BATIMENTOS

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Batimentos

Liza

Irmã Daiana. Ethan. Escuro. Carro. Chá. Viagem, viagem, viagem. Onde eu fui? Como voltei?

Abri os olhos com dificuldade. Uma gota de suor escorreu pelas minhas costas e ao voltar a razão, compreendi de onde vinha a sensação de estar quase queimando.

Eu estava envolta pelas asas de Adrian, como um bebê enrolado em um manto fofo de penas beges malhadas de caramelo. Ele se ajeitou na cama, forçou um sorriso para mim e passou o dedo indicador no meu nariz:

- Até que enfim sua preguiçosa.

- Oi, Adrian – respondi com a voz embolada.

- Como está se sentindo?

- Não sei. Confusa. Não lembro direito do que aconteceu.

Adrian me olhou pesaroso, eu sentia seus batimentos vibrando suavemente através de suas asas. Me mexi, incomodada com a proximidade.

- Pode puxar o cobertor por favor? – perguntei para descontrair o clima tenso.

Sem responder, ele fechou as asas de volta em suas costas e continuou me encarando de lado, com a cabeça apoiada na mão. Suspirei aliviada com a brisa. Sentei-me na cama e vi o mundo girar, ele percebeu:

- Devagar Liza, vai com calma. Você está há três dias dormindo.

- Então a minha fome está explicada. – comentei e ouvi sua risada.

Fui até o banheiro lavar o rosto e me assustei com meu reflexo. Eu tinha marcas roxas abaixo dos olhos, minha pele estava envelhecida. O topo de minha cabeça era puro óleo e meu cabelo se encontrava tomado por fios e mais fios emaranhados. No meu lábio inferior, havia uma marca de corte e de sangue pisado.

- Tudo bem aí, Liza?

- Tudo, vou tomar um banho.

Enchi as mãos em concha e molhei a nuca com a água gelada da pia. Ao levantar o rosto novamente de frente para o espelho, abafei um grito levando a mão a boca.

Meu reflexo aparecia distorcido, as bochechas derretiam como cera de maneira disforme. Um grito gutural me arranhou do peito até a garganta, e ouvi a voz de Noah me invadir:

"Entregue-se à sua verdade Liza."

Segurei a cabeça e a sacudi:

Não, não, não. Isso não está acontecendo.

Respirei e o que quer que fosse aquilo, passou.

Enchi a banheira e mergulhei na água morna. Fiquei ali até a pele começar a enrugar. Me enrolei na toalha e por pouco não escorreguei com o susto que levei.

Havia uma mulher agachada, nua no chão do banheiro. Ela me encarava encostada na parede. Os cabelos grudentos cobriam seu rosto, o som de sua voz era grave. Em um segundo ela brotou na minha frente e antes que eu pudesse fugir, pôs as duas mãos no meu pescoço e apertou.

- Me tire daqui Liza. – suplicou desesperada tirando o meu ar.

Fui salva pelo puxão de Adrian, que abriu como um touro a porta do banheiro e me puxou até o quarto, a mulher desapareceu.

Fiquei alguns segundos de olhos fechados respirando em pé na porta do banheiro. Percebi que o que quer que fosse aquilo, estava em mim, vinha de dentro.

O Templo - Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora