Capítulo 29

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Ansiedade. Razão faltava à mente agitada da princesa. Não se concentrava em nada que não tivesse relação direta com aquele torneio. Seu pai não conseguia decidir-se pela data do início da disputa. A tortura se prolongava a cada refeição. Seguia aborrecida rumo o fim do jantar daquela noite.

— Atenção! — disse o rei. Limpou a garganta e continuou o seu pronunciamento solene. — Gostaria de anunciar a todos nesta corte que decidi a data do início da disputa.

— Decidiu? — ela não controlou a voz que saiu alta demais. Engasgou-se com a carne que tentava engolir. Lágrimas de sufoco surgiram em suas órbitas oculares.

— Sim, filha — Olhou de soslaio desaprovando. — Todos sabem que meu antigo chefe da guarda morreu não faz muito tempo por causa de um mal que o abatia há muitos anos. Os magos consultados não foram capazes de curá-lo. Um brinde ao meu bom e velho amigo, Thaegan! O maior guerreiro que esse mundo já viu! — Apesar do exagero que ia por conta da amizade, todos brindaram. — Declaro oficialmente que a data será no dia em que os três sóis do Daran estiverem alinhados.

Houve uma manifestação com murmúrios surpresos e embaralhados diante da grande mesa. Ninguém duvidava que a Guarda de Montherran precisava ser a mais bem preparada de todo o Daran. Todos sabiam que havia a necessidade de manterem a imagem de ser o Reino com o maior e melhor exército entre os da raça humana. Porém, eles também sabiam que a cada década, havia um alinhamento solar e os três sóis ficavam por uma hora brilhando como se fossem explodir em uma imensa bola de fogo. Ficar exposto ao alinhamento não era uma coisa muito inteligente e exigiria uma força e determinação tão grande, que fosse impossível aos pretendentes passarem pela primeira prova. Na última vez que o fenômeno ocorreu, tudo o que conseguia andar, se arrastar ou voar procurou um abrigo. Algumas pessoas morreram de insolação. Era perigoso estar exposto àquele calor. Ninguém suportaria muito tempo sem desmaiar e em seguida morrer, se o socorro demorasse.

— Alteza, acha mesmo que essa data é a mais propícia? — perguntou Etheus, o Primeiro Mandante do rei. Era um homem baixo, careca e atarracado. Kilayra não conseguia deixar de pensar nele como uma espécie de rato gigante. Acreditava que os dentes da frente, afastados e alongados, facilitavam a imagem surgir em sua mente. — Isso acabará com todos os pretendentes ao cargo na primeira hora da disputa — continuava o homem em sua aparência de roedor gigante, alheio aos pensamentos da princesa.

— Tenho certeza disso! É uma oportunidade única de que a própria natureza exclua os mais fracos. E se todos eles sucumbirem, faremos uma nova etapa de inscrição. Assunto encerrado e data marcada!

— Majestade, o dia está decidido, mas e quanto ao horário? — perguntou outro componente da corte, com sua careca reluzente e sua barriga gorda trepidando, quase que saltando para cima da mesa pesada de madeira. Nem o rei seria tão audacioso a ponto de marcar o início para a metade do dia, por tratar-se do horário de maior perigo à exposição.

— Será ao meio dia. Achei que isso havia ficado implícito.

Kilayra agora tinha mais uma preocupação, suportar o calor. Venceria, mas é claro que a data que seu pai escolheu não facilitava-lhe em nada a vida. Sendo mulher, sua constituição física era mais frágil que a dos homens imensos com os quais teria que lutar, mas nada que um pouco de inteligência não resolvesse. Ela venceria esse obstáculo. A data estava marcada. Já era uma coisa que haveria de acalmá-la. Venceria, custe o que custar!

Na manhã seguinte saiu para cavalgar e contar as novidades para a bruxa, sua parceira e amiga. Talvez com sua experiência ela encontrasse alguma coisa que a ajudasse a permanecer hidratada durante a exposição ao calor daquele evento.

A Senhora do Caos - A Viajante e o DragãoOnde histórias criam vida. Descubra agora