Marina Soarez Medina's point of view
A manhã estava clara e ensolarada, perfeita para um fim de semana na praia. Gabriel e eu havíamos discutido sobre convidar a família de Marcello para passar o dia conosco, mas não foi fácil convencê-los, principalmente a mãe dele, Lúcia. Marcello sempre mencionava o quão ocupada e cansada ela era, então já sabíamos que ela teria hesitações. Depois de várias tentativas de conversa, Lúcia finalmente aceitou o convite, embora relutante.
Marcello estava radiante. Para ele, trazer a família para nossa casa era algo grande, e eu sentia que isso era mais importante do que ele conseguia expressar em palavras. Quando chegamos para buscá-los, Lúcia e as crianças estavam prontos, e não pude deixar de notar a tensão nos olhos dela. Era o olhar de alguém que carregava um fardo imenso, uma mulher que enfrentava batalhas diárias para sustentar sua família. Com quatro filhos a tiracolo, um bebê de nove meses no colo e o cansaço visível em seu rosto, eu entendi de imediato a razão da hesitação.
Ao longo do caminho, tentei suavizar o ambiente com conversas leves. Lúcia respondia de forma educada, mas reservada. As crianças, por outro lado, estavam animadas, com olhares curiosos pela janela do carro, como se estivessem entrando em um mundo completamente novo.
Quando chegamos à nossa casa, Gabriel já estava esperando com Helena e Cecília, que correram para receber os novos visitantes. Vi Marcello se iluminar quando Helena o chamou para mostrar a prancha nova que tinha acabado de ganhar do pai. Era como se por algumas horas, ele pudesse esquecer suas responsabilidades e apenas ser uma criança.
Nos sentamos na varanda, com vista para o mar. O som das ondas era tranquilizante, e Lúcia parecia aos poucos relaxar. Ela olhava ao redor, ainda desconfiada, como se não soubesse se podia realmente baixar a guarda. Eu comecei a preparar um café para todos e Gabriel ficou responsável por entreter as crianças, levando-as para a praia enquanto nós conversávamos.
— Você tem uma família bonita — ela disse baixinho, depois de alguns minutos de silêncio.
Eu sorri, mas percebi a dor escondida atrás do elogio. Havia uma tristeza nos olhos de Lúcia que eu já conhecia de minha própria história. Não foi difícil perceber que havia muito mais naquela mulher do que a aparência de alguém exausta pela vida.
— Obrigada. Sei que pode ser difícil aceitar ajuda, mas queríamos que você se sentisse à vontade aqui hoje — disse, tentando abrir espaço para o que eu sentia que ela queria compartilhar.
Lúcia respirou fundo, e então, como se estivesse segurando aquilo por muito tempo, começou a falar. O que começou como uma troca de trivialidades logo virou um desabafo. Ela me contou sobre como o pai de Marcello a abandonou quando ela era apenas uma adolescente, grávida e perdida. Ele desapareceu sem deixar rastros, e ela teve que enfrentar o mundo sozinha. Na época, sem apoio, ela conseguiu trabalho em pequenos bicos para se manter e ao filho.
— Conheci outro cara um tempo depois. Achei que seria diferente — Lúcia contou, a voz pesada de arrependimento. — Mas ele só queria diversão, e com ele tive os gêmeos e depois uma garotinha. Logo depois, ele foi embora também, como o pai de Marcello.
Eu sentia um nó se formando no meu estômago enquanto ouvia. A história dela não era tão diferente de muitas que eu já tinha ouvido, mas o fato de que era a mãe de um garoto que havia se tornado tão próximo de nós tornava aquilo tudo mais pessoal, mais real.
— Eu fiquei sozinha, mais uma vez, com quatro filhos — continuou ela, a voz começando a vacilar. — E então, apareceu o último... um homem mais velho, parecia confiável, mas no final, ele não me assumiu. Ele já tinha outra família. Me deixou com minha filha mais nova, que agora tem só nove meses.
Ela pausou e olhou para o horizonte, tentando segurar as lágrimas. O peso que ela carregava era palpável, e naquele momento eu não sabia o que dizer. Só podia ouvir.
— E agora, eu faço o que posso, trabalho à noite, faço o que preciso para colocar comida na mesa. Não é algo de que eu me orgulhe... — Lúcia parou, suas mãos tremendo ao segurar a xícara de café. — Mas é o que me restou. Marcello cuida dos irmãos enquanto eu estou na rua. Ele não deveria, sabe? Ele é só uma criança. Mas eu não tenho escolha.
As palavras dela ecoaram em mim de um jeito que não imaginei. Marcello, que nos fins de semana brincava e surfava com Helena como qualquer outra criança, à noite cuidava dos irmãos enquanto sua mãe trabalhava em condições duras, solitária e sem apoio. Fiquei em silêncio por um momento, tentando absorver a realidade que ela enfrentava.
— Lúcia, você tem sido incrivelmente forte — eu disse, tocando levemente sua mão. — Sei que deve parecer impossível às vezes, mas você está fazendo o seu melhor. E, de verdade, você não está sozinha.
Ela me olhou, os olhos marejados, como se minhas palavras fossem algo que ela não ouvia há muito tempo.
— Eu não quero que ele cresça rápido demais — ela disse, referindo-se a Marcello. — Mas parece que ele não tem escolha.
Foi nesse instante que eu soube, mais do que nunca, que Gabriel e eu estávamos fazendo a coisa certa com o Instituto. Ajudar crianças como Marcello, e apoiar famílias como a de Lúcia, era mais do que apenas oferecer aulas de surfe. Era dar uma oportunidade de respiro para essas mães, de liberdade para essas crianças. E Lúcia, que tinha se mostrado tão reticente, agora parecia entender que ela podia, sim, aceitar ajuda.
— Você está aqui agora, e isso já é um começo — disse, apertando sua mão com mais firmeza. — Podemos fazer muito juntos, e não só por Marcello, mas por você e seus outros filhos também.
Lúcia suspirou, e pela primeira vez naquela tarde, esboçou um pequeno sorriso.
— Obrigada. Eu nem sei o que dizer — ela respondeu, com a voz mais suave.
Eu sorri de volta, com a certeza de que essa era apenas a primeira de muitas conversas que teríamos. Havia tanto que queríamos fazer, e agora, mais do que nunca, sabíamos exatamente por onde começar.
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Our Waves - Gabriel Medina
Fanfiction2° TEMPORADA DE ON YOUR WAVE. RECOMENDO QUE LEIA ANTES! Helena, agora uma promessa emergente no surfe competitivo, continua a trilhar seu caminho nas ondas, enquanto sua família lida com os desafios e mudanças que vêm com essa nova fase. Gabriel, t...