Capítulo 14

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Quando volto para a sala, ele esta sentado bem ereto no sofá, com o olhar perdido. Algo dentro dele se rompeu, algo impossível de restaurar. Quando duas pessoas, sejam mãe e filho, namorado e namorada, irmão e irmã, se acham e se completam, e do nada uma parte se perde, só sobra um pedaço da outra, como migalhas do que era o conjunto completo. Como a brisa frágil que sucede uma grande tempestade. A pessoa vira uma casca.

Sem uma palavra, me sento ao seu lado, também olhando pra frente. Não sei se devo ou não dar o copo de água que está esquentando na minha mão. A impressão que tenho é de que qualquer movimento brusco vá quebrar a "calma" que ele conseguiu formar. Simplesmente fiquei parado, olhando pro vazio e discurindo internamente se era para oferecer ou não a água
E então, para pôr fim ao dilema, ele fala, sem sotaque cantado, sem emoção, a garganta completamente arranhada.

- Essa água é para mim? - Ele ainda não me olha.

- É. Aqui. - Entrego o copo a ele, e ele bebe de uma vez só todo o conteúdo. Estava assustado com sua crise, mas essa calma estranha me inquieta ainda mais. - Quer ir lá pra casa? Juro que ninguém vai te perturbar. Não queria que ficasse aqui sozinho.

Ele demora um pouco para responder. Então, sorri e diz:

- Obrigado, Luke. Por tudo, mas vou ficar aqui mesmo. Tenho umas coisas para fazer. Mande um abraço pro Lino e um beijo para Lara, por mim. Diga que sinto saudades deles, e da sua mãe também.

- Mando sim, mas esse é um outro motivo para ir até lá...vamos, Elísio. Seja lá o que precisa fazer, pode esperar alguns dias.

- Nao dá...mas mande meus cumprimentos a sua família. Obrigado de novo.
- Tem bolo.
- Isso é jogo sujo.

Sorrio. Se eu pudesse congelar esse momento, nós dois sorrindo, como amigos normais.
Ele me abraça e nos despedimos. Em nenhum momento ele aparentou ser o mesmo homem que chorava pela namorada falecida. Saí pela porta da frente e comecei a andar em direção ao carro elétrico de Lino, que ele me emprestou. É um erro deixá-lo aqui sozinho, mas ele ja nao tem mais os pais, e pelo que sei, soi seu único amigo. Tinha a Sofia. De dentro do carro, olho mais uma vez para a figura parada a soleira da porta, acenando para mim. Aceno de volta e mando um "beleza" de polegar positivo, ele retorna. Uma sombra passa pelo seu rosto, mas ele logo fecha a porta, e então eu simplesmente ligo o carro e vou embora.




Antes que o tempo acabeOnde histórias criam vida. Descubra agora