Capítulo 31

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<Atualizado>

Saí depressa de dentro da casa, quase que correndo em direção ao lago.

Aquela seria uma vista agradável à qual eu me permitiria observar por horas, se não fosse ao mesmo tempo, tão macabro.

O sol estava se pondo. Refletido suavemente sobre as águas que dançavam lentamente, em harmonia com o vento.

O túmulo de Derick entrava em contraste com o lago, por conta da terra recentemente mexida.

Fiquei à beira do lago, observando seu interior. As águas pareciam tão puras, que era quase impossível pensar que poderia significar algo tão cruel.

Com o crescente desespero por respostas me servindo como impulso, me joguei em seu interior.

Mesmo que observando de fora ele parecesse intocado e límpido, lá dentro eu não conseguia ver nada, e como o movimento das águas causava sérios incômodos, fechei os olhos e passei a tentar tatear algo que pudesse estar ali.

Depois de poucos segundos, a água que antes estivera gelada, passara a esquentar tanto que parecia prestes a borbulhar.

Sentindo minha pele ser queimada nadei para a superfície, e ainda com os olhos fechados me deitei na grama.

- Não imaginei encontra-la tão cedo, querida.

Todo o meu corpo paralisou ao ouvir aquela voz. Lentamente abri meus olhos, e me deparei com Abalam e sua aparência assustadora.

O choque foi tão grande que não consegui dizer ou fazer nada.

- Mas que indelicadeza de minha parte. - Ele disse me segurando com suas mãos horrendas de textura desagradável, e me forçando a ficar de pé. - Permita- me lhe oferecer algo para se sentar.

Uma criatura emergiu do lago. Sua pele parecia ter sido arrancada a poucos instantes, e o seu sofrimento era tamanho, que se arrastava lentamente, mal suportando o próprio peso.

Essa criatura se encolheu às minhas costas, e Abalam me sentou brutalmente, permanecendo com as mãos apoiadas sobre meus ombros, me impedindo de levantar.

O ser que me servia de assento, gemia baixinho de dor, e eu sentia a pulsação quente e desesperada de seu corpo ao toque do meu.

- Não dê tanta atenção à  esse maldito minha querida, quero que observe o mundo diante de seus olhos.- Abalam sussurrou em meu ouvido, segurando meu rosto, e me fazendo olhar à frente.

A floresta estava em chamas, e repleta de criaturas iguais as em que eu me sentava. O lago estava escuro como o sangue de mil demônios, e o ambiente era tão perturbador, que até a mente mais temível, clamaria por perdão e paz.

- Eu quero acordar... - Sussurrei enquanto uma lágrima escorria por meu rosto ao observar criaturas ainda mais horrendas , que rodeavam minha antiga casa, como se esperassem o momento certo de entrar.

- Você não está sonhando criança, apenas veio visitar a casa do papai.

Olhei chocada para o mesmo, que teve o rosto partido ao meio por um sorriso assustadoramente grande.

- Um dia,- Ele me forçou a olhar outra vez. - estará corrompida o suficiente para apreciar a beleza do inferno.

Mais lágrimas quentes escorriam enquanto o horror daquele lugar me consumia, e me fazia desejar correr, gritar, morrer.

- Por que isso acontece comigo? - Indaguei quase inconscientemente.

- Você é uma garota muito especial July. Você tem uma missão na terra, um destino... você precisa matar.

- Por que eu?

- Um dia você vai conseguir entender isso minha pequena. - Enquanto dizia isso, Abalam acariciou uma de minha bochechas.

Senti todo o meu corpo se contrair em protesto, e vomitei um tipo de massa escura.

Ele apenas sorriu, e então desapareceu como uma fumaça negra, me abandonando naquele lugar, onde mais criaturas se aproximavam e me observavam.

Nenhuma se aproximava o suficiente para me tocar, e ainda assim, sequer desviavam os olhares dos meus. Aquilo aumentava o meu medo e desespero.

De todas as coisas possíveis que poderiam me acontecer após entrar naquele lago, aquilo era o que eu jamais havia cogitado, mas ali, rodeada por tanto mal e sofrimento, por tantos gritos e sussurros ao longe, parecia a resposta mais óbvia possível.

Poderia dizer que passei horas naquele lugar, ou até mesmo dias. O fato é que permaneci paralisada, sentada sobre a criatura ferida e chorosa, que parecia sussurrar preces, enquanto eu contemplava cada canto de horror daquele lugar.

- Ora, ainda está aqui. - Abalam apareceu gargalhando depois de sei lá quanto tempo. - Nós precisamos de você na terra meu pequeno diabinho...

Após ouvir isso, fui jogada outra vez ao lago e acolhida pela água fervente, que pouco apouco se tornou fria.

Desesperada me apoiei na grama e com muito esforço, consegui sair de dentro daquelas águas malditas.

Com a respiração ofegante,fiquei fitando o céu que ainda projetava o  pôr do sol, só que agora, eu o observara com muito mais admiração, e gratidão.


Continua....

A Filha do DiaboOnde histórias criam vida. Descubra agora