♡Daniela
Há dias em que nos perguntamos o que teria acontecido se não tivéssemos saído da cama? Se tivéssemos optado por ficar no conforto da nossa cama, num dia de moleza... Talvez o número de erros que cometemos durante a nossa vida se reduzisse para metade. A minha lista de erros é interminável, é tão grande que nem sequer consigo ver o início dela. Todos os dias faço uma asneira qualquer e logo depois os remorsos consomem-me.
Pois bem, ontem cometi o meu mais recente erro: dormi com o Simão. Parabéns Dany, foste considerada a idiota do ano! A Íris era minha amiga eu tive sexo com o ex-marido dela. Sinto-me mal por isso, apesar de ele ter garantido que nunca lhe daria uma nova oportunidade, que o nojo que sentia por ela era tão grande que ofuscava a ideia de estarem de novo juntos. Ainda tentei contra-argumentar mas ele estava decidido a desistir e desaparecer da vida da Íris.
Durante os dias que se seguiram eu e o Simão mantivemos o contacto, não nos envolvemos sexualmente mais nenhuma vez, apenas ficávamos a conversar por horas. É estranho saber que temos assuntos e gostos em comum. Desde o que aconteceu no colégio que nos afastamos cada vez mais até deixar de nos falar totalmente, e mesmo nos tempos do colégio nunca tivemos uma relação de proximidade.
Com a Emily nunca me preocupei, ela estava sempre com os primos, não a queria privar de nenhum momento com o Jonas e a Carol e com o Lucas, sei que dentro de dias teremos de regressar e, portanto, decidi dar o braço a torcer e permitir que ela saia debaixo das minhas asas por uns dias.
E com o James não voltei a falar. Ainda estou a tentar digerir as mentiras e como me irá ajudar com o Afonso...
Numa retrospetiva ao ano decorrido percebo que todos os meus desejos passados não se concretizaram e que ao invés de alcançar a tão ansiada paz, só me meti em mais alhadas.
Agora, dia 31 de dezembro, sentada á mesa do Dinis e observando disfarçadamente o ambiente, pergunto-me como tudo teria sido se não tivesse sido obrigada a ir para aquele colégio. Mas o tempo não volta atrás e temos de aprender a viver com as nossas escolhas e as suas consequências.
A conversa sobre os "homens maus" deixa-nos a todos nervosos, não sei onde o Jonas foi buscar tal ideia mas preciso de o Dinis se apresse em tirá-la da cabeça dele. Tem sido complicado manter a segurança dele e não precisamos que ele comece a fazer as perguntas e os comentários errados com as pessoas erradas.
O ano começou mal - como têm sido os últimos anos - e acabou de uma forma pior: com a notícia de um acidente.
A Rafa chora silenciosamente enquanto o Dinis a tenta acalmar.
- Os miúdos? - Pergunta o Dinis.
- Estão no quarto do Jonas a brincar.
A Rafa continua a chorar e o Dinis preocupado em acalmá-la. Afasto-me aos poucos daquele cenário, murmurando-lhe ordens para irem ao hospital que eu ficava com as crianças, e subo as escadas sem esperar qualquer resposta deles.
Os miúdos divertem-se com a consola de jogo do Jonas, sento-me numa ponta da cama e fico a observá-los, porém, com o telemóvel sempre no meu colo.
Finalmente, após intermináveis horas o som incessante do telemóvel invade o quarto, as crianças lançam-me um olhar reprovador por estar a interromper as suas brincadeiras; o telemóvel continua a tocar mas o meu corpo pareceu paralisar e não consigo sequer ver o nome, no ecrã, de quem me está a ligar.
- Mãe, atende isso! - Exclama a Emily enquanto tira o meu telemóvel do colo - É o pai!
Pai?!
Rapidamente me apresso a pegar no telemóvel e a desilusão instala-se. Sim, é o "pai da Emily", mas não é quem queria que fosse.
- O que é que queres? - Atendo num tom ríspido.
- Saber como estavas.
- Não preciso da tua preocupação.
- Amor, esta guerra devia terminar, não concordas? Tu sabes que não irás ganhar e só te irás magoar mais. - Oiço um longo suspiro do outro lado da chamada - Eu estou disposto a perdoar-te.
- Quero que ardas no inferno. - Vocifero furiosa, já fora do quarto das crianças.
- Bolas! Quando é que vais aprender que o teu lugar é ao meu lado, e que cada minuto longe só significa mais sofrimento para ti? Não aprendeste com a lição que dei àquele zé-ninguém?
Recuo uns passos para poder apoiar o corpo na parede. Foi ele?! Claro que foi! Como é que não pensei nisso antes?! Engulo em seco e desligo a chamada.
- Jonas - Sussurro ao seu ouvido - Importaste de ficar com a tua irmã e com a Emily? A madrinha precisa de ir a um lugar, é muito importante. Eu vou pedir á Matilde se pode vir para cá.
- Não é preciso chamar a Matilde, nós ficamos bem.
Beijo a sua testa e de seguida faço o mesmo á Carol e á Emily, sussurrando-lhe " a mãe não demora, porta-te bem."
Sigo a alta velocidade para o hotel onde o Afonso está hospedado. Não anuncio a minha presença, avanço a passos largos pelo corredor até alcançar o seu quarto. A porta está fechada mas não está trancada. Encontro-o sentado na cama com o seu tablet na mão.
- Seu filho da mãe! - Grito - Eu vou matar-te.
Ele levanta-se num ápice e encara-me. Cega de raiva, atiro-me a ele e começo a agredi-lo. Desferir o primeiro golpe é fácil porque o apanhei desprevenido, porém, os seguintes começam a ser complicados. Ele agarra nos meus braços, prendendo-os atrás das minhas costas. Disponibilizando uma das mãos que me segura, ele puxa os meus cabelos, obrigando-me a olhá-lo nos olhos.
- Nunca mais repitas o que acabaste de fazer, estamos entendidos? Nunca mais. O amor que sinto por ti pode não ser suficiente para me controlar da próxima vez.
- Tu és um monstro. - Sibilo. - Como é que foste capaz de os magoar?
- Matar pessoas é a coisa mais fácil do mundo, minha querida. Tu devias saber isso, mataste um homem quando tinhas 16 anos, foi esfaqueado em tua casa, não foi? - Ele faz uma pausa teatral e continua - Ah, espera, quem o matou foi o teu amantezinho. E tu não lhe chamaste de monstro, pois não? Não, porque ele salvou a donzela em apuros. Eu limitei-me a fazer o mesmo, a salvar a minha donzela daquela família desgraçada.
Num movimento brusco consigo soltar-me dos seus braços e recuo uns passos totalmente desnorteada. Como é que ele sabe?!
- Eu sei muito mais do que imaginas. - Responde como se tivesse lido os meus pensamentos.
- SEU DESGRAÇADO! NÃO TENS VERGONHA NA CARA? EU VOU MATAR-TE! - Vejo o Lucas entrar furioso pelo quarto a dentro e empurrar o Afonso contra a parede, e começa a esmurrá-lo. - A SÍLVIA MORREU E O MIÚDO ESTÁ NO HOSPITAL!
- Não quero saber deles para nada, podem morrer á vontade. Só não sei é por que é tu também não estás naquele hospital. - Afirma Afonso com um sorriso perverso, assim que se livra do Lucas - Eu avisei que as tuas ações iriam trazer consequências.
- EU SÓ QUERO RECUPERAR O QUE É MEU!
- A EMILY É MINHA, E NÃO ADMITO QUE UM ZÉ-NINGUEM MA TIRE. EU AVISEI!
- NÃO, NÃO É! E TU SABES PERFEITAMENTE.
De novo entram em confronto físico, tento separá-los mas não consigo. O Afonso desfere vários golpes no rosto do Lucas, que está deitado no chão debaixo de si. Retirando forças de não sei onde, consigo agarrar no Afonso e puxá-lo para longe, e o Lucas aproveita para se levantar.
- Tu queres tanto proteger a Emily, mas nem o teu próprio filho conseguiste proteger. - Afirma enquanto limpa o sangue que escorre pela sua boca.
- O quê? - Pergunto curiosa.
- O Gonçalo é filho deste porco.
- Como?! - Pergunta o Afonso.
- Lembraste quando há cinco anos atrás foste a Espanha e violaste uma mulher? Aquela mulher que teve de ficar na empresa após a hora de saída? Era uma jovem que tinha acabado os estudos há pouco tempo, ainda estava em fase de adaptação. Lembras-te da noite em que a responsável pelo marketing de uma grande construtora não pode ficar para atender ao pedido do grande empresário Afonso Dias, e, por isso, teve de ficar a novata? Lembras-te que após a reunião a convidaste para beber um copo e que ela recusou? Lembras-te que nesse momento a agarraste pelos cabelos e colocaste-a de joelhos e forçaste-a a chupar-te? Lembras-te que quando te cansaste, empurraste-a para cima da mesa e abusaste dela?
O Afonso permanece estático enquanto o Lucas o olha furioso.
- Ela lembra-se, e lembra-se muito bem. Mas não fez nada, não fez queixa porque sabia que só iria trazer-lhe problemas, porque o senhor Afonso iria sair impune como já o tinha feito antes. Semanas mais tarde descobriu que estava grávida. - Continua - Agora dou-te os meus parabéns, acabaste de colocar a vida do teu filho em perigo. Queres a Emily mas não tens problemas em magoar o teu filho, por isso, não vou permitir que fiques com a minha filha.
O Lucas cospe o sangue que ainda escorria pelo seu rosto até chegar á sua boca, e então sai furiosamente do quarto. O Afonso recua desnorteado até uma parede e fica a encarar-me, pedindo ajuda em silêncio. Mas não o faço. Afasto-me a passos largos e, assim que entro no corredor, corro para alcançar o Lucas. Provavelmente, ele vai humilhar-me de alguma forma, mas tenho de aprender a controlar-me e dar-lhe o que mais precisa neste momento: apoio.
Encontro -o parado no parque de estacionamento, encostado ao carro com a cabeça escondida pelo meu braço. Está de costas para mim. A sua mão esquerda começa a ficar roxa de tanta força que ele exerce ao apertá-la.
Com cuidado aproximo-me do seu corpo e repouso a minha mão sobre o seu ombro, afagando-o com suavidade. Ele não impede nem me afasta. Continuo assim, em silêncio. As minhas mãos falam por mim, demonstrando a minha compaixão e afeto por ele. Agora percebo que ele a amava de verdade. E o bocadinho do coração que estava intacto parte-se em mil pedaços, estilhaçando-se por completo. Mas esta é a hora dele, de ser ele sofrer, de requerer atenção... Por isso, aquieto os meus pensamentos e continuo a acariciar as costas dele.
Ao fim de uns minutos assim, ele ergue o rosto e encara-me. Sustenho o seu olhar e, de repente, ele puxa-me para um abraço. Sou esmagada pelos seus braços mas não me afasto. Com as lágrimas a ganhar a sua luta, murmuro pedidos de desculpa desesperados ao seu ouvido.
Ele se permanece calado.
- Devias ir para casa e descansar um pouco.
- Tenho de ir para o hospital, não posso deixar o Gonçalo sozinho. Ele precisa de mim.
- Eu entendo-te mas o Gonçalo não está sozinho, a Rafa e o Dinis estão lá. Tu não estás em condições para ir ter com ele, precisas de ganhar forças para o poder ajudar.
- Eu não o vou deixar sozinho! - Vocifera furioso e afasta-se de mim.
- Por favor Lucas, tu precisas de descansar e recuperar, o Gonçalo vai precisar muito de ti mas se estiveres assim não vais conseguir ajudá-lo. Ele acabou de perder a mãe e agora precisa que o pai seja forte por ele. Faz o que te digo uma vez na vida.
Consigo convencê-lo e arrastá-lo para dentro do carro. Ele encosta a cabeça na janela e perde-se no seu novo mundo, aquele mundo onde a Sílvia e o Gonçalo são o centro da vida e da felicidade.
Já em casa ele vai direto para o quarto. Olho á minha volta e imagino como seria o futuro deles, numa nova casa, num novo país.
Revisto a cozinha á procura de algo que possa preparar, mas ela está completamente vazia, com exceção de um pacote de bolachas já aberto em cima do balcão.
É de madrugada. Janeiro chegou há pouco mais de duas horas. E, portanto, não há nada aberto onde possa ir buscar qualquer coisa para ele comer. Com cuidado aproximo-me do quarto e vejo-o sentado na cama com uma fotografia dela no colo. Engulo em seco e continuo a minha missão.
- Se calhar era melhor irmos para casa do Dinis, assim podes comer alguma coisa.
- Não tenho fome.
- Por favor, Lucas, é o melhor para ti. Já é tarde e não está nada aberto a esta hora e eu sei que não jantaste. Por favor, vem comigo... E os meninos estão lá, não há melhor forma de superar a tristeza do que estar na companhia daqueles crianças. Vem comigo, por favor.
Foi difícil mas consegui convencer aquela cabeça dura a vir comigo. Enquanto esperava que ele terminasse de tomar o seu banho, dei por mim a culpar-me por tudo o que aconteceu e os remorsos por ter traído a Sílvia, em Espanha, só aumentavam.
Sinto a sua presença do atrás de mim e quando me viro vejo-o a encarar-me. Sorrio fracamente, dominada pelo seu olhar, e levanto-me.
- Vamos?
Saímos em silêncio e, festa vez, quem assume o volante é ele.
Quando chegamos encontramos a Rafa e o Dinis, o Lucas olha-os furioso por terem deixado o Gonçalo sozinho e não o terem avisado, mas eles rapidamente afirmam que não podiam ficar com ele e que logo pela manhã regressam de novo.
Só com muito esforço e com a preciosa ajuda da Emily é que consigo com que o Lucas coma alguma coisa. Ela senta-se no seu colo e, como se ele fosse um bebé, pega no garfo e começa a dar-lhe a comida á boca. Ele sorri levemente cada vez que a olha nos olhos e no fim abraça-o.
- O Gonçalo vai ficar bem. - Murmura ao seu ouvido. As suas palavras fazem-no abraçá-la com mais força.
Deixo-os assim, juntos, o afasto-me sem que ninguém note.
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Segredos Perversos - A disputa (livro 3)
RomanceSejam bem-vindos a mais uma aventura destes quatro amigos!! O passado emerge e uma nova luta surge... Depois de 7 anos a viverem vidas separadas mas com um filho em comum, as vidas da Rafa e do Dinis voltam a unir-se após uma tragédia. Na casa ao l...