"Eu tenho medo"

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Depois de olhar por um certo tempo aquela arma em minhas mãos, Nick amarra uma lata no tronco de uma árvore à um certa distância de mim. Quando se aproxima, fala:
- Preparada? - olho pra ele e depois retomo o olhar fixo em David que está sentado na grama verde.
Ele me dá dicas de postura, que a melhor maneira de segurar numa pistola é com as duas mãos, ainda mais se você for uma iniciante. Entre alguns momentos de concentração, Nick me declarou:
- Quando minha filha crescesse, eu iria trazer ela aqui. Assim como meu pai fez comigo nos grandes campos do interior onde eu morava. Mas, isso nunca vai acontecer... por isso que te trouxe aqui... - no seu olhar eu podia notar um afeto fraternal por mim - Mãos firmes, se prepare para a força da arma em suas mãos. E, agora...
POW!
Nick acerta à lata que se desprende da árvore. Ele vai até lá amarrar novamente. Enquanto isso, eu sento ao lado de David:
- Você está bem? - tento ser sutil.
- Sim. Mas, eu resolvi tomar coragem e vou te dizer o que tenho que dizer. Quando você terminar...
Concordo com a cabeça e retomo minha posição.
Seguro bem a pistola, tento mirar na lata. Até aí tudo parecia bem. Aperto o gatilho.
POW!
Nem se quer sinal de raspão na lata. Tento mais duas vezes e nada.
- Não se preocupe Constance, tudo isso é questão de prática - Nick tenta me ajudar.
Depois de recarregar a arma eu tento mais uma vez.
POW!
Em cheio!
A lata cai e a minha vontade é pular de alegria, mas ainda estou com uma arma nas mãos. Nick e David me parabenizam. Eu sorrio, como a muito tempo não dou um sorriso daqueles.
Quando voltamos para casa, eu e David agradecemos Nick pelo dia e seguimos um caminho diferente do dele. Subimos na árvore da praça, no mesmo lugar onde sempre conversamos.
David, não tão trêmulo quanto a última vez, começa:
- Constance, eu tenho medo!
- Todos temos! - ressalto.
- Mas, eu tenho medo de algo específico. Algo tão bobo que você acharia que é piada - fiquei com medo agora.
- E o que seria?
- Eu tenho filemafobia, eu tenho medo de beijar! - ele olha pro chão para não ter que ver minha reação.
Jogo as cartas na mesa:
- Então é por isso que nunca me beijou? - P.S: não estou sendo irônica...
Ele me olha pálido.
- Hann.. eu... foi mal... - agora ele está vermelho de vergonha.
Tento levar aquilo como uma bobagem ou algo da cabeça de David.
Então, eu tomo a iniciativa e parto pra cima dele rumo à sua boca. Ele, apavorado desvia e segura firme no tronco para não cair.
- Qualé? Que vácuo foi esse? - eu não fico satisfeita.
- Desculpa, mas não dá, ok? Isso é uma fobia grave. Nem meus pais não sabiam... - ele pula da árvore e sem se despedir vai correndo até o instituto. E eu, trouxa como sempre, fico ali sentada esperando que o vento me beije. Jumenta! Estúpida! Não, pera, ele que é o jumento e estúpido.
Fico ali até que o anoitecer venha me dá boa noite.

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