Capítulo vinte e dois.

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...


  A noite chegou rápida, trazendo consigo um frio sutil que se infiltrava pelas janelas, como se o ar ao redor estivesse carregado de uma expectativa silenciosa. No caminho para o apartamento de Enid, eu podia sentir a inquietação crescendo dentro de mim. Não era o tipo de desconforto que me fazia querer desistir, mas sim uma ansiedade estranha, quase como se eu estivesse prestes a atravessar uma fronteira invisível entre o que eu conhecia e algo novo, algo que ainda não compreendia completamente.

  Ao chegar ao prédio onde Enid morava, fiquei por um momento na entrada, observando as luzes suaves que emanavam das janelas, a sombra das árvores projetada nas paredes, criando um contraste entre luz e escuridão que parecia refletir minha própria hesitação. Enid e seus amigos já estavam se divertindo, imersos naquela atmosfera alegre que parecia tão distante do mundo que eu habitava.

  Eu poderia ter voltado para casa naquele exato momento. Poderia ter dado meia-volta e retornado para o conforto silencioso do meu quarto, onde as sombras eram familiares e previsíveis. Mas, ao invés disso, respirei fundo e entrei. Algo em mim queria testar os limites, ver até onde eu poderia ir sem me perder completamente.

  Ao seguir pelo corredor, cada passo parecia ecoar mais alto do que o anterior, como se eu estivesse caminhando em direção a algo inevitável. Quando finalmente alcancei a porta do apartamento de Enid, parei por um instante, minha mão pairando sobre a maçaneta. Podia ouvir suas vozes mais claramente agora, rindo, conversando, a música de fundo preenchendo o espaço entre as palavras. E então, sem pensar muito, girei a maçaneta e entrei.

  O ambiente era exatamente o que eu imaginava: quente, acolhedor, e cheio de uma energia vibrante que parecia irradiar de cada canto do apartamento. Enid estava no centro de tudo, naturalmente, seu sorriso largo iluminando o ambiente enquanto ela se movia de um lado para o outro, cumprimentando os amigos, verificando os lanches, e se certificando de que todos estavam confortáveis.

  Quando ela me viu, seu rosto se iluminou ainda mais, como se minha presença fosse a peça que faltava naquela noite. Ela atravessou a sala em minha direção, seus olhos brilhando com uma alegria que eu sabia que era por minha causa.

  — Eu sabia que você viria! - Disse ela, sem conter o entusiasmo, antes de me puxar para um rápido abraço.

  Eu me permiti ser abraçada, mantendo meu corpo rígido, mas sem afastá-la, até finalmente retribuir. Havia algo tranquilizador na forma como ela me envolvia, como se aquele simples gesto fosse suficiente para me ancorar naquele ambiente tão diferente do que eu estava acostumada.

  — Estou aqui para garantir que ninguém trapaceie. - Murmurei, minha voz carregada com o tom sério que eu usava para esconder qualquer outra emoção.

  Enid riu suavemente e se afastou, mas não antes de me lançar um olhar que dizia que ela sabia exatamente o que eu estava fazendo.

  — Claro, Wed. Seja o que for que te ajude a dormir à noite. - Enid respondeu, seus olhos travando nos meus por um breve segundo, carregados de uma intenção que era impossível ignorar. O silêncio entre nós foi cortado apenas pelo som abafado do ambiente ao redor, mas tudo parecia distante, irrelevante. Seus olhos desceram lentamente até minha boca, uma pergunta não dita pairando no ar.

  Por um instante, tudo sumiu, o ruído da festa, as risadas distantes. Tudo se apagou, deixando apenas o espaço entre nós.

  — Posso? - A pergunta veio suave.

  Congelei. O reflexo de hesitação era imediato, uma âncora puxando-me de volta à minha natureza reservada. Meus olhos rapidamente vasculharam o ambiente, cientes das pessoas ao redor, da exposição que isso traria.

FLOAT - WenclairOnde histórias criam vida. Descubra agora