Segredos Perversos - A disputa (livro 3)

Capítulo 2

∞ Daniela

Não é fácil viver com tanto peso sobre os meus ombros, cada vez o passado se torna mais denso e mais doloroso e a única forma que encontrei de sobreviver durante estes anos foi enterrar as memórias.

Assim que o Lucas saiu por aquela porta, nunca mais tive qualquer notícia dele. Sei que foi numa missão de voluntariado, mas passaram-se sete anos e continuei sem qualquer notícia dele. Ninguém tocava no assunto "Lucas".

Uma semana após o nascimento, o Afonso levou a Emily para Nova Iorque e a minha vida voltou a ser passada dentro de aviões. Comprei uma casa lá e fiquei quase que definitivamente lá. O único que me podia fazer regressar odiava-me. Acompanhei o crescimento da minha princesa e empenhei-me na expansão da minha empresa. Agora, sete anos depois, tenho lojas espalhadas por todos os países do mundo, sendo que a mais recente inauguração foi em Espanha, há cerca de dois anos.

Se a minha vida é fácil?! Não, não é. Com o passar dos anos consegui mentalizar-me de certas realidades e enterrar as memórias, mas estas nunca ficavam bem guardadas. Ainda há momentos de nostalgia que abrem todas as gavetas do meu pensamento e desarrumam tudo. Já não uso a aliança no dedo, durante muito tempo usei-a num pendente, na maior parte das vezes oculta pela roupa. Mas recentemente deixei de a usar e guardei-a. Quero trazê-la para a minha casa em Portugal, onde estão as coisas do Lucas que ele não levou. Eu fiz uma escolha, optei pela segurança do meu afilhado ao invés da minha felicidade, não me arrependo. Ele está bem, está seguro e está feliz.

Observo o ambiente que rodeia o aeroporto. Faço-o sempre que regresso a Portugal enquanto espero pelo táxi. Não contei a ninguém desta visita porque foi uma decisão repentina, precisava de sair de Nova Iorque por uns dias, a minha mais recente descoberta abalou todo o meu mundo. Devia ter trazido a Emily mas sei que, apesar de tudo, ela está em segurança com o Afonso. Ele é um pai babado, o que é irónico porque ele sabe que não é o verdadeiro pai da menina.

Cada vez que entro nesta casa sinto que ela vai desabar em cima de mim, tudo de mau na minha vida aconteceu aqui; foi dentro destas paredes que vi todos aqueles que amo ou um dia amei pela última vez, os meus pais e o Lucas. Cada vez que oiço a porta fechar-se lembro-me do dia em que ele se foi embora.

Tomo um banho demorado na esperança de afastar os pensamentos. Preciso de me acalmar, preciso de recuperar toda a energia para encarar Portugal de novo. Este é o meu país, onde estão as minhas raízes mas também é o país onde mais sofri. O anseio e o medo de voltar caracterizam os meus dias fora daqui.

- Oh menina! – Exclama a D. Adelaide ao ver-me descer as escadas. – Seja bem-vinda, de novo! Já tinha tantas saudades, por que é que não me avisou que vinha?! Eu tinha feito aquele seu bolo que tanto gosta! A casa está tão vazia, quando é que volta de vez e traz consigo a minha princesinha, morro de saudades dela também, até daquele traste a chatear-me enquanto cozinho tenho saudades.

Sinto um nó na garganta e sorrio fracamente.

Ele era mesmo um traste, volta e meia ouvia os berros da D. Adelaide. O Lucas adorava ir para a beira dela enquanto ela cozinhava e assim ia roubando pedaços de comida, ou colocava um dedo na bacia para provar a massa dos bolos ou os molhos para o almoço. Era um cenário deveras divertido, escondida num canto ria-me á custas deles os dois. Por vezes eles davam pela minha presença e transformavam-se em autênticas crianças, fazendo queixas um do outro.

- Desculpe menina! – Apressa-se a dizer – Eu sei que a menina tem sofrido bastante, só não entendo é o porquê de tudo isto! Ele sabia que havia a possibilidade a Emily ser filha do Afonso e mesmo assim deixou-a no momento da verdade.