Dessa vez não esperei anoitecer para tomar uma atitude. Depois de deixar o rei sozinha, comecei a preparar tudo para o que eu tinha em mente. Fiz todas as minhas tarefas, conseguindo tempo livre para ir até os aposentos da princesa. Procurei por todos os lugares do closet, até encontrar o pequeno baú onde Selene guardava as moedas que ganhava do rei.
Ela tinha levado mais da metade na viagem, mais ainda havia sobrado uma boa quantia. Peguei tudo e coloquei em um saquinho, escondendo na saia do meu vestido para que ninguém me visse saindo dali com aquilo. Deixar de deixar a ala da realeza, percorri os corredores até uma das saídas do castelo, que davam para os estábulos e área de treinamento dos guardas.
Um arrepio atravessou meu corpo quando vi os cavaleiros do rei, que usavam roupas completamente pretas, além de luvas igualmente escuras. Eles não estavam treinando. Estavam reunidos em um círculo, rindo e conversando. Senti os olhos de alguns sobre mim quando passei pelo corredor aberto para a área central de treinamento.
Passei por duas enormes portas, que davam para o campo coberto de neve no fundo. Havia vários guardas reunidos ali, treinando com espadas e arcos. Fiquei assustada ao ver a brutalidade com que eles lutavam, como se tudo fosse muito real e não apenas um treinamento. Parei de andar quando encontrei quem eu estava procurando. Lucian afiava algumas facas em uma mesa perto do campo, onde os soldados treinavam o lançamento das lâminas.
Os olhos dele correram ao redor como se ele sentisse que estava sendo observando, parando em mim com um misto de surpresa e preocupação. Não falei absolutamente, além de indicar de leve com a cabeça o castelo, virando as costas e seguindo de volta para dentro quando tive certeza de que ele havia entendido meu sinal.
Esperei por ele nos corredores silenciosos da ala dos guardas, andando de um lado para o outro. Tive a sensação que esperei por horas quando Lucian e Elowen surgiram no final do corredor, caminhando de mãos dadas até onde eu estava. Uma pontada de alívio tomou conta de mim, porque estava começando a ficar ansiosa e preocupada com a possibilidade de ser pega.
—O que está havendo? —Elowen questionou, enquanto Lucian puxava a chave do quarto dele e o abria, permitindo que nós três entrássemos. Não ousei dizer uma palavra até que a porta estivesse fechada, porque tinha medo que até as paredes pudessem me ouvir e contar a o rei o que eu estava fazendo.
—Precisamos fugir. —Falei, porque não os deixaria naquele castelo nunca. Não sabendo que o rei não hesitaria em entregar muitos de nós para os vampiros. Elowen e Lucian trocaram um olhar demorado, parecendo não saber como reagir aquilo. —Não estamos seguros aqui. Nenhum de nós está. E eu não... acho que eu não tenho muito tempo.
—Pra onde iríamos? —Lucian questionou, gesticulando ao redor, como se não conseguisse entender o que eu pretendia com aquilo. —Não temos nada, Avery. Pra onde iríamos?
—Vamos arrumar os cavalos e partir antes do anoitecer, quando todos estiverem jantando. Vamos para a vila mais próxima. Encontramos um lugar pra passar a noite e seguimos viagem para o sul. Para as montanhas. —Afirmei, engolindo muito lentamente, porque sabia que aquilo nos colocaria em uma situação péssima, mas ainda seria melhor do que ficar ali. —Consegui uma boa quantidade de moedas que pode nos ajudar no caminho até lá e talvez até mesmo para começar alguma coisa.
—Conseguiu onde? —Elowen questionou, e eu olhei pra ela com uma expressão tensa, tombando a cabeça de lado. Ela ergueu a mão e esfregou a testa quando entendeu o que eu tinha feito, antes de assentir. —Tudo bem. Podemos arranjar trabalho pra onde formos. Daremos um jeito.
—Tem certeza que é a melhor escolha? —Lucian questionou, e eu confirmei com a cabeça, olhando na direção da porta, porque estava com tanto medo dos guardas aparecerem ali pra me prenderem. —O rei...
—Ele vai entregar quantos de nós for necessário se isso livrar a cabeça dele dos vampiros. Ele vai me entregar, se isso for proteger a princesa. Até poderia ficar aqui e o ajudar, mas não vou fazer isso quando ele não está nem um pouco preocupado com os seus súditos. —Afirmei, umedecendo os lábios com a língua, porque tinha sido idiotice aceitar aquilo no início. —Não vou pagar por um erro do rei. Nem sei de fato o que ele fez. Só sei que aquelas cabeças de vampiros não são mortes causadas pelos cavaleiros do rei. Alguém faz isso pra ele.
—Vamos fugir então. —Elowen concordou, olhando na direção de Lucian. —Você virá com a gente ou vai ficar?
—Você acha que eu ficaria aqui com você indo embora? —Questionou, e Elowen apenas deu de ombros, erguendo o queixo para não demonstrar sua ansiedade. —Pra onde forem, iremos juntos. Não vamos nos separar.
Abri um sorriso, vendo-o puxar Elowen para perto como se quisesse passar conforto a ela. Meu coração se apertou, sabendo que o rei ficaria furioso quando percebesse o que eu tinha feito. Mas era melhor contar com a fúria dele bem longe dali, do que suportar o olhar de alerta quando eu só estava tentando sobreviver.
[...]
Quando todos estavam jantando, peguei minhas bolsas de viagem no quarto, enchendo-as com a maioria daqueles vestidos que Selene havia me dado. Uma parte pra mim e outra para Elowen. Lucian já tinha arrumado dois cavalos para viajarmos, depois de uma discussão sobre o que seria mais rápido, uma carroça ou apenas os cavalos.
Os cavalos chamariam menos atenção e poderíamos nos esconder na floresta caso os guardas viessem atrás de nós. Mas se tivéssemos sorte, o rei só perceberia o que eu tinha feito quando já estivéssemos bem longe do reino. Montei em um dos cavalos, com tudo pronto, vendo Elowen montar atras de Lucian. Os cabelos ruivos escondidos pela capa grossa de couro.
Olhei uma última vez para o castelo, tentando não pensar nas consequências que aquilo poderia trazer. Estava apenas tentando sobreviver. Se ninguém faria nada por mim, então eu faria por mim mesma. Tinha crescido naquele castelo. Fazia parte daquelas paredes. Não era justo que eu morresse ali também, por algo que nunca me trouxe nada e apenas me tirou minha mãe.
—Avery, tudo bem? —Elowen questionou, porque os dois já estavam mais à frente esperando por mim. Balancei a cabeça, engolindo todos os sentimentos bagunçados que tomavam conta de mim naquele momento, antes de bater no lombo do cavalo para irmos embora.
Continua...
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Acordo de Sangue Cruel
FantasyO rei das terras congeladas de Ártemis ganhou a belíssima fama de caçador de vampiros, treinando seus homens para atravessar a grande muralha que separa o território humano das criaturas cruéis que se alimentam de sangue. Quanto mais cabeças de vamp...