-Feliz aniversário, tio!!Lara praticamente voa da cadeira dela até meu pescoço. Por mais que pareça uma boneca, ela é muito espoleta, e muito forte também, só que sem perder a graciosidade.
- Parabéns, Luke. Tudo de bom. Quem diria que meu caçula estaria fazendo 18 de ida.
Lino começa, mas é interrompido por um ataque de tosse, leve mas notável.
- Desculpe, só preciso de uma água.
Ele ri e abana a mão, num gesto de descaso. Lino sendo Lino.- Parabéns Lucas.
Ele fala tão pouco que nem reconheci a voz do menino Escobar. Ele deve ter uns 14 anos de ida, e a timidez é forte nele. Suas poucas frases são sempre sussurradas e para dentro. Fico meio sem jeito de falar com ele, somos praticamente estranhos um pro outro.
- Obrigado, hum, Escobar.
Ele acena com a cabeça baixa. Nem sei a cor dos olhos dele, por que nunca nos olhamos nos olhos.
Depois de terminar de comer, D. Nina vem à sala de refeições, me parabeniza e começa a retirar tudo do café da manhã.
Sinto um carinho no braço, e quando me viro vejo que é a mãe. Ela fala baixinho, para que só eu escute.
- Podemos ir lá para cima? Seu pai tem um presente para você.O quê?
- O pai? Como assim? O que é?
- Me ajude, menino, invés de fazer tantas perguntas.Ela sorri.
- Oh, é claro.
Eu a ajudo a se levantar e guio pelas escadas até seu quarto. Ela se senta na cama e me olha por uns segundos. Enquanto isso fico parado à porta, sem saber o que fazer. Depois, ela aponta para uma caixa de veludo preto que está em cima do guarda roupa. É a mesma caixa que peguei para ela quando tive a recaída das crises. O que foi mesmo que ela disse sobre ela...?
- Pode pegar, por favor?Estou ansioso como nunca, meus dedos estão tremendo, e quase deixo a caixa cair.
- Senta aqui, filho. - ela diz, dando palmadinhas na cama, bem ao seu lado. - Queria dizer para ficar calmo, mas até eu estou nervosa. Tem coisas aí que eu nunca vi, e ele nunca falou sobre comigo. Além do mais, é o presente de alguém falecido, seria estranho se não estivesse nervoso.Engulo em seco e concordo com a cabeça. Fico olhando para ela em expectativa, a caixa, em seu terno aveludado, me intimida. Encaro o pequeno objeto por um tempo.
- Abra! - minha mãe ri. - Estava com uma cara de bobo tão engraçada..
Ela ri de novo. Reconfortante, mãe.
- Haha. Vou abrir então.
Meus dedos vão até o fecho dourado, que abre com um clic seco. Por dentro, a caixa é forrada com veludo mais grosso, preto também. Tem um envelope pardo, algumas fotos, um bilhete gasto e alguns item menores, uma chave, um enfeite de geladeira, um convite de casamento e um pote com algo que parece pomada. No centro da caixa, ocupando metade do espaço total, tem uma outra caixa, menor, de papel grosso com fitinhas douradas.
É uma caixa de recordações. O convite tem em letras douradas os nomes Gabriela e Benjamim entrelaçados, deve ser do casamento deles, as fotos mostram nossa família a muito tempo atrás. Pego o bilhete, que parece querer se esfarelar nas minhas mãos. " Quando o tudo quiser virar nada, e o sempre quiser virar nunca, nossos espíritos vão se dar as mãos e então lembraremos um do outro. Nunca se esqueça de mim, anjo.
Do sempre seu, Benji."Uau. Acho que a mãe tem guardado coisas aqui também. É tão difícil acreditar que o mesmo homem sério e silencioso que morava conosco escreveu essas palavras. É difícil até mesmo saber que ele de fato amava minha mãe, por que afeto entre eles não era visto aqui em casa. Fico com vontade de saber mais sobre ele. Talvez agora, com era essa caixa, isso seja possível.
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Antes que o tempo acabe
Science FictionEm um planeta Terra futurista (mas não tanto assim), o jovem Lucas leva a vida sem expectativas, sem o que ele chama de Grande Motivo. Em meio a seus problemas adolescentes, crises existenciais, obrigações e exigências da vida, e a perda de amigos e...