Capítulo 26: L. B.

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Esperei que aquele corvo surgisse no meu caminho e me obrigasse a dar meia volta e correr de volta para os meus aposentos. Mas ele não apareceu, assim como minha curiosidade falava cada vez mais alto. Era uma ideia idiota. Mas naqueles dias que fiquei sem vê-lo e pensando no que ele havia dito, não consegui deixar de ficar pensativa sobre o que ele escondia também.

Não demorei muito a encontrar a porta dos aposentos dele. Hesitei antes de entrar, olhando pelo corredor para ter certeza de que estava mesmo sozinha. Se tivesse sorte, Kaden iria demorar muito com os prisioneiros e eu teria tempo de olhar qualquer coisa que chamasse a minha atenção. Toquei na porta, sentindo meus dedos tremerem quando virei a maçaneta e empurrei a madeira pesada.

O quarto de Kaden estava parcialmente escuro. As janelas da varanda estavam abertas, revelando o céu escuro e as nuvens pesadas que indicavam uma tempestade. A lareira também estava acesa, mas quase apagando. Entrei e fechei a porta atrás de mim, umedecendo os lábios com a língua quando senti o medo de ser pega deixando minha barriga gelada.

Prendi a tocha em um suporte e coloquei mais lenha na lareira, antes de finalmente reparar em como o quarto dele era. A cama parecia com a minha, só que maior. As cortinas do dossel estavam presas, revelando a cama bem arrumada, com cobertores negros. Ele parecia gostar mesmo daquela cor. Caminhei até a mesa perto da lareira, observando os papéis e livros empilhados nela. Toquei alguns deles, observando que eram apenas informações do que deveriam ser os outros clãs de vampiros.

Me afastei da mesa, esfregando o rosto gelado enquanto olhava ao redor, procurando por qualquer coisa. Havia um mapa pendurado na parede, marcando alguns pontos que eu não sabia o que eram, mas deveriam ser importantes. A porta do cômodo adjacente estava aberta, revelando a banheira enorme que surgia após alguns degraus no chão.

Corei ao imaginar Kaden dentro dela, se banhando. Tinha sido um pensamento involuntário, que eu fiz questão de afundar na parte esquecida dos meus pensamentos antes de me afastar daquela parte do quarto. O closet foi meu próximo destino. Não encontrei nada ali, além de descobrir que ele era super organizado nas suas roupas e se vestia muito bem, com cores escuras, é óbvio.

—Me conte algum segredo, Kaden. —Sussurrei, deslizando meus dedos pelas camisas dele, antes de deixar o closet e voltar para o quarto. Meus olhos pararam no pequeno móvel ao lado da cama, com duas gavetas.

Olhei para a porta, engolindo em seco antes de caminhar até a cama. Me sentei ali, apertando a mão no meu queixo, enquanto tentava agir com cautela. Com cuidado abri uma das gavetas, sentindo meus dedos tremerem quando observei o livro que surgiu ali. Uma respiração curta escapou pelos meus lábios quando o tirei de dentro da gaveta, reconhecendo a capa desgastada e os detalhes nas folhas amareladas.

—Gostou do que viu até agora? —Kaden questionou, me dando um susto quando percebi que ele estava escorado na porta, com os braços cruzados na frente do peito. Mais uma vez conseguindo ser completamente silencioso.

—Onde você conseguiu isso? —Indaguei, ficando de pé e balançando o livro no alto. Kaden nem mesmo olhou pra ele, se limitando a erguer uma das sobrancelhas com os olhos focados em mim. —Isso me pertence. Esteva no meu quarto no castelo.

—Agora não está mais. —Retrucou, me fazendo comprimir os lábios com força, sentindo uma onda de irritação esquentar meu sangue.

—Você voltou lá. Você mexeu nas minhas coisas! —Acusei, antes de sentir um arrepio de medo atravessar meu corpo quando me dei conta de algo. —Você foi atrás deles? Você prometeu que não faria isso. Nos dois tínhamos um acordo!

Eu me aproximei rápido dele, vendo a surpresa banhar seus olhos quando ele achou que eu fosse batê-lo. Eu poderia, porque estava com tanta raiva e me sentindo até mesmo traída, porque achei que ele ia cumprir o que tinha prometido. Kaden não se abalou, se limitando a abrir um sorrisinho pra mim.

—Eu costumo cumprir com a minha palavra, princesa. Não cheguei perto deles e sequer os vi. Mas precisava fazer uma visitinha ao rei e aproveitei pra descobrir algumas coisas sobre você. —Ele roubou o livro da minha mão, enquanto eu soltava um suspiro aliviado ao saber que ele não tinha os encontrado. —Esse é aquele seu livro de lendas que você estava lendo um dia quando fui vê-la. Onde arrumou ele?

—Não é da sua conta. —Tentei pegar o livro de volta, vendo-o erguer o braço até o livro estar acima da sua cabeça, longe do alcance das minhas mãos. —Me devolva. Ele me pertence!

—Esses aposentos me pertencem e você está nele. —Retrucou, e eu senti o calor subir para o meu rosto por ter sido pega no flagra. —A pessoa que te deu isso é a mesma que lia essas história pra você quando era criança?

—Isso não é da sua conta. —Retruquei, com minha voz saindo completamente afiada. Dei um pulo tentando alcançar o livro, o que só o fez balançar a cabeça negativamente. —Me devolva ele.

—Não até me contar de onde isso veio. —Afirmou, e eu soltei um suspiro frustrado, sentindo vontade de socar o peito dele até ele me devolver aquilo. —Isso aqui não é um simples livro de lendas, Avery. E eu tenho a sensação que a pessoa que te deu isso sabia desse fato. Você sabe coisas demais. Coisas que não deveria saber sobre nós.

—E que importância isso tem? —Praticamente gritei, tentando alcançar o livro de novo e arrancá-lo da sua mão. Iria correr de volta para os meus aposentos assim que o conseguisse de volta.

—Tem muita importância, a partir do momento que as histórias contadas nessas páginas são reais! —Exclamou, segurando meu braço quando bati no peito dele. A mão dele estava quente em contato com minha pele fria, fazendo meu coração chegar a garganta. —Você me disse que ela tinha morrido, então porque se recusa a me contar?

—Porque é a minha vida. São minhas lembranças. E eu não quero dividir nada disso com você! —Soltei, tentando tirar a mão dele do meu braço.

Me escorei no peito dele e pulei, mais uma vez sem conseguir agarrar o livro. Aquilo só fez com que eu praticamente caísse em cima dele, com meu corpo grudando no peito firme e quente. Ergui a cabeça, puxando o ar com força quando encontrei o rosto de Kaden rente ao meu. Os olhos faiscando na minha direção.

Para minhas doces Elowen e Avery. Escrevam suas próprias histórias. Com todo amor, L. B. —Kaden sussurrou as palavras escritas na primeira página do livro, fazendo meus olhos arderem quando pensei na pessoa que havia as escrito. Kaden viu a dor nos meus olhos. O luto que jamais iria embora.

—Ela era só uma criada do castelo. Só isso. Uma mulher tentando deixar a vida o mais confortável possível pra nós. —Afirmei, sentindo um nó se formar na minha garganta quando Kaden balançou a cabeça negativamente. Quase senti que ele iria me devorar com aqueles olhos vermelhos. —E ela se foi a muito, muito tempo.

—Uma criada da realeza jamais saberia as coisas que ela sabia. Jamais teria isso em mãos. —Ele balançou o livro, abaixando o braço. Não tentei o pegar quando ele ficou ao alcance das minhas mãos, conectada demais naqueles olhos, sentindo que o próprio calor do corpo de Kaden estava me prendendo contra ele.



Continua...

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