Capítulo 18. Conflitos à Mesa

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O refeitório era um espaço vasto e impessoal, iluminado por lâmpadas artificiais que projetavam uma luz fria sobre as mesas de metal alinhadas geometricamente. Doze competidores de cada célula ocupavam seus lugares em mesas separadas, formando pequenos feudos dentro de um ambiente já carregado de tensões. O silêncio inicial era interrompido apenas pelo som metálico dos talheres e o murmúrio distante de conversas que começavam a se formar.

No centro da mesa dos Conservadores, Saulo estava pensativo. Ele era um jovem de porte firme, com olhos profundos que pareciam observar mais do que falar. Seus companheiros discutiam fervorosamente sobre como preservar os valores tradicionais durante os desafios, exaltando a importância da disciplina e da ordem.

"Não podemos ceder ao caos", dizia um dos conservadores mais velhos. "Nossa estratégia deve ser metódica, como sempre."

Saulo não dizia nada. Sua mente vagava, observando os outros grupos e tentando entender o propósito daquele embate. Seria isso realmente a solução para um novo mundo?, ele pensava.

Na mesa dos Liberais, Marcos liderava o debate. Ele era jovem, com um olhar brilhante e um sorriso que exalava autoconfiança. Usava suas mãos enquanto falava, quase como se estivesse em um palanque.

"Precisamos ser rápidos e inovadores. Não adianta nos prendermos ao passado. Quem se adapta vence. Se eles forem previsíveis, vamos esmagá-los."

Seus companheiros aplaudiam suas ideias, animados pela energia contagiante de Marcos. Mas, por dentro, ele se perguntava se aquela confiança que exibia era genuína. Enquanto seus olhos percorriam o refeitório, encontraram os de Saulo. Algo nos dois parecia ressoar, mas Marcos desviou o olhar, retornando ao debate.

Na mesa dos Comunistas, Débora era a figura central. Seu tom era mais grave, quase áspero, enquanto defendia a coletividade e a união como armas essenciais.

"Os outros grupos estão divididos entre interesses pessoais. Isso é nossa vantagem. Agimos como um só corpo. A vitória do grupo é a vitória de todos."

Os outros assentiram com entusiasmo, mas Débora notava o cansaço nos olhos de seus companheiros. Em silêncio, ela se perguntava se aquela retórica seria suficiente para superar o que estava por vir. Seus olhos se cruzaram brevemente com os de Marcos, e ela percebeu a mesma inquietação.

Na mesa dos Capitalistas, Jônatas mantinha um tom pragmático, quase cínico. Ele observava os pratos de comida como se fossem recursos a serem administrados.

"O que importa é eficiência. Não vamos perder tempo com sentimentalismos. Nosso foco deve ser nas recompensas. Se for necessário sacrificar alguém para avançarmos, que assim seja."

Suas palavras causaram uma mistura de risadas e olhares de aprovação em sua célula, mas por dentro, Jônatas se sentia desconectado. Ele sabia que não era tão frio quanto gostava de aparentar. Observou Débora por um momento e se perguntou se o discurso dela de união tinha algum mérito.

Na mesa dos Laicos, Rose permanecia em silêncio enquanto seus companheiros discutiam o uso estratégico da neutralidade e da lógica pura.

"Não precisamos de crenças ou ideologias para vencer", dizia um deles. "Somos racionais. Isso basta."

Rose, entretanto, sentia-se deslocada. Não porque não acreditasse na lógica, mas porque as conversas pareciam superficiais, sem profundidade. Ela olhou ao redor, percebendo os rostos pensativos de Saulo e Marcos. Talvez não fosse a única a questionar o propósito de tudo aquilo.

Por fim, na mesa dos Ricos, Victor ria alto enquanto seus companheiros exaltavam seus privilégios.

"Temos os melhores recursos, as melhores ferramentas. Isso nos torna invencíveis."

Victor não os corrigiu, mas tampouco compartilhava da arrogância deles. Ele sabia que recursos não substituíam habilidade ou propósito. Seus olhos encontraram os de Rose por um momento. Ambos desviaram rapidamente, mas a dúvida parecia pairar entre eles.

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O Debate Escala

As conversas individuais logo se transformaram em um debate generalizado. Um dos conservadores provocou os liberais:

"Vocês falam de adaptação, mas não têm estrutura. Vão se perder na própria inconstância."

Marcos rebateu, rindo. "Estrutura? Como a sua, que se quebra ao menor sinal de mudança? É como construir um castelo na areia."

Débora interveio, com um tom de desprezo. "Ambos estão cegos. Seus interesses individuais vão destruí-los. O futuro pertence a quem se sacrifica pelo todo."

Jônatas deu uma risada curta. "Sacrifício? Isso só leva ao fracasso. Quem vence é quem está disposto a fazer escolhas difíceis, não quem quer dividir o prêmio com todos."

Os laicos, antes neutros, começaram a responder, defendendo sua visão lógica. Victor, dos ricos, apenas observava com um leve sorriso, mas finalmente comentou: "Enquanto vocês brigam, continuaremos a usar nossas vantagens. Não importa quem está certo, mas quem está preparado."

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No meio do caos verbal, os competidores de cada célula - Saulo, Marcos, Débora, Jônatas, Rose e Victor - permaneciam em silêncio. Observavam os outros discutirem, sentindo uma inquietação comum.

Saulo pensava: "Será que essas disputas realmente vão levar a um novo mundo? Parece que estamos apenas recriando os mesmos erros."

Marcos, em silêncio, concordava internamente. "Toda essa retórica, mas onde está o verdadeiro progresso? Será que há outro caminho?"

Débora, tão convicta em suas palavras, tinha dúvidas: "Essa competição só alimenta divisões. Será que estamos nos afastando do que realmente importa?"

Jônatas, por trás de sua fachada pragmática, questionava: "Se só vencermos uns aos outros, o que realmente ganhamos? Isso é progresso?"

Rose olhava para os outros e sentia uma desconexão: "Eles falam tanto, mas tudo soa vazio. Será que é nisso que devo acreditar?"

Victor, o mais indiferente, também ponderava: "Todo esse esforço por poder... mas qual é o propósito disso?"

Apesar de não trocarem palavras, uma conexão silenciosa parecia uni-los. Eles ainda não se conheciam, mas compartilhavam o mesmo sentimento: a dúvida sobre o caminho que estavam trilhando e a busca por algo maior, algo diferente do conflito vazio que testemunhavam.

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