Capítulo 21

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- Bom, esse é do seu pai, ele pediu para dar quando você fosse de maior, mas no seu aniversário de 15 anos estava tendo as crises, então, achei melhor esperar até agora. Lino ganhou uma também, mas do seu pai em pessoa quando fez 15 de ida. Mas eis o meu.

Ela me entrega um pacote do tamanho da minha mão aberta, embrulhado com perfeição milimétrica, do jeito que só uma arquiteta faria. Achei que não ganharia nada dela, na verdade, de ninguém. Meu lado criança dança, louco para abrir o pacote. Mas tenho que manter a pose, claro, por que não sou mais criança.

-Mãe! Não precisava...

Pois é. Até para mim soou inconvincente, e ela parece notar também, por que ri alegremente. Tenho sérias suspeitas de que ela lê mentes.

- Abre logo! Meu Deus.

Ela parece que vai sair voando a qualquer minuto. Nessas horas, não se nota idade, nem doenças, ou Dupla de Trinta, tragédias vivenciadas. Somos só o que somos mesmo, lá por dentro, sem essa casquinha que vai se formando. Nessas horas, sabem, quando viramos crianças de novo.

- Já vai. Nossa, parece até que é você que não sabe o que é!

Por que eu não sei, então estou como ela. Por dentro.

- Claro que sei, mas quero ver sua cara.
- Tá bem...

Rasgo o pacote e dentro de uma caixa prateada onde está escrito meu nome, tem duas coisas, mas claro que reparo primeiro na chave de carro.

- Mãe...

Ela está rindo toda contente, seu rosto está até vermelho, com os olhos arregalados.

- Você gostou? Espera até ver onde essa coisinha encaixa!
- Deve...deixa para lá. Muito obrigado, mãe, adorei. Uau. Nunca teria imaginado... Uau!.... Uau!

Ela gargalha dos muitos 'uau's na mesma frase.

Ia dizer que deve ter sido muito caro, que não precisava e tudo mais, mas ela está tão alegre com o presente, e dinheiro não falta aqui, que resolvo só aproveitar meu brinquedo novo, realmente gostei.

- Mas com juízo, sim?! Se bater o carro, morra, por que se só se machucar eu te mato pelo susto que me deu.

Fico em silêncio, pensando se ela está ou não falando sério. Ela não teria coragem de me matar por bater o carro. Teria?
Ela começa a rir muito.

- É brincadeira, filho. Nossa.. - e mais risadas.

Por fim, relaxo e começo a rir de mim mesmo por pensar nisso.

Rimos e nos abraçamos. Quando ela me solta, seu rosto assume uma expressão carinhosa, com olhos baixos e cabeça um pouco inclinada, como um cachorrinho.

- 18 de ida...Luke, é uma idade muito importante. Conte comigo, sim? Para tudo, meu filho.

Engulo em seco. Por mais carinhoso que seja o modo como foram ditas, essas palavras são sérias. A sensação de que grandes coisas vão acontecer logo, me assusta. Mas de algum modo ao mesmo tempo, também excita. Consigo sentir as batidas do meu coração, o frio na barriga, o formigamento nos dedos e cada parte do meu corpo. Estou completamente alerta e pronto para dar um rumo à minha existência. Hoje, vou descobrir meu Grande Motivo, e já não era sem tempo.

...

Sentado no meu quarto, seguro a caixa dos meus presentes tão intensamente, que os nós dos meus dedos estão brancos e rijos. Deve ser por volta das 11 da manhã, o cheiro de comida já percorre a casa. Quando saí do quarto da mãe com aquelas chaves, Lara deu um grito de entusiasmo e pulou no meu colo. Enquanto descíamos as escadas, ela sussurrou no meu ouvido: " Ajudei a escolher, pegamos o mais legal. Você merece muito tio, vai fazer grandes coisas com ele."
Pequena linda, guarda segredos como ninguém. E então respondi, igualmente sussurrando: "Quer dar uma volta?"

O carro é alto, com amortecedores gigantescos, vidros espelhados, todo preto brilhante, com partículas de prata. O teto abre no meio, e tudo
que não seja transparente possui placas solares imbutidas de maneira disfarçada, abertura para o plugue de energia e um motor...que motor. Com mais cavalos do que se imaginaria, até mesmo para esse, carro. Sistema de válvulas última geração, escapamento bio sustentável, tudo novinho em folha. Os bancos de couro branco dão um ar clássico, assim como o volante automático enfeitado com tachinhas prata. Me sinto o dono do mundo.
No porta luvas ( nunca soube o porquê do nome) , tem um saquinho aromático, mas sou alérgico, então ignoro, e um bilhete. É a letra da mãe.
" Querido Lucas, sei que esse possante é incrível, mas não se esqueça do que veio junto com as chaves, também é importante. Com amor, mamãezinha linda. "
Ela sabia que eu ia esquecer. Com certeza lê mentes.

Antes que o tempo acabeOnde histórias criam vida. Descubra agora