Meus pés latejavam. Meus olhos estavam doloridos pelo sol e eu realmente poderia ter reclamado pelo clima, mas decidi agradecer, chovendo seria ainda pior.
Antes, meu trajeto consistia apenas nas poucas saídas do orfanato, que não duravam mais do que 20 minutos de caminhada, já que tínhamos 'tudo o que precisávamos' ali dentro.
Andrew continuou a me acompanhar com o carro, e eu encarei o meio fio do lado contrário. Ele bufou quando eu não o olhei, e buzinou mais algumas vezes me fazendo encolher de susto mesmo que já estivesse esperando por aquilo.
-Amelie, entra nessa porra de carro agora. – ele rolou os olhos. Eu podia imaginar que estava esfregando o rosto com umas das mãos, mas não o olhei. Quando eu o ignorei novamente, sua buzina tocou insistentemente ao meu lado, me fazendo acelerar o passo. Ele continuou acelerando a velocidade do carro e diminuindo conforme eu seguia – Da pra parar de fazer cu doce e entrar logo? – soltou mais uma serie de palavrões.
Eu plantei o pé no meio da calçada, cruzando os braços para olhá-lo, meu semblante mais ameaçador estampado no rosto. Andrew parou o carro me encarando pelo vidro da janela, e toda a raiva em seus olhos foi substituída por...
Riso?
Ele estava rindo de mim?
Respirei fundo e continuei a andar. Andrew soltou mais uma risada enquanto acelerava o carro mais uma vez.
Sempre imaginei meu primeiro beijo como havia visto poucas vezes nos filmes. Eu queria pés levantados. Sorrisos espontâneos. Beijo na testa. Carinho. Um jardim.
Eu não queria ter sido pega de surpresa. Ter levado um susto sem saber o que fazer. Não queria aquele sorriso debochado e presunçoso logo em seguida. Muito menos queria que aquele momento tivesse acontecido em um jardim sujo e com bitucas de cigarro espalhadas pela grama. Não queria ter babado.
Deus, eu realmente não queria ter babado...
-Fala sério Amelie, foi só um beijo. Vai me dizer que você nunca beijou? – ele riu mais alto. Quando eu encarei meus sapatos, sem lhe dar uma resposta, pude ouvir seu quase grito – Caralho, você nunca tinha beijado ninguém! – disse espantado.
Eu o olhei séria, e, mesmo tentando disfarçar, meu rosto corado entregou tudo.
Eu não via a hora do sol daquela cidade tirar a merda do branco das minhas bochechas.
-Isso não é da sua conta! – tentei soar firme, porém, a bosta já estava feita e ele ria descontroladamente.
Apertei os olhos o ignorando e continuei a andar, olhando para qualquer ponto que não fosse a janela do seu carro.
-Vai me dizer que foi ruim? Você nem foi tão mal assim. – Andrew debochou e eu cobri o rosto com as mãos, continuando a andar.
Por Deus, como eu olharia para aquela família de novo?
-Não, Andrew. Foi péssimo. Foi invasivo e desrespeitoso.
-Desrespeitoso? Alguém ainda usa essa palavra? – ele gargalhou e eu comprimi os lábios, engolindo um xingamento – Poderia ter sido... desrespeitoso. – ele usou minha palavra com um leve tom de deboche – Se você não quisesse. – deu de ombros, ainda sorrindo debochado em minha direção, enquanto eu olhava para o outro lado.
Andrew tinha um lindo rosto. Um sorriso incrível. Era quase como se seus olhos cor de mel e seus lábios conversassem com o queixo quadrado para formar uma junção admirável. Mas sua prepotência e deboche eram tão exagerados que todo o pacote ficava escondido debaixo da nuvem de arrogância e do sorriso irônico.
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O atraso certo (FINALIZADO)
Novela Juvenil(Livro 1 da Duologia) Por quase dezoito anos, Amelie viu a vida passar diante dos seus olhos sem que pudesse fazer nada para muda-la. No entanto, em uma manhã de domingo, depois de um acidente que poderia ter acabado com a sua vida, ela vê uma nova...