Capítulo 1

939 58 21
                                    

Perspectiva de Mon

Acordei com o peso familiar do vazio ao meu lado na cama. Fazia oito anos que eu havia perdido Sam. Lembro-me de cada detalhe do dia em que tudo aconteceu, como se fosse ontem. Após nossa lua de mel, ela viajou a trabalho para fora do país. Foi pela televisão, em plena tarde, que descobri que o avião dela havia caído no oceano. Meu coração despedaçou-se naquele instante. Sem corpos para recuperar, a única coisa que me restava era visitar uma campa vazia, ao lado do túmulo de sua avó, a quem ela tanto amava. E todos os anos, na mesma data, vou até lá para sentir, ao menos por um instante, que ainda estamos conectadas.

Levantei-me, fiz minha higiene e vesti uma blusa preta e calças escuras. Tinha que ir preparada para aquele ritual doloroso. Desci e preparei o café da manhã, deixando o ambiente da cozinha o mais acolhedor possível. Essa casa era a nossa, e mesmo depois de tanto tempo, cada canto me traz um pedacinho dela. Sinto que nunca a deixei partir totalmente.

Logo Chai desceu as escadas, ainda sonolento, espreguiçando-se com aquele jeito tranquilo.

— Bom dia, mamãe. — Ele me cumprimentou com a doçura de sempre.

— Bom dia, Chai. — Sorri, tentando disfarçar a tristeza. — Dormiu bem?

— Dormi, mãe.

Sentamo-nos para comer, até que a porta se abriu e a visita habitual das manhãs entrou.

— Bom dia! — Liz sorriu para nós.

— Bom dia, Liz. — Respondi, mantendo o sorriso.

Ela se aproximou, dando um beijo na testa de Chai antes de se inclinar para me dar um selinho.

— Bom dia, meu amor. — Ela sussurrou, carinhosa.

Ela olhou para mim, lendo a dor em meu rosto.

— Vai ao cemitério hoje? — perguntou, num tom compreensivo.

Assenti com a cabeça, sem conseguir esconder o peso daquele momento.

— Quer que eu leve o Chai para a escola? — ofereceu, gentil.

Olhei para meu filho, que me deu um sorriso esperançoso.

— Acho que ele adoraria. — respondi, grata.

Enquanto Chai seguia com Liz, ganhei um tempo precioso para cumprir meu ritual anual antes de ir para a Diversity. Conheci Liz há quase dois anos, durante uma viagem à praia que fiz com Chai. Ela trabalhava no hotel onde ficamos, e rapidamente nos conectamos. Liz foi a primeira pessoa com quem consegui falar abertamente desde a morte de Sam. Começamos a trocar mensagens e, em pouco tempo, ela me visitava regularmente, levando-me para jantares e momentos de leveza que eu não sabia que precisava.

Uma noite, após um jantar, ela me beijou. Meu reflexo foi lhe dar o maior tapa que já dei em alguém. Como poderia? Meu coração já tinha dona, mesmo que a dona não estivesse mais aqui. Depois, mais calma, expliquei a ela que eu ainda pertencia a Sam. Liz respeitou meus sentimentos, mantendo uma distância sutil, até que um dia, quando jantou em nossa casa, vi o quanto Chai gostava dela. Naquela noite, fui eu quem a beijou. Desde então, temos caminhado juntas, mas sei que ela entende que o amor por Sam ainda está vivo em mim.

No cemitério, cheguei até o túmulo vazio de Sam. Comprei rosas vermelhas no caminho; era a nossa flor, o símbolo do nosso amor e da paixão. Sentei-me junto à campa, acariciando a pedra fria, esquecendo, por um segundo, que o espaço estava vazio.

— Bom dia, Khun Sam. — murmurei, as lágrimas escondidas atrás dos óculos de sol. — Oito anos, meu amor. Oito anos sem você... Desculpe por só conseguir vir uma vez por ano. É tão doloroso. Quero que saiba que o Chai está lindo, crescendo rápido. Ele já me passa dos ombros, e você não faz ideia de como sentimos sua falta. Às vezes, fico com raiva, com saudade... Sei que não foi sua culpa, mas eu ainda sinto sua partida. — Respirei fundo, sentindo o frio da manhã. — Sei que você vê tudo aí do céu, mas precisava te contar. Liz está comigo faz quase dois anos agora. Não se preocupe, meu amor, ela não ocupa seu lugar, ela sabe que isso é impossível. Mas eu estava muito só... perdoa-me por isso. Sei que, de onde você está, deve resmungar toda vez que me vê com ela. E isso me dói.

Mon & Sam - Viúva Por EnganoOnde histórias criam vida. Descubra agora