15) É caridade ou comício?

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Eu não sabia o que eu estava fazendo ali

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Eu não sabia o que eu estava fazendo ali. Quer dizer, eu sabia, mas não conseguia processar que eu estava perdendo meu tempo com aquela merda em vez de estar ao lado de Tatiana naquele momento.

Para ser mais sincero ainda, eu não acreditava que estava na porra de um evento, beneficente apenas em teoria, que servia apenas de fachada para minha cunhada arrecadar dinheiro para o financiamento da campanha eleitoral de 2024.

Enquanto o bolso de Alice engordava à custa de uma suposta doação para ONGs que cuidavam de crianças em situação de vulnerabilidade, eu enchia o rabo de champanhe para não ter de aguentar aquilo em estado de sobriedade.

Não parava de pensar no quanto eu odiava a situação por completo, no quanto eu a odiava porque me privou de estar com Tatiana. Não poder estar lá para ajudá-la como pudesse me deixou com um mau humor irremediável. E ruminando pensamentos.

A ideia de ter a deixado dormindo, tão indefesa, naquele contexto, me pareceu tão péssima que me culpei. Eu devia ter dado uma desculpa qualquer para minha ausência naquela desgraça de evento. Ela devia ter sido minha prioridade naquela ocasião.

Essa e outras culpas envolvendo a mulher que deixei para trás me tiravam o sossego. Apesar de estar parado, com um semblante calmo, bebendo meu champanhe tranquilamente, estava absorto em pensamentos, com a mente agitada como uma antítese do corpo.

Então, do nada, algo aconteceu. Minha sobrinha mais nova puxou minha mão. E não parou de puxar apesar do quão alheio à realidade eu estava. Sua insistência me tirou um pouco daquele looping de frustrações.

— Que foi, Kira? O tio não tá afim de brincar hoje — falei com o máximo de gentileza que consegui para não assustar a menina de apenas 3 anos de idade.

Ela levantou os bracinhos e eu entendi o recado. Coloquei minha taça na mesa e peguei-a no colo sem mais delongas. Comecei a agitá-la como se ela ainda fosse um bebê de colo, sabia que ela adorava, e, em resposta, sua risada inundou meus ouvidos.

Sua alegria, tão genuína e recompensadora, aliviou um pouco do peso dos pensamentos que eu revisitara na última hora.

— Vejo que arranjou uma dama pra ter nos braços já que a sua não deu as caras — comentou Yutaka, chegando perto de mim e afagando a cabeça da própria filha.

— O comediante chegou — anunciei. — Se eu soubesse que era noite de stand-up, teria vindo a caráter.

— Quanto ressentimento! Pisei no calo, foi? — Fez-se de desentendido, entregando tudo no fingimento. Clássico.

— Quer saber de uma? Pisou sim. Minha namorada tá mal pra caralho e não pôde vir hoje, daí cê fica me dando piada e ainda quer que eu esteja de bom humor? Não acha que é pedir demais?

— O que houve? — Saiu do modo "deboche escancarado" para uma expressão de preocupação realista.

Tive de pensar rápido em uma desculpa. Como vivia acelerado e rapidez de pensamento era meu forte, eu a encontrei.

— Passei na casa dela antes de vir, pra ver se ela já tava pronta, e ela tava vomitando igual uma condenada — contei, com certo pesar.

Os olhos de Yutaka se arregalaram.

— Vomitando?! Cuidado, irmão! — advertiu. — A primeira vez que Alice começou a vomitar sem dar descanso nós tivemos de nos casar às pressas antes de a barriga aparecer. Fique esperto. Não vá meter boneco na mulher a essa altura.

— Tá doido? Vira essa boca pra lá — repreendi-o. — Deve ser só uma virose.

— Torço pra que seja. Você se sairia um péssimo pai.

— Nem precisa me dizer. Eu sei disso. Como pai, eu sou um ótimo tio, não é mesmo, Kira? — dirigi-me à minha sobrinha. Ela jogou os braços e envolveu meu pescoço, abraçando-me, provando meu ponto. — Tá vendo? Até sua filha concorda.

— Por via das dúvidas, faça um teste de farmácia. É fácil e rápido. Te poupa a dor de cabeça.

— Pode deixar, irmãozinho, eu me resolvo com ela. O mais importante pra mim é a saúde dela. — E não mentia. Estava mais preocupado com a integridade de Tatiana do que com qualquer outra coisa.

— Uau! O grande Yudi Takahashi ligando pra alguém além dele mesmo? — provocou-me. — Essa mulher deve ter feito amarração pra conseguir um feito desses.

— "Essa mulher" tem nome e sobrenome. E não fez porra nenhuma nem pra me amarrar nem pra merecer o tratamento de desconfiança da sua parte.

— Calma, garanhão! Não tá mais aqui quem falou. Vou acreditar na sua palavra. Até porque sei que você tá falando sério.

— Ah, é? Como tem tanta certeza?

— Você tá bêbado. Sempre exagera na sinceridade quando fica bêbado ou tá drogado.

— Nada a ver. Só bebi um pouco mais do que o aceitável. — Eu estava muito longe do estado de embriaguez completa no qual eu seria capaz de estragar o clima de qualquer evento em família com apenas uma frase.

— Os garçons que te serviram que o digam — cuspiu. — Te vi com meus próprios olhos, de longe, esse tempo todo. Não venha me dizer que esquecer da educação que recebeu e ser deselegante ao ponto de pegar duas taças de vez não é sinal de embriaguez.

— Pense o que quiser. Eu tenho certeza de que ainda tô lúcido.

— Se quiser mentir pra si mesmo, problema seu. Mas a mim você não engana. Muito menos é capaz de me fazer cair nessa distração. Não irá desviar meu foco do assunto principal.

De que caralhos ele tá falando? Eu realmente não fazia a mínima ideia.

— Além de bêbado eu sou um engambelador? Porra, tô mal no seu conceito...

— Nem tente negar. Você ama e se importa com a tal da Tatiana. E não quer admitir isso.

Então era isso? Só isso? Ele só podia estar brincando. Atazanou-me tanto para terminar soltando uma dessas? Que seja.

— Tá bem. Você me pegou. Sou culpado desse crime — admiti da forma mais verossímil possível. Se era isso que ele queria que eu admitisse, se fosse essa a fala que me livraria dessa perturbação, ele teria. Isso era o de menos. Era fácil. Não era uma completa mentira. Eu me importava. Nisso ele estava correto.

Pela primeira vez, o irmãozinho falou algo que presta (✿◡‿◡)

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Pela primeira vez, o irmãozinho falou algo que presta (✿◡‿◡)

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Luz VermelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora