

A Garota dos meus SonhosOnde histórias criam vida. Descubra agora