Capítulo 2

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Após longos sete anos, trancada naquele lugar, minha mãe passou a vez ou outra descer, para conferir se eu estava viva, mas sempre que me via, dizia palavras maldosas e se escondia novamente.

Naqueles dias, eu já conhecia e praticava algo conhecido como "automutilação". Não me orgulho de usar meu corpo dessa forma, mas a sensação do sangue entre meus dedos, ou da pele se rasgando, sempre me encheu de anseio por mais.

Era inexplicavelmente satisfatório ferir algo, mesmo que fosse a mim mesma.

Lembro-me de, certa vez, apreciar um caco de vidro ensanguentado, e ouvir sussurros de mina própria mente que me incentivavam a passar aquilo por meu pescoço.

Após fazê-lo, me deitei no chão perguntando as vozes em minha mente se eu morreria, e o que eu encontraria em seguida. Mas toda a resposta que recebi, foi o silêncio.

Esperei ansiosa pela chegada da morte, mas mesmo depois de todo o sangue derramado, ela não veio.

Gradualmente minha inocência foi dando lugar aos sentimentos mais repugnantes que conheço até hoje.

Estar sempre ali naquela escuridão, me dava a sensação de que a cada instante, ela me consumia e me transformava em um ser tão amedrontador e misterioso, quanto ela.

Infelizmente, essa situação se estendeu por muito tempo, piorando em algum momento dos meus onze anos, quando Kate decidiu me visitar diariamente.

Eu me mantinha afastada pelo medo de tudo que ela já havia feito contra mim, mas no fim sempre aceitava as refeições que ela me entregava. Nem era por sentir fome, apenas para tentar uma aproximação.

Em tudo aquilo que ela me oferecia como "a comida da mamãe", eu era presenteada com um tempero especial, chamado "veneno", que sequer demonstrava qualquer efeito sobre mim.

***

Em determinado dia, ouvi um choro estridente que parecia vir da floresta, o som era tão alto, capaz de se propagar até mesmo no porão.

Não era o choro de um humano, e sim de um pequeno cachorrinho que, estranhamente, foi acolhido por Kate.

Ela passava o dia com ele nos andares superiores, mas o deixava comigo durante a noite.

Eu mal me continha de felicidade quando ouvia aquelas patinhas descerem as escadas até mim, com seus pelinhos macios, e o rabinho dançante. Eu o amava, e amava o quanto ele conseguia me alegrar, sequer dormia em sua companhia.


Continua....


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