Tocar Música da Midia!
S/N POV
Olho para o deserto sem fim à minha frente, uma vasta extensão de ouro e laranja sob o sol a afundar no horizonte. O vento sussurra nos meus ouvidos, carregando grãos de areia que roçam na minha pele como murmúrios de um mundo ao qual sinto que não pertenço completamente. É irónico, acho eu, que tenhamos vindo parar aqui, de todos os lugares—um deserto árido e estéril—quando sinto que tenho vivido num deserto há meses.
O Charles está algures atrás de mim, mexendo no jipe, resmungando baixinho por causa de algum problema mecânico. Ele está sempre a encontrar algo para fazer. Talvez seja esse o segredo do sucesso dele, estar sempre ocupado, sempre a consertar algo. Mas eu? Sinto-me quebrada de formas que não se consertam com uma chave de fendas ou um ajuste rápido debaixo do capô.
Não sei porque viemos aqui. Talvez tenha sido ideia minha, talvez dele. Já não consigo lembrar. As nossas vidas têm sido tão rápidas, sempre em movimento, um turbilhão de viagens, corridas, eventos e aparições públicas. Em Mónaco, na Itália, em países cujos nomes mal me recordo. O deserto era suposto ser uma pausa, um lugar para nos reconectarmos com algo real. Mas, em vez disso, tudo o que sinto é o vazio.
Mudo de posição na rocha onde estou sentada, observando o sol a desaparecer lentamente abaixo do horizonte, as suas últimas luzes tingindo o céu de tons de rosa e roxo. Bonito, sim, mas de uma forma distante, desconectada. Tal como tudo o resto ultimamente. Tenho andado a fazer o que é esperado, a sorrir para as câmaras, a acenar durante conversas com estranhos que só me veem como a namorada do Charles Leclerc. Mas por dentro, há um vazio que me corrói, um oco que não consigo afastar.
Eu amo o Charles. Pelo menos, acho que amo. Ou talvez ame a ideia dele—da ideia de nós. Ele é tudo o que pensei que queria: encantador, determinado, bem-sucedido. Ele faz o mundo girar um pouco mais rápido quando está por perto, atrai as pessoas com aquele sorriso fácil e aqueles olhos que parecem ver através de ti. Mas, mesmo quando estou com ele, sinto-me sozinha. Há uma desconexão, como se vivêssemos em dois mundos diferentes. O dele é rápido e frenético, cheio de adrenalina e barulho. O meu... o meu parece mais silencioso, mais suave, mas igualmente caótico à sua maneira.
Olho para trás, vendo-o finalmente desistir do jipe e caminhar na minha direção, limpando as mãos da poeira. Ele parece cansado, mas não do tipo de cansaço que vem da falta de sono. É mais profundo, mais entranhado, como se o peso do seu próprio mundo estivesse a começar a apanhá-lo.
"O jipe não está a colaborar," diz ele com uma pequena risada, passando a mão pelo cabelo despenteado. "Vou ter de chamar alguém para vir cá de manhã."
Eu aceno, sem confiar na minha voz. A minha garganta está apertada, como se ao abrir a boca, todas as palavras que tenho guardado dentro de mim iriam sair e afogar-nos. Em vez disso, observo-o sentar-se ao meu lado na rocha, os nossos joelhos a tocarem-se ligeiramente. O silêncio entre nós é pesado, cheio de pensamentos não ditos e da distância que tem crescido entre nós há meses.
"Belo pôr do sol," diz ele, a voz mais suave agora, quase reverente.
"Sim," murmuro, embora pareça uma mentira. É bonito, sim, mas não me toca. É como ver algo através de um vidro—perto o suficiente para ver, mas demasiado longe para tocar.
Ele vira-se para mim, e sinto o olhar dele a demorar-se no meu rosto. Sei que ele também sente isso. A distância, a desconexão. O Charles é intuitivo assim, sempre consciente da tensão, mesmo que nunca a aborde. Mas esse é o problema, não é? Nunca falamos sobre isso. Apenas continuamos a andar, como se, ao irmos rápido o suficiente, conseguíssemos fugir do inevitável. Mas agora, na quietude do deserto, não há mais para onde correr.
"Estás feliz?" A pergunta escapa antes que eu possa detê-la. A minha voz soa estranha, mesmo para mim—crua, vulnerável, quase infantil na sua simplicidade.
O Charles hesita, franzindo as sobrancelhas. Abre a boca, depois fecha-a, como se não soubesse o que responder. Finalmente, desvia o olhar, fixando-o no horizonte, onde o último vislumbre do sol está a desaparecer na terra.
"Não sei," admite calmamente. "E tu?"
Engulo em seco, a verdade a arder na minha garganta. "Também não sei."
E ali está, a confissão que nenhum de nós queria fazer, mas ambos sabíamos que estava por vir. As palavras pairam entre nós, pesadas e sufocantes no ar fresco da noite. Não é que sejamos infelizes, exatamente. É mais como... estamos perdidos. Como se tivéssemos estado tão presos no turbilhão da vida dele—da nossa vida—que nos esquecemos de como encontrar-nos dentro dela.
"Sinto que estou a desaparecer," digo, a minha voz mal mais alta que um sussurro. "Como se estivesse só... aqui, a flutuar por tudo, mas sem realmente fazer parte de nada."
O Charles vira-se para mim, os olhos dele a procurarem os meus. Há algo no olhar dele—preocupação, talvez, ou arrependimento—mas ele não se estica para me puxar de volta da beira do abismo onde tenho estado a balançar há tanto tempo. Talvez ele não saiba como.
"Eu não sabia que te sentias assim," diz ele suavemente. "Pensei... pensei que estavas feliz com a forma como as coisas estavam."
"Como as coisas estão," corrijo, e as palavras saem mais afiadas do que eu pretendia. "Não estavam. Estão. Este é o nosso presente, Charles. Esta é a nossa vida. E não sei se consigo continuar a vivê-la assim."
Ele estremece, só um pouco, mas o suficiente para eu notar. Eu sei que ele me ama, à sua maneira. Mas o amor não é suficiente, pois não? Não quando há este abismo entre nós, este vazio crescente que nenhum carro veloz ou viagem glamorosa consegue preencher.
"Não quero perder-te," diz ele finalmente, a voz mal audível acima do suave murmúrio do vento.
Eu também não quero perdê-lo. Mas às vezes, perder alguém não acontece de uma só vez. Às vezes, é um processo lento, um afastamento gradual até que, um dia, acordas e percebes que a pessoa ao teu lado é um estranho.
Levanto-me, sacudindo a areia das calças de ganga, e respiro fundo. O deserto está quieto agora, o sol completamente desaparecido, deixando apenas as estrelas para iluminar o céu. Sinto-me pequena, insignificante, como uma dessas estrelas—tão longe de tudo, apenas uma pequena mancha na vastidão de tudo isto.
"Devíamos voltar," digo, a voz mais firme do que me sinto. "Está a ficar tarde."
O Charles acena, mas nenhum de nós se mexe. Ficamos ali mais um momento, lado a lado, mas mundos afastados, perdidos nos nossos próprios pensamentos.
O deserto parece o metáforo perfeito para nós—vasto, vazio, bonito de uma forma assustadora. Mas por mais deslumbrante que seja, não há vida aqui. Apenas silêncio.
E talvez isso seja o que mais me assusta.
VOCÊ ESTÁ LENDO
F1 Imagines
Fanfiction*F1 Imagines* é um livro que mergulha na imaginação criativa dos fãs da Fórmula 1, oferecendo uma experiência única e imersiva. Cada página captura momentos vibrantes e intensos, permitindo aos leitores vivenciar histórias fictícias com seus pilotos...