Capítulo 17: Joe Kypper

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Oxford, Inglaterra

Terra, Julho de 1986

Desmond mal abriu a porta de seu apartamento e o rock ao melhor estilo do Beatles passou pela fresta como se fosse água transbordando em um copo. O som, aos poucos, ficou mais claro para o detetive, que, num súbito segundo, uma peça que faltava se encaixou. A música seguia num ritmo um tanto lento, com acordes melódicos e longos; mal se escutava a bateria marcando o ritmo. Então, uma voz masculina começou a cantar sobre uma garota que ele conheceu durante o tempo de colégio, mas que agora ela tinha partido. Entretanto, o importante não era a música e sim o artista que cantava. Era um cantor não muito famoso Norueguês, o favorito de Clarisse, sua namorada. Chamava-se Joe Kypper.

Fazia muito tempo que não se sentia tão feliz como agora. De fato, não se sentia assim desde que conhecera Clarisse alguns anos antes. Chamou por ela, mas não obteve resposta. Pensou em desligar a música que tocava no ambiente, mas preferiu deixar. Não era sua favorita, mas também não era ruim. Procurou-a na sala, cozinha e na biblioteca – sim, ele tinha uma biblioteca, que na verdade era um quarto pequeno extra que tinha no apartamento. A porta do banheiro estava aberta, então era óbvio que não estava lá. Clarisse sempre fechava a porta quando ia.

Foi quando ele notou o casaco de couro pendurado em uma cadeira. Era grande demais para ser dela, e ele não gostava de couro. Próximo à entrada do pequeno corredor, notou uma blusa com o desenho do Mickey Mouse jogada no chão, amarrotada, como se tivesse sido lançada ali por desespero... Ou no calor de um beijo, ele pensou, eu vou matar aquela vadia! Ele não precisou ver a camiseta branca masculina jogada à porta do quarto para saber o que estava acontecendo.

Chorando e bufando no furor de sua ira, chutou a porta como que para começar a descontar o que sentia. Embolados na cama dele estava Clarisse, que parou de gemer assim que ouviu a porta bater, e um cara, que olhou imediatamente para Desmond. O detetive, ensandecido, encarava os amantes.

– Des... – Ela tentou dizer. – Não é o que você está pensando...

– Vai se ferrar, vaca. Saí da minha casa!

As lágrimas começaram a escorrer pelo rosto da mulher, que não sabia onde enfiar a cara. – Por favor, amor...

– Amor o caramba, vadia. Saí da minha casa agora!

Clarisse levantou e, sem tirar os olhos do detetive, saiu da casa usando apenas o lençol suado como roupa; o outro, enquanto isso, vestiu a cueca e a calça jeans. Ele mantinha um sorriso sarcástico no rosto, como se transar com uma namorada alheia fosse seu maior divertimento. Levantou-se para sair, mas Desmond o parou a porta.

– Você acha isso divertido, não? – Disse, tentando mantar a calma.

– Olha, cara, foi ela que se atirou...

Não terminou a frase, pois o detetive socou-o com toda a força que tinha. Desmond não era fã das artes marciais, preferia os livros. Porém, para a profissão que escolheu, era necessário que ele aprendesse a se defender; e seu intelecto superior facilitava a percepção do combate, assim prevendo os movimentos do adversário. O rapaz recuou alguns passos, secou o sangue que escorria pela lateral da boca e encarou Desmond.

– Bom soco. – Elogiou sarcasticamente.

Por alguma razão as palavras apenas ferveram a raiva de Desmond, que avançou ferozmente, pronto para uma boa briga. Por causa da raiva que sentia, ele não notou que o homem tinha heterocromia, ou seja, cada um de seus olhos era de uma cor; o direito era azul e o esquerdo preto, como a escuridão.

Sem pensar, o detetive deu o segundo soco e o terceiro. E continuou socando com toda a raiva de seu ser. Por alguma razão, o rapaz não tirava o sorriso do rosto, como se gostasse de ver alguém com tanta raiva dele. Isso apenas aumentou a vontade de socar.

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