1990, Abril

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Nadia está nervosa, a casa é essa, ela tem certeza, a primeira coisa a fazer é ver se a arma está carregada, mas não quer fazer isso ali, assim, a tarde, naquela rua de subúrbio, sabe que sua presença já chama atenção, pelo menos, isso é o pensa, que todos estão olhando para ela. 

Durante todos os anos de sofrimento, essa é a segunda visita que jurou a si mesma fazer.

Resolve entrar, o portão está aberto, a cidade é pequena, ninguém liga para um portão aberto, ela houve um barulho, sente cheiro de carne queimando e segue para lá, no quintal, um homem de seus cinquenta anos vira de um lado para outro carne numa churrasqueira, ao lado de um piscina de plástico.

Nádia fica parada, não sabe o que fazer, seu primeiro impulso é puxar a arma e atirar nele pelas costas, esvaziar o tambor, enchê-lo de novo, e esvaziá-lo outra vez.

O homem se vira, dá um sorriso e fala :

_ Nádia ?

Ele vem correndo e a abraça chorando, ela fica muda, sem poder dizer nada, então ele grita para dentro :

_ Eloar ! Nádia está aqui !

De dentro da casa sai uma mulher de maiô, um pouco mais nova que ele, segurando um garoto de três anos pela mão, este quando a vê pergunta a mãe :

_ É a minha irmã ?

_ Sim Molier, é sua irmã !

O Garoto sai correndo e a abraça, pulando de felicidade.

Nadia começa a ficar tonta, desde seus tempos de sonolenta, detesta que alguém tenha tanta intimidade com ela assim, fora sua mãe e os médicos que fizeram o parto de Helena, Não gostava ser abraçada ou tocada, só quando...

Balança a cabeça, esquece aquela época logo depois que foi solta, estava confusa, só isso. Pensa na arma, mas não, a criança não tem culpa, ela se solta com delicadeza, tentando se controlar, abaixa e pergunta ao garoto :

_ Quantos anos você tem ?

_ Eu tem três ! E levanta quatro dedos na mão. Nadia pela primeira vez em muitos anos, sorri de verdade.

_ E você é meu irmão ?

_ Irmãos!

_ Você é muito bonito.

Nadia dá um beijo na bochecha dele, mas ele a agarra pelo pescoço, dessa vez, Nadia não se sentiu tão mal.

_ Venha Mol, vamos para a piscina, Seu pai e sua irmã tem muito pra conversar.

O garoto a contragosto a solta, o pai de Nadia pede que ela entre, Nadia o segue, a casa é velha, simples, mas bem cuidada, Nadia senta numa poltrona, e seu pai no sofá em frente. Ele está nervoso.

_ Nadia meu amor, que saudade, como me achou ? Recebeu minha cartas ?

Nadia havia recebido as cartas quando procurou a mãe, havia centenas de cartas, praticamente uma por semana, as vezes mais.

A mãe de Nadia havia ficado louca com seu sumiço, de uma hora para outra, Nadia e o pai sumiram sem deixar vestigios, depois as cartas começaram a chegar, do pai, endereçadas a Nadia.

Não tinham remetente. Era sempre o Pai falando de sua vida para Nadia, só isso. As vezes, vinha algum dinheiro, pouco, mas vinha, dentro das cartas.

A Ordem NegraOnde histórias criam vida. Descubra agora