1990, Agosto

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                Nadia está acabando seu banho, demora muito, mais de duas horas embaixo da agua, mas isso para ela é normal, gosta de pensar, de refletir enquanto toma banho, gosta de preparar seus próximos passos. Ali parece que tudo é mais fácil, se sente segura dentro d'água.

Ela sai mas não coloca suas roupas, na verdade, prefere ficar nua em casa, já passou muitos anos apertada por uma roupa que não conseguia tirar, agora, sempre que podia ou ficava nua ou usava roupas bem confortáveis.

Secou o cabelo em frente o espelho do banheiro, passava muito pouco tempo em frente a ele, ainda não gostava de ver o próprio rosto, ele era diferente do que lembrava, bonito, mas mais velho...

 Gostava sim, do espelho do quarto pois ele era imenso, e ela podia ver seu corpo inteiro, podia ver suas tatuagens, que agora cobriam parte de suas costas, seu cocix, suas ancas, uma das pernas e parte do braço esquerdo. Eram lindas e cada uma tinha a sua historia. 

Adorava ir a uma piscina, num clube próximo, com um biquine pequeno, as meninas mais novas se aproximavam e admiravam suas tatuagens. As maiores amigas da vida de Nadia hoje em dia eram meninas adolescentes, no seu caso, era normal, teve a maior parte de sua vida roubada, ainda se sentia como alguém de quatorze anos, era difícil para ela conversar com pessoas mais velhas.

Secou o cabelo e o amarrou com a toalha, estava feliz nesse dia, cantava, estava feliz pois ia matar mais um deles em poucas horas, sabia aonde ele estaria, e quem ele era, já sabia que ele não podia ser o pai de sua filha, já tinha levantado seu tipo sanguíneo antes, dessa vez, foi muito fácil, pagou alguém para se fazer uma entrevista de rua, como se fosse uma entrevista para uma pesquisa : Nome, idade e tipo sanguíneo, a desculpa era um estudo cientifico para levantar se existe preferencia de comida dependendo do tipo sanguíneo e idade...

Ela sorri de si mesma, como é fácil descobrir coisas sobre as pessoas, como é facil matá-las.

 Sabe que esse homem em particular fica trabalhando até tarde as quintas, sozinho, no seu escritório, sabe que não será difícil chegar até ele, o prédio é antigo, quase sem seguranças. Vai de metrô, a estação fica a cinco minutos de lá, cinco minutos andando, vai entrar no prédio, cinco para ele abrir a porta para ela, pois ele sempre pede uma prostituta.

 Dois para matá-lo, oito para voltar ao metrô, e mais três minutos de espera pelo proximo vagão. Essa noite será curta, o maior desespero será a viagem até o tatuador, mais vinte minutos de metrô, e dez até seu estudio, ele já vai estar esperando por ela. Qual tatuagem irá fazer dessa vez ? Geralmente só escolhe o lugar, e o desenho que lhe vier a cabeça quando matar, por isso está ansiosa, não por matar, mas para saber qual será o novo desenho que irá cobrir seu corpo, ser parte dela, de sua nova pele.

Sai do quarto, passa pela sala, nossa, como essa casa é grande, pensa, olha pela janela e vê o imenso quintal que a separa dos vizinhos, está feliz com o que vê. Adora espaços, não quer se sentir presa. O local foi um achado. Cinco minutos do aeroporto, quinze do centro da cidade.

Resolve beber um pouco de água, talvez até faça um chá, ou coma algo antes de sair, lembra que na geladeira guardou um bombom, havia desistido a muito de lutar contra suas compulsões, "concentre-se nas batalhas que você pode ganhar" pensou, abriu a geladeira, lá estava ele, no fundo, se abaixou para pegá-lo, e, de repente um frio correu por sua espinha, um medo irracional, fechou a geladeira devagar e, no escuro, sentado na pequena mesa da cozinha havia um homem, ele não se mexeu continuou olhando, do escuro para ela.

A Ordem NegraOnde histórias criam vida. Descubra agora