A respiração ficou presa na minha garganta, enquanto minha barriga queimava como se eu tivesse comido brasa. Meus olhos se encheram de lágrimas quando pensei nas coisas que Varek havia dito. Ele não tinha mentido. Eles ainda se alimentavam de humanos. Matavam a minha espécie, como se não valêssemos mais.
Me assustei quando Kaden apareceu no meio de toda aquela cena que estava me partindo ao meio. Os olhos encontrando os meus como se ele soubesse que eu estava ali. Como se ele tivesse me sentido. Como sempre, ele sempre me pegava espionando. Mas dessa vez eu não queria vê-lo. Dessa vez eu queria sair correndo e me esconder em um lugar que ele não conseguiria me achar.
Disparei pelas escadas, tropeçando nos degraus e caindo no chão, porque além de estar escuro, meus olhos estavam borrados pelas lágrimas. Escutei o som da porta sendo fechada e me apressei em ficar de pé e voltar a correr, porque sabia que era ele quem estava vindo atrás de mim. Quando cheguei naquela sala circular que dava o caminho para cada uma das torres, fui na que eu sabia pertencer a Morgana, porque não queria voltar para aquele lugar que me lembrava Kaden.
—Avery, espere. —Kaden exclamou atrás de mim, mas eu já tinha mergulhado na escuridão daqueles corredores, subindo as escadas enquanto procurava qualquer porta que se abrisse e que eu pudesse me trancar lá dentro, longe dele. —Pare de correr. Sabe que eu posso te alcançar se eu quiser.
—Vá para o inferno! —Gritei, soltando um o choramingo quando bati a cabeça no que parecia ser o suporte de uma tocha na parede. Continuei a correr, tropeçando na saia do vestido antes de encontrar um cômodo para entrar. Abri a porta, empurrando-a com força antes de passar a tranca.
—Avery, você pode continuar surtando ou se sentar e me ouvir. Garanto que a segunda opção vai facilitar muito as coisas para nós dois. —Ele segurou a maçaneta e a forçou, enquanto eu dava alguns passos para trás até bater em uma parede e sentir algo pinicar minha pele.
Quando me virei, visualizei o que parecia ser uma sala cheia de armas. Não conseguia ver muito além das sombras, mas podia jurar que as paredes eram cobertas com todos os tipos de espadas, facas, arcos e outras coisas que eu não conseguia saber o que era. Agarrei uma das facas, me virando ao mesmo tempo que escutei o som da porta sendo quebrada.
—Não chegue perto de mim! —Afirmei, vendo o que tinha feito tarde demais. Kaden virou o rosto quando eu o atingi. O corte na bochecha ficando visível quando o sangue escorreu pela pele perfeita. Ele olhou pra mim e ergueu uma das sobrancelhas, enquanto meu corpo estremecia como se eu tivesse machucado a mim mesma.
—Solte essa faca, princesa. Nos dois sabemos que você não vai conseguir nada com ela. —Sibilou, e a lembrança de que eu já havia enfiado uma faca nele, em um momento de desespero, que não pareceu afetá-lo nem um pouco. Dessa vez não foi diferente, porque o corte na sua bochecha já tinha desaparecido quando ele limpou o sangue com a manga da camisa.
—Fique longe de mim! —Soltei, erguendo a faca e apontando pra ele, mesmo que aquilo não fosse matá-lo, mas ainda me passava alguma segurança. —Nunca mais chegue perto de mim ou me toque!
—Nunca mais? —Ele tombou a cabeça de lado, me encarando com um brilho de diversão nos olhos, como se não acreditasse nas minhas palavras. —Eu avisei que aquela era sua chance de fugir.
—Como você tem coragem de falar comigo assim? —Indaguei, incrédula com a capacidade dele de fingir que estava tudo bem. —Eu o vi lá dentro, com aqueles outros vampiros e com... Você estava bebendo sangue humano como eles? Estava matando pessoas como eu?
—Não, não pessoas como você. —Ele deu um passo para perto de mim e eu um pra trás, até estar escorada naquela parede de armas. Tentei não me encolher por conta das lâminas geladas que tocaram a minha pele, enquanto mantinha aquela faca apontada pra garganta dele. —Eles nem mesmo são do seu reino, Avery. São apenas mercadorias. E nós, compradores.
—São pessoas! —Exclamei, fervendo de ódio com a calma que ele falava aquilo. —Varek tentou me avisar sobre vocês, mas eu fui burra e fingi que não estava vendo a verdade exposta bem na minha cara.
—Ah, agora Varek passou a ser um santo e eu um demônio? —Kaden estalou a língua, sorrindo tanto que meu sangue ficou gelado, porque ele passou a língua sobre os dentes e eu pensei nas coisas que ele tinha me dito. Na cena que vi minutos atrás. —Quer que eu monte uma lista de todas as atrocidades que ele já cometeu?
—Você queria me morder... —Meu coração se apertou, e eu quase não consegui respirar direito enquanto falava aquilo. —Você queria me morder por isso? Queria que eu fosse mais uma adição pra lista de pessoas que vocês mataram?
—Eu digo que quero te transformar em uma rainha e é essa a conclusão que você chega? —Kaden soltou uma risada fria que fez até meus ossos gelarem, porque ele parecia estar começando a parecer irritado. —Se eu quisesse te matar, Avery, eu já teria feito isso. Você dorme na porra do meu clã, a metros dos meus aposentos. Na verdade, caso tenha esquecido, dividimos a mesma cama na última noite.
—E você não tem ideia do quanto eu me arrependo disso. —Sussurrei, e minha frase pareceu o atingir mais do que o corte que fiz na sua bochecha. Vi quando minha frase o acertou e sua expressão endureceu. Aquela cor vermelha nos olhos de Kaden pareceu ficar mais intensa, como se sua sede estivesse muito maior.
—Você sempre foi boa em fingir, não é, princesa? —Ele torceu os lábios em frustração, enquanto eu me encolhia contra aquela frase, porque ele sabia como me atingir também. Não deixei que ele notasse o quão abalada eu estava por dentro, mesmo que minhas mãos tremessem ao redor daquela faca. —O que vai fazer, Avery, tentar me matar?
—Eu vou embora daqui. —Afirmei, e isso pareceu o surpreender, porque Kaden ficou visivelmente sem reação. —Já ajudei vocês com tudo que precisavam. Vou embora daqui agora.
—Você não pode. —Ele deu um passo na minha direção quando tentei dar a volta por ele para chegar até a porta.
—Por que não? Por que eu não posso, Kaden? —Questionei, odiando o tom ansioso e hesitante na minha voz, porque não queria ouvir a resposta dele, mesmo que tivesse o questionado.
—Posso morder você agora mesmo, sabia? Posso te transformar e você não vai ter opção a não ser ficar aqui. —Afirmou, e eu vacilei um pouco, vendo que Kaden estava falando sério sobre aquilo. E ele estava me olhando como se realmente pensasse na possibilidade.
—Você não faria isso. —Falei, engolindo em seco quando Kaden abriu um sorrisinho com o canto dos lábios, como se estivesse me testando. —Se você fizer isso, sabe que jamais vou deixar que chegue perto de mim de novo. Jamais vou olhar pra você de novo.
Aquilo pareceu despertar alguma coisa nele. Uma onda violenta de negação e irritação. Fiquei sem fôlego quando a cor dos olhos de Kaden mudou, dando lugar aquele tom azul pintado de preto, quando ele pareceu tentar controlar o que estava sentindo, mesmo que seu rosto estivesse marcado com a frustração que ele sentia por mim.
—Avery, aqueles humanos não são nada. Eles são prisioneiros. São pessoas que fizeram coisas ruins. Foram cruéis e maldosos. —Kaden se aproximou de mim furioso, como se não acreditasse que eu estava mesmo pensando em ir embora por aquilo. —Nenhuma daquelas pessoas é inocente. Elas vão queimar no inferno. Nós só estamos as ajudando a chegar lá mais rápido.
Continua...

VOCÊ ESTÁ LENDO
Acordo de Sangue Cruel
FantasiO rei das terras congeladas de Ártemis ganhou a belíssima fama de caçador de vampiros, treinando seus homens para atravessar a grande muralha que separa o território humano das criaturas cruéis que se alimentam de sangue. Quanto mais cabeças de vamp...