Amantes das árvores

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O fato de David Blasst chegar ao instituto gerou certa tensão em casa. Seu nome era mencionado a cada 2 minutos e eu ficava cada vez mais curiosa para conhecer o tal Blasst. No dia seguinte eu peguei minha "bike" roxa e fui até o instituto. E então:

- Não era pra você estar na escola? - disse mamãe

- Sim, mas vim aqui antes pra ver se vocês precisavam de uma "mãozinha".

Quando andei um pouco vi um garoto embaixo do pé de macieira no pátio da instituição.

- Você que é o David... Blasst?

- Só Dave agora, por favor... não quero relembrar o sobrenome que um dia eu tive, mas perdi junto aquele acidente de avião. - resmungou ele.

- Além de órfão você gosta de poemas?

- Qual o problema dos poemas?

- Só não gosto de "lenga-lenga"!

- Que desgosto ouvir você falando assim de algo tão bonito. - David continuou.

- Já chega, ouvi o bastante!

Quando me virei, David agarrou meu braço e sussurrou no meu ouvido:

- Poema transforma, até os corações mais indomáveis.

Suas palavras soaram como se eu estivesse sonhando e ele queria me despertar antes que o pesadelo batesse em minha porta. Imediatamente eu puxei meu braço bruscamente e olhei fixamente nos seus olhos castanhos claros. Corri para minha bicicleta e pedalei até a escola, cheguei suada e ofegante.

David tem cabelo preto, mas não por muito tempo. Agora eu não conseguia olhar para ele com pena, e sim com... um olhar diferente. Naquela manhã tudo o que vinha na minha mente era sobre aquele poeta de olhos castanhos. Na aula de matemática eu pensava na soma de "David+Blasst", na aula de português eu soletrava o sobrenome "Blasst".

Não podia imaginar estar apaixonada por ele. Pensava que amor à primeira vista era só em filme ou músicas. Eu sempre namorei com rapazes mais velhos, 7 no total. O primeiro me deu um fora e os outros eu que dei. Nunca me apaixonei, os relacionamentos acontecem de maneira similar aos dos filmes de "patricinha". Acho que é isso que eu sou de verdade, uma patricinha quase assumida.

A aula passou tão rápido que eu não percebi. Fui pra casa e incrivelmente mamãe estava lá.

- O único homem na minha vida pelo qual me apaixonei foi seu pai, me lembro como se fosse hoje.

- Que papo é esse mãe?

- Eu vi como você saiu da instituição. Aquele Blasst te balançou não foi?

- Oi? - não sabia como falar com minha mãe porquê ela nunca tinha falado comigo daquele jeito. Acho que ela sabia que o amor verdadeiro tinha batido na minha porta, mesmo fora de hora.

- Pode se abrir Tancy...

- "Tá", eu confesso que tive uma reação diferente da esperada.

Não sei o que houve, nunca aconteceu isso comigo.

- Minha "filhinha" está virando uma mulher...

- Mãe eu já sou uma mulher - sorri "meigamente".

- Eu sei... - uma lágrima pingou na calça jeans de mamãe.

Me emocionei junto à ela e abracei.

- Se joga Tancy! - ela riu.

- Vamos ver o que vai dar... - respondi com um sorriso.

À tarde eu fui a instituição novamente. Encontrei David em cima do pé de macieira. Subi com facilidade e começamos:

- Sinto muito pelos seus pais - não sabia como começar.

- Vamos mudar de assunto? Porque saiu daquele jeito? - falou.

- Simplesmente você me pegou de surpresa ao puxar meu braço.

- Sei - resmungou David.

- Então David você...

- Só Dave por favor! É tão difícil assim?

- Okay okay, "Dave", você tem 14 anos? - falei debochadamente.

- Tenho 15 - percebi um pequeno sorriso no canto de sua boca.

- Olha que legal - não consegui conter o sorriso também.

- Gosta de subir em árvores? - Dave perguntou.

- Digamos que elas são minha segunda casa - gargalhei.

Ele fez o mesmo. Tinha um lindo sorriso e dentes branquinhos. Ficamos conversando a tarde inteira e quando percebi já era noite.

- Sabe, eu acho que as árvores são guardiãs - citei - preciso ir.

- Vem amanhã? - perguntou Dave interessado.

- Se puder - tentei não parecer interessada, mas com certeza eu iria.

Fogo e SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora