FUGA

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Fuga

Nathaniel

- Senhor? Pode me ouvir? Será que me escuta? Por ser metade anjo, deveria eu, ouvi-lo?

Há anos falo com o Senhor. Mas nunca tive sua resposta. Por que me ignora? Por que me abandonou? Liza era inocente. E agora é tarde.

Ela nunca saberá e eu nunca terei lhe contado toda a verdade daquela noite. Quando nos conhecemos no Penhasco.

Ouça minha prece pai, perdoe-me por mentir.

Iniciei nossa união e fiz tudo errado. Fiz tudo para não perdê-la. Isso faz de mim egoísta?

De que adianta agora? Eu a perdi de qualquer maneira.

Ouça minha prece Pai, perdoe-me por mentir à quem amo.

Eu a salvei de verdade ou o único que ajudei foi a mim mesmo?

Estou sendo punido pela mentira que contei, ou pelas verdades que omiti?
Eu mereço Pai, pois fui um covarde, mais fraco que os homens, incapaz de encarar a verdade, de enfrentar a consequência: a decepção de Liza.
A verdade é que ainda agora ao pensar, um olhar de desapontamento vindo dela, me fere muito mais do que todos esses anos de seu silêncio.

Orei outra vez pedindo respostas aos céus.

Fiquei de pé na areia e voltei a caminhar pela praia cinza. Andava sufocado. Enjaulado.

Liza está morta. E eu vivo. Por que? Por que estou condenado a esse sofrimento? Não sabia por quantos anos ainda viveria, eu poderia durar séculos e mais séculos, e não desejava mais nenhum segundo de vida. O rosto de Liza era um plano de fundos em meus pensamentos.

Por diversas vezes, a sentia tão viva dentro de mim, que se tornava quase impossível acreditar que não estava mais entre nós.

Se eu me concentrasse o bastante, podia ouvir seus batimentos cardíacos. Os meus, sempre aceleravam quando o fazia.

Deixei o corpo cair sentado perto de um tronco e enterrei o rosto nas mãos.

Afinal, acho que aquele ditado é verdade. A esperança, é a última a morrer.

Passei os últimos dias contando pesadelos. Não sei há quanto tempo estou aqui. Mas se estiver correto, e as alucinações vierem uma por dia, já se passaram trinta, ou mais.

Estou perdendo as contas. Sinto-me cada vez mais fraco.

Tentei me afogar nos primeiros dias, sabia que seria inútil, mas sempre que as ondas me cobriam, o rosto de Liza aparecia. Eu a via sorrindo para mim, na água. E repetia o ato somente para ver seu rosto outra vez.

Diversas vezes ouvi sua voz, escutei sua risada. Cheguei a vê-la de costas, perto das pedras. Quando eu me aproximava, ela desaparecia.

Fechei os olhos e respirei fundo. Inalei a névoa venenosa da praia e ergui as pálpebras.

Não posso ceder ao desespero. Encontrarei uma forma de sair daqui.

O vento soprou meus cabelos com força e olhei ao redor. Isso nunca acontecia. O ar na praia costumava ser estático. Morto.

Olhei para o alto e o horizonte pareceu se descortinar. As nuvens se moveram e pequenos feixes de luz iluminaram a areia.

Pisquei para me certificar.

Só podia ser outra alucinação.

Esfreguei o rosto e levantei.

Um homem, de barba comprida, me encarava com uma expressão de divertimento. Beirava o tédio.

A imagem dele tremeluziu entre as brumas e começou a se distanciar a minha frente.

Não hesitei.

Levantei e o segui.

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Uhullll, estreia oficial! SEJAM BEM-VINDOS AO TEMPLO!

"ONDE APENAS SERÁ LIVRE, QUEM O FOR EM PENSAMENTO."

Quem tá feliz toca aqui: o/

E como hoje é dia do leitor, tem mais um a seguir e uma SURPRESA PRA VOCÊS!!!




O Templo - Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora