Capítulo 69: Filha mais velha.

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Soltei uma risada incrédula, porque aquilo que Kaden estava falando era uma loucura. Mas ele continuou sério, me fazendo perceber que ele não estava brincando. Engoli em seco, apertando minhas mãos, até sentir minhas unhas cortarem a palma da minha mão. Isso fez Kaden respirar fundo e seus olhos escurecerem, como se ele pudesse sentir o cheiro do sangue.

Eu também estava sentindo e aquilo me fez apertar minha mão com mais força, antes de ele as segurar. Deixei que ele abrisse meus dedos, antes de levar até os lábios e limpar o sangue ali antes que os cortes desaparecessem. Meu ventre se agitou, pensando no fato de que ele ainda não havia bebido o meu sangue. Não havia reclamado e nem pedido, mas agora eu estava me sentindo injusta ao perceber que não pensei nisso antes.

—Os demônios são filhos da morte. Eles vivem presos no inferno. Não podem sair de lá, porque estão ligados aquele lugar pela magia da mãe. —Kaden afastou minha mão, me puxando para perto dele, até meus seios roçarem no seu peito. —Mas eles conseguem visitar o mundo dos vivos, como eles mesmo chama, usando magia e sangue pra possuir o corpo de alguém. Quando eles fazem isso podem acabar tendo relações com alguém que resultam em filhos. É raro, mas acontece.

—Está me dizendo que Elowen é filha de um demônio que possuiu o corpo de um homem e dormiu com a mãe dela? —Questionei, sem saber se ficava chocada ou completamente horrorizada com aquilo. Kaden confirmou com a cabeça, enquanto eu abria e fechava a boca algumas vezes, procurando pelas palavras certas. —Isso é nojento. Ele estava no corpo de outra pessoa!

—Demônios não costumam ter muita moral, princesa. Eles literalmente devoram almas. —Kaden tentou contornar a situação, mas eu não conseguia parar de pensar no quanto aquilo era absurdamente bizarro. —Mas, como eu disse, isso é raro. E esses filhos são perigosos. Eles não tem a mesma magia que um demônio, mas algo parecido, que não conseguem controlar direito por estarem fora dos territórios da morte. Se perderem o controle podem causar um estrago inimaginável.

—Por isso são mortos antes de ficarem adultos. —Sussurrei, e Kaden assentiu, enquanto eu pensava no que aquilo poderia significar quando o assunto era Elowen. —Mas ela nunca demonstrou ter poderes. Nunca fez nada de errado ou machucou alguém, de propósito ou sem querer.

—Elowen alguma vez já ficou com muita raiva? —Kaden questionou, e eu hesitei antes de negar com a cabeça. —Então ninguém a tirou da sua zona de conforto ainda. Precisamos falar com a bruxa para ter certeza. Ainda é só uma teoria, Avery.

—Você tem razão. —Falei, engolindo o desconforto que toda aquela conversa trouxe pra mim. —E eu preciso contar tudo isso a ela. Não posso esconder uma coisa assim. É importante demais. Depois que voltarmos terei meu tempo conversando com ela. Só não queria estragar o momento dela com Lucian.

—Por que os dois estão tendo o tempo deles depois do casamento e eu fui arrancado da cama logo depois do nosso laço de parceria aparecer? —Kaden questionou, e foi uma pergunta tão genuína que eu levei as mãos ao lábio para não rir alto e acabar chamando a atenção de alguém.

—Pobre lorde Velmont, sendo completamente injustiçado pela sua parceira. —Sussurrei, o empurrando até a minha antiga cama. Não tínhamos tempo pra nada, mas ia deixar que ele matasse sua sede, porque ele deveria estar morrendo de vontade desde que saímos do clã.

Me sentei no colo de Kaden, vendo os olhos dele escurecerem quando ele percebeu o que eu pretendia fazer. Me ajeitei ali, abrindo um sorriso pra ele antes de abrir alguns botões do vestido e abaixar a alça. Peguei meus cabelos e os deixei de um lado só, jogados sobre meu ombro.

—Quando voltarmos, vou deixar você me prender nos nossos aposentos se quiser. —Afirmei, engolindo em seco quando a boca de Kaden desceu até minha garganta, deixando um rastro de beijos pela minha pele apenas para me provocar.

—Pode ter certeza de que farei exatamente isso. —Prometei, e eu me retesei sobre seu colo, sentindo suas mãos afundarem no meu quadril, antes de Kaden me morder.

Um gemido escapou pelos meus lábios quando inclinei a cabeça para trás, deixando-o se deliciar com meu sangue. Segurei a cabeça dele, porque a sensação de senti-lo fora do controle daquele jeito era o suficiente para me fazer desejar muito mais. Mas estávamos no castelo e não podíamos nos distrair. Quando voltássemos talvez eu mesma o prendesse nos nossos aposentos.

[...]

A sala do trono estava mergulhada na mais profunda escuridão quando entrei. Não havia um guarda a vista, ou talvez Kaden tenha dado um jeito neles. Caminhei pelo salão, escutando minhas botas causarem um eco pelas paredes de pedra, enquanto eu me aproximava dos degraus que davam para o trono.

Comprimi os lábios ao pensar em quantas vezes tinha estado naquele lugar, servindo o rei enquanto o tempo todo ele sabia que eu era sua filha. Ele sabia e simplesmente não se importava. Passei a mão pela saia do vestido e a ergui um pouco, subindo os degraus antes de me aproximar do torno. Passei a mão sobre um dos braços dele, balançando a cabeça negativamente.

—Enquanto os injustos fixam com a coroa, os justos se tornam os vilões. —Sussurrei, passando a língua sobre os lábios antes de me virar e me sentar ali. O ar preso na minha garganta quando ergui o queixo e encarei aquele salão silencioso e vazio, tomado pela escuridão.

Cruzei as pernas, descansando minhas mãos no meu colo, enquanto encarava as portas do outro lado quando elas se abriram e o rei entrou. Estava escuro demais, então ele não viu que eu estava ali. Mas caminhou pelo salão olhando ao redor, visivelmente assustado com o que quer que o esperava.

—Vejo que recebeu minha carta. —Falei, fazendo-o perceber que era eu quem estava ali e aonde eu estava sentada. No seu trono. No lugar que ele tanto gostava de ocupar e dar ordens.

—Avery? —A voz dele veio cheia de incredulidade, como se ele não fosse capaz de acreditar no que estava vendo. Mas a surpresa logo se transformou em indignação. —O que pensa que está fazendo sentada no meu trono? Você me traiu e agora invade o castelo e se senta no meu lugar?

—Engraçado como cada pessoa pode ter uma visão diferente da mesma história. —Inclinei a cabeça para o lado, piscando inocentemente, antes de balançar a cabeça negativamente. Ele parou no início dos dois degraus, me encarando furioso. —Você me usa para proteger a Selene, estando disposto a matar vários dos seus súditos inocentes, por conta de um erro que você cometeu. Mas eu sou a traidora?

—Saia do meu trono, sua ingrata. Saia antes que eu chame os guardas e a façam sair daí arrastada pelos cabelos. —Sibilou, lançando cada palavra como se fosse um insulto. Mas quem estava sendo insultada era eu, quando precisava olhar pro rosto dele e saber que parte do meu sangue estava ali. Aquilo me deixava com vontade de arrancar minha própria pele.

—Seu trono? —Estalei a língua e relaxei ainda mais ali, escorando meu cotovelo em um dos braços no trono. —Como filha mais velha, sou a herdeira legítima da coroa. Então acho que esse trono me pertence também, papai.

Não haveria nada no mundo capaz de ser mais delicioso do que o assombro que atravessou o rosto dele quando me ouviu. A percepção de que eu sabia de tudo. E principalmente, quando inclinei meu corpo para frente, deixando a luz da lua que entrava pelas janelas iluminar meus olhos. O rosto dele ficou pálido quando viu o tom vermelho presente ali e quando percebeu o que eu era.


Continua...

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