Mais perto

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A cada dia que se passava eu me sentia cada vez mais próxima e íntima de David. Ele me trazia paz, mas ao mesmo tempo me deixava insegura. Eu não sabia dos seus segredos, não sabia dos seus pensamentos nem das suas intenções por trás de seus olhos. Será que eu podia confiar nele? Pelo sim ou pelo não eu decidi esperar, pelo menos um pouco mais. Numa manhã nublada em que não houve aula - devido ao feriado regional - eu e David saímos rumo ao porto da cidade. Particularmente um lugar belíssimo, mas que os habitantes não tem a mesma noção com o "corre-corre" do dia-a-dia.

- Até parece de mentira! - exclamou David fascinado.

- Nunca veio pra esse lado da cidade? - perguntei curiosa

- Não que eu me lembre. Quando meus pais eram vivos eu viajava por vários lugares próximos e outros bem distantes daqui. Mas, eles viviam brigando ou discutindo sobre negócios e eu nunca prestava atenção na paisagem. - explicou.

- Perdi a conta de quantas vezes vim aqui. - declarei.

- Sabe - começou David - eu me pergunto se tudo o que aconteceu comigo até aqui me fez bem ou não.

- Não entendi - falei confusa.

- Você! - ele me olhou de maneira sóbria.

- M...mas eu? Com... não entendi de novo! - gelei.

- Eu preciso te contar uma coisa - falou David decidido. Ele parecia tremer e estar controlando o nervosismo que rondava sua expressão no rosto.

- Estou te ouvindo - ainda estava trêmula.

- Eu...é...eu te... - tentou mas nada saiu.

Algo o atrapalhou. Um som muito alto.

Uma senhora de idade tinha sido atropelada e aparentemente sua perna esquerda quebrou. Me aproximei um pouco e o horror tomou conta de mim - os estilhaços de vidro do carro atingiram em cheio sua face que ficou assustadora. Minha reação foi dar três passos para trás e cravar as mãos sobre a cara numa tentativa de segurar as lágrimas que já ameaçaram rolar sobre minha pele.

David também presenciou a cena e logo veio me confortar daquela recente e terrível imagem. Encostei a cabeça sobre seu peito e tentei controlar o medo. Ele me acolheu em seus longos braços e me falou:

- Acalme-se, vai passar...tente esquecer o que viu! - aquilo soou quase como uma ordem.

David era jovem, mas tinha muita maturidade - se bobear mais que eu - e eu gostava disso, pelo menos me deixava segura.

O motorista era familiar, mas que eu não conhecia a não ser de vista. Sua expressão era de desespero, como se ele não soubesse se fugia ou se caia ali mesmo em prantos. Ele se escorou no carro e levou as mãos na cara de maneira súbita.

Naquele momento não sabia se ele era ou não culpado de tudo aquilo. David interrompeu meus pensamentos:

- Vamos sair daqui, já é o bastante ver tudo isso... - ele me puxou para longe dali.

Cheguei em casa e nem me despedi de David. Tudo o que eu pude fazer ao retornar foi me jogar na cama e chorar. David tinha algo pra me contar, mas com tudo o que aconteceu eu apenas respirei fundo e dormi.


Fogo e SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora